CP reclama 27 milhões de euros ao Governo pelo transporte de funcionários
Segundo apurou o PÚBLICO, a operadora ferroviária já forneceu aos ministérios o mapa das dívidas de forma a que a verba seja inscrita no próximo orçamento de Estado.
A transportadora pública é obrigada a transportar gratuitamente ou com descontos de 75 por cento várias classes sócio-profissionais, desde magistrados a militares, passando por sapadores bombeiros, polícias, guardas-prisionais, oficiais de justiça e fucionários da Cruz Vermelha. Dos 27 milhões de euros que a empresa reclama, 19 milhões de euros dizem respeito ao Ministério da Defesa e quatro milhões à Justiça e à Administração Interna.
O assunto está, porém, longe de ser pacífico. O Ministério das Finanças afirma não ter conhecimento da situação, embora admita que isso é "estranho" pois deveria estar informado do que está a ser preparado para o próximo Orçamento. Já o Ministério da Justiça não ignora o assunto: Gonçalo Vilas Boas, assessor do ministro Aguiar Branco, diz que conhece o dossiê e que o mesmo "está em avaliação". O Ministério da Administração Intern, não só reconhece a dívida como afirma que já pagou "cerca de dois milhões" dos quatro milhões pedidos pela CP, de acordo com fonte oficial. Do ministério da Defesa, apesar de ter insistido durante vários dias, o PÚBLICO não obteve qualquer resposta.
A CP calcula que só em 2003 transportou nos seus serviços de longo curso 3,6 milhões de passageiros gratuitamente ou com reduções, a que corresponde uma não receita de 13.630.780 euros. Esta prática data de um tempo em que a então Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses se confundia com o próprio Estado, havendo classes sócio-profissionais que gozavam do privilégio de viajar de graça ou com reduções no preço dos bilhetes. A tradição tem-se mantido, apesar da empresa ter lançado novos produtos - os inter-cidades e os Alfas Pendulares - onde já não são concedidos desconto aos militares.
A própria União Europeia tem em preparação directivas comunitárias que visam uma maior transparência das contas das operadoras ferroviárias e que vão no sentido de acabar com as borlas ou de fazer pagar as entidades que delas beneficiam.
Fertagus credora do Ministério da Justiça
A empresa (privada) que detém a concessão do comboio na ponte não está sujeita às mesmas obrigações da CP e transporta, por isso, muito menos gente gratuitamente. Na Fertagus, os militares não têm desconto nem a maioria das classes sócio-profissionais que têm essa benesse na transportadora pública. A excepção são os magistrados, guardas-prisionais, agentes da Judiciária, funcionários do Instituto de Reinserção Social e outros da tutela do Ministério da Justiça, ao qual a Fertagus reclama o pagamento de 840 mil euros pelo seu transporte desde o início da concessão, em 1999.
De acordo com o contrato de concessão era suposto a empresa ser ressarcida pelo transporte destes funcionários, mas tal nunca se verificou devido a um hiato legislativo. A direcção-geral de Transportes Terrestres preparou, entretanto, uma proposta de protocolo entre a Fertagus e o Ministério da Justiça para desbloquear a situação.
Uma fonte oficial da empresa diz que espera vir a receber os 840 mil euros, confessando-se mais preocupada com a dívida das autarquias da margem Sul, que frequentemente lhes apresentam requisições de transporte de pessoas (escolas, lares de terceira idade, trabalhadores autárquicos, etc.) e depois tardam em pagar. À cabeça, disse, está a Câmara do Seixal, que "não paga há três anos e deve 40 mil euros".