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Peru: Amnistia insta Governo a adoptar plano nacional de direitos humanos

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A grande maioria das vítimas do conflito interno eram indígenas e agricultores pobres Walter Hupiu/EPA

Um ano depois da publicação do relatório da Comissão de Verdade e Reconciliação peruana, o Governo de Lima precisa de mostrar que tem vontade política para acabar com a impunidade em redor das violações dos direitos humanos cometidas durante os 20 anos de conflito interno, considerou Nuria García, investigadora da AI no Peru. "Desde o fim do conflito, a impunidade e a discriminação têm continuado a afectar a capacidade de milhares de peruanos de exercerem totalmente os seus direitos", denunciou García.

De acordo com o relatório da Comissão de Verdade e Reconciliação, cerca de 24 mil pessoas morreram ou "desapareceram" durante o conflito armado peruano. Na sua maioria, eram indígenas ou agricultores, que viviam em situações de pobreza e extrema pobreza. Este facto levou, segundo a comissão, a que a discriminação racial e de género tivesse sido praticada em clima de impunidade e sem a denúncia da população durante anos. A 26 Agosto de 2003, a comissão apresentou o seu relatório final, que contém recomendações concretas ao Governo peruano — muitas delas não requerem financiamentos e outras implicam reformas estruturais ou mudanças de mentalidade.

Na opinião da AI, acabar com as consequências do conflito interno passa pela aplicação de um plano nacional que assegure a busca da verdade, a justiça e a reparação de danos. "O Governo peruano precisa de trabalhar os progressos feitos pela Comissão de Verdade e Reconciliação na luta contra a impunidade (...). Todas as queixas de abusos dos direitos humanos devem ser investigadas exaustivamente e os responsáveis devem ser julgados em tribunais civis e punidos de acordo com a severidade do crime. A reparação de danos deve ser individual e colectiva, e proporcional à severidade das violações dos direitos humanos sofridas", defendeu García.

A organização de defesa dos direitos humanos aconselha ainda o Governo do Peru a "rever periodicamente a legislação para assegurar que não está a ser promovida qualquer discriminação com base na raça, orientação sexual e grupo étnico". "O plano deve ainda incluir medidas que promovam e garantam o respeito pelos direitos económicos, sociais e culturais", acrescenta a AI.

A Comissão de Verdade e Reconciliação peruana foi criada em 2001 com o objectivo de esclarecer as circunstâncias que rodearam os abusos de direitos humanos cometidos entre Maio de 1980 e Novembro de 2000, tanto pela seita Sendero Luminoso, como pelo Movimento Revolucionário Tupac Amaru e pelo próprio Estado. Ao mesmo tempo, a comissão pretendia identificar as vítimas do conflito, bem como o seu paradeiro e actual situação, no sentido de efectuar propostas para a sua indemnização.

O Sendero Luminoso estava entre os grupos terroristas mais radicais criados nos anos 60 pelo então professor universitário Abimael Guzmán, em cujos ensinamentos a doutrina do movimento se baseia. O objectivo do Sendero Luminoso é destruir as instituições peruanas existentes e substituí-las por um regime revolucionário de camponeses. O movimento opõe-se ainda a toda e qualquer influência de Governos estrangeiros, bem como de outros grupos de guerrilha da América Latina, especialmente o Movimento Revolucionário dos Tupac Amaru.

Em 1999, o Governo peruano executou operações de grande envergadura contra o terrorismo, que resultaram na detenção e acusação de vários membros activos do Sendero, nomeadamente Oscar Alberto Ramirez Durand, que liderava o grupo desde a captura de Guzmán, em 1992.

A actividade do Sendero é marcada por campanhas bombistas indiscriminadas e assassinatos selectivos. Cerca de 30 mil pessoas morreram desde que o grupo tomou armas, em 1980, com o objectivo de transformar o Peru num Estado comunista. As operações armadas declinaram em 1999, apesar de o Sendero continuar a importunar as autoridades peruanas. Estima-se que pertençam ao grupo poucas centenas de militantes armados, mas desconhece-se o número exacto.

Por seu lado, o Movimento Revolucionário Tupac Amaru, de inspiração marxista-leninista, foi criado em 1983 com a pretensão de livrar o Peru de todas as influências imperialistas (em primeiro lugar, dos EUA e do Japão). As autoridades diminuíram a capacidade do grupo, também enfraquecido por lutas internas e detenções de membros, de realizar ataques terroristas. Assassinatos, ataques bombistas, sequestros e emboscadas eram acções frequentes do movimento, actualmente reduzido a uma centena de jovens membros.

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