Presidente da República forçou remodelação de Gomes da Silva
As pressões de Jorge Sampaio estiveram na origem da transferência do ministro Gomes da Silva do cargo de ministro dos Assuntos Parlamentares para o mais discreto cargo de ministro-adjunto do primeiro-ministro, soube o PÚBLICO.
O afastamento de Gomes da Silva do papel de primeiro plano que é atribuído no regime ao ministro dos Assuntos Parlamentares é um desfecho desejado pelo Presidente da República depois do "caso Marcelo", despoletado pelas declarações de Rui Gomes da Silva. Recorde-se que o desagrado de Jorge Sampaio foi simbolicamente demonstrado com a imediata audiência que concedeu a Marcelo Rebelo de Sousa, em Belém, após a saída da TVI dias depois de uma violenta crítica de Gomes da Silva sobre os comentários dominicais do professor. Na semana passada, o veto à central de comunicação proposta pelo Governo foi elucidativa da vontade do Presidente em travar a "fúria comunicacional" evidenciada pelo Executivo.
Jorge Sampaio nunca pediu formalmente a demissão de Gomes da Silva ao primeiro-ministro. Não o podia fazer: se Santana Lopes recusasse, o Presidente da República - uma vez que não pode demitir o Governo - teria que fazer uma avaliação sobre o "regular funcionamento das instituições" o que levaria, em última análise, à dissolução parlamentar. Uma crise não desejada em Belém que, em Julho, recusou a convocação de eleições antecipadas.
A retirada estratégica de Gomes da Silva do lugar de ministro dos Assuntos Parlamentares - que, na prática, em Portugal, funciona como uma espécie de porta-voz do Governo - é uma solução que vai de encontro às pretensões do Presidente da República para quem Rui Gomes da Silva vinha a somar erros políticos sobre erros políticos. Para além do "caso Marcelo", a questão da Alta Autoridade para a Comunicação Social foi também relevante - Gomes da Silva chamou a Alta Autoridade a debater o "caso Marcelo" e depois acabou a considerá-la um órgão sem legitimidade. Aliás, Sampaio, ao que o PÚBLICO sabe, ficou satisfeito por Santana Lopes, nas declarações que produziu à saída de Belém, ter corrigido os tiros contra a Alta Autoridade disparados por Gomes da Silva, Morais Sarmento, Guilherme Silva e Miguel Relvas.
Membros do Governo souberam em cima da horaRui Gomes da Silva é um homem de confiança política do primeiro-ministro há cerca de 20 anos e Santana, apesar do desejo de Sampaio, não o quis deixar logo cair. Ainda anteontem na RTP, o líder do PSD procurou apoiar Gomes da Silva no episódio Marcelo.
Recorde-se que ministros como Morais Sarmento e Álvaro Barreto demarcaram-se da atitude do agora ex-ministro dos Assuntos Parlamentares. Membros do Governo e deputados consideraram difícil a manutenção de Gomes da Silva naquele cargo.
Apesar de anunciadas momentos antes da tomada de posse, as mudanças de ministros estavam a ser equacionadas por Santana desde que, pelo menos, foi tornada pública a saída do secretário de Estado Domingos Jerónimo para ir chefiar os serviços de informações.
Gomes da Silva passa a ministro-adjunto, título que deixa de ser de Henrique Chaves, outro dos fiéis santanistas, que se chama agora ministro da Juventude, Desporto e Reabilitação. Chaves tem a seu cargo alguns assuntos como o desporto, juventude, pessoas com deficiência e defesa do consumidor, alguns dos quais estão delegados nos seus dois secretários de Estado. Ao contrário de outros ministros-adjuntos, que em Governo PSD ou PS, são os chamados homens de mão do primeiro-ministro que actuam, por vezes, como bombeiros ou emissários do chefe de Governo, Chaves nunca desempenhou esse papel nestes primeiros meses de Governo. A parte da coordenação política não era valorizada. Chaves chegou ontem a afirmar aos jornalistas que era "completamente impossível" dar conta de todas estas tarefas.
Morais Sarmento, com estas mudanças, acaba por ficar à frente de um super-ministério. Ganha a tutela dos assuntos parlamentares e um novo secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares, o ex-deputado Montalvão Machado. Perde o secretário de Estado da Presidência, Feliciano Barreiras Duarte, que transita para a esfera do novo ministro-adjunto e que deverá levar com ele a pasta da imigração. Morais Sarmento acabou por não tomar posse, depois de consultados os assessores jurídicos. O ministro da Presidência não terá querido passar por uma nova cerimónia, que daria a ideia de ter sido alvo de uma remodelação.
No entanto, a remodelação apanhou de surpresa vários membros do Governo. Alguns dos convites a secretários de Estado só ocorreram durante a tarde de ontem. Os dois secretários de Estado da esfera de Henrique Chaves, o da Juventude (Pedro Duarte) e do Desporto (Hermínio Loureiro), que deveriam tomar posse ontem, estavam no Porto e não chegaram a horas a Lisboa. A sua tomada de posse deverá ser no sábado.