Objecto sério e amargo

É o primeiro filme de Chaplin em que apenas aparece por detrás da câmara: a sua representação faz-se, pois, pela ausência, pela rasura da "persona" que impusera. De Charlot aparece apenas uma sombra, num "cameo" de carregador, e uma das suas companheiras de eleição, nos filmes precedentes, Edna Purviance.

Considerado por Chaplin uma viragem fulcral na sua obra, corresponde ao desejo de fazer um filme dramático, no âmbito da aventura recém-iniciada da United Artists. Inspirando-se na figura de uma "golddigger" típica dos anos do pós-guerra, Peggy Hopkins Joyce, uma "Ziegfeld Girl", o filme investe numa leitura epocal e na relação histórica directa, que a universalidade do seu ícone, Charlot, de certo modo iludira.

O predecessor de um tom requintado que só muito mais tarde afloraria, de forma bem menos perfeita, aliás, em "Monsieur Verdoux", "Opinião Pública" combina um tom realista, a que uma glosa distante de "A Dama das Camélias" não será alheia, com uma distinção herdada das comédias sofisticadas de Cecil B. De Mille. No entanto, alguns dos momentos centrais do filme, como o do colar de pérolas deitado pela janela e apanhado por um vagabundo, não deixam de evocar o gosto pelo "gag" num objecto sério e amargo de crónica social de costumes.

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