Porto: Museu de Serralves inaugura amanhã exposição antológica de Paula Rego

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A mostra evidencia a importância do desenho no trabalho da artista Paulo Pimenta/PÚBLICO

O Museu de Serralves inaugura amanhã uma exposição de Paula Rego, ancorada em algumas das suas séries emblemáticas, como "Untitled", sobre o aborto, ou o políptico inédito "Possessão". A mostra evidencia a importância do desenho no trabalho da artista, reunindo obras realizadas sobretudo a partir de 1997.

A exposição de Paula Rego é comissariada pelo director do Museu de Arte Contemporânea de Serralves (MACS), João Fernandes, e pela ensaísta e especialista na obra da autora, Ruth Rosengarten.

Com medidas de segurança apenas comparáveis às tomadas durante "Caged/ Uncaged", de Francis Bacon, a mostra percorre a recente produção da artista, ancorando-se em algumas das suas séries emblemáticas, como "Untitled", um conjunto de trabalhos acerca do aborto, ou o políptico inédito "Possessão", no qual se representa a intensidade do desejo vivido em solidão.

O percurso expositivo demonstra a importância do desenho no trabalho de Rego, uma evidência a que se junta a forma particular como a artista aborda as relações humanas. Muitas vezes servindo-se de bichos para construir essas narrativas, a possibilidade de devir animal parece ser a única saída possível para se superar as diversas formas de manifestação do poder.

A exposição que reúne obras realizadas por Paula Rego sobretudo a partir de 1997, período posterior à retrospectiva organizada pela Tate Liverpool, em Inglaterra, e pelo Centro Cultural de Belém, em Lisboa. Nessa mostra foi apresentado pela primeira vez um conjunto de trabalhos preparatórios de um quadro, "A Dança", facto que abriu a curiosidade de João Fernandes para o papel do desenho na obra da artista: "Ultimamente, Paula Rego não pinta a acrílico ou a óleo, utiliza o pastel sobre papel, uma técnica também do desenho, a partir da observação do modelo; de maneira que esta exposição partiu de uma intuição sobre uma relação dinâmica entre o quadro e os desenhos", esclarece o director do MACS.

"O Crime do Padre Amaro", "Untitled", dedicada ao aborto, "Jane Eyre", "White Sargasso Sea", "Celestina" são algumas das séries representadas na exposição de Serralves: "Reuniram-se antologicamente cerca de 150 trabalhos, que foram um ponto de partida para a selecção agora visível, onde encontramos desde obras muito recentes até um grande conjunto de desenhos preparatórios de certos quadros e também desenhos que registam uma actividade quase diarística da artista, desenhos que muitas vezes não resultaram em quadros, mas que têm uma autonomia muito grande, como pode ser agora constatado na exposição", aponta João Fernandes.

A montagem das obras, esclarece o comissário, pretendeu tornar natural o seu aparecimento, havendo algumas grandes secções, como a sala inicial, onde se mostra o políptico "Possessão", "Mulher do Bolos" e "Lendo a Sina a Madame Lupescu", todos trabalhos recentes onde, na opinião do director do MACS, se pode vislumbrar "uma busca do tempo perdido numa memória da infância da artista no Estoril, que se cruzam também com as memórias de um país, na altura submetido ao Estado Novo".

O percurso prossegue com uma selecção de obras das séries "Crime do Padre Amaro" e "Untitled", a que se acrescentam o tríptico "Marta, Maria e Madalena", onde se encontra uma "Pietá", e trabalhos sobre a "Metamorfose", de Kafka, criações onde, segundo o comissário, se torna "mais densa esta relação entre o masculino e o feminino, que é uma dicotomia extremamente produtiva na obra da artista".

Na sala seguinte encontram-se obras relativas às séries "Jane Eyre", "Celestina" e "White Sargasso Sea", três grandes obras literárias interpretadas e reescritas visualmente por Paula Rego. Nessa instante, a exposição abre-se a cruzamento de vários suportes, que vão da gravura ao pastel. Entra-se depois num gabinete de desenhos íntimos, trabalhos que nos enviam para a infância e para aspectos biográficos da artista. A mostra continua num espaço onde surgem várias fábulas, como "O Capuchinho Vermelho" ou "A Pata Portuguesa", de Hans Christian Andersen, e "O Jardim do Interrogador", que é, segundo João Fernandes, "uma interrogação de todos os fascismos, íntimos ou públicos". O percurso termina com um corredor de desenhos, gravuras e litografias que reenviam para muitas das outras séries.

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