Conspiração líbia para assassinar príncipe herdeiro saudita denunciada nos EUA
O destacado activista muçulmano Abdurahman Al-Amudi, 52 anos, natural da Eritreia e naturalizado norte-americano, admitiu na noite de sexta-feira perante o tribunal federal de Alexandria (estado da Virgínia, Leste dos EUA) integrar a suposta conspiração, após se ter assumido como culpado de três acusações sobre negócios ilegais com a Líbia. O procurador-geral norte-americano, John Ashcroft, citado ontem pela BBC online, já considerou que este caso forneceu "informações decisivas" na "guerra contra o terror" declarada pela administração de George W. Bush após os atentados de 11 de Setembro de 2001.
Um comunicado do Pentágono precisou que as três acusações criminais "estão relacionadas com as suas actividades nos Estados Unidos e com países e organizações que possuem ligações com o terrorismo", para além da eventual participação "numa conspiração destinada a assassinar um aliado na guerra contra o terrorismo". Mas como precisa o comunicado, as actuais acusações incluem apenas viagens e actividades comerciais não autorizadas com a Líbia, falsas declarações num formulário de imigração e infracções aos impostos destinadas a dissimular as suas relações comerciais ilegais com a Líbia.
Os documentos do tribunal acrescentam ainda que Al-Amudi, fundador do Conselho Muçulmano Americano e presidente da Federação Muçulmana Americana, admitiu contactar dissidentes sauditas em Londres, após solicitação de diversos responsáveis oficiais líbios, para organizarem o assassínio do príncipe saudita Abdullah.
O suspeito, de acordo com a documentação disponibilizada pelo tribunal, terá ainda referido que foi chamado a Tripoli por um responsável oficial líbio, que lhe transmitiu o descontentamento sobre a forma como o príncipe Abdullah se tinha dirigido ao líder líbio Muammar Kadhafi no decurso da conferência da Liga Árabe em Março de 2003.
"Dores de cabeça" em Riad
Na cimeira, Abdullah e Kadhafi envolveram-se numa acesa discussão pública, quando o líder líbio criticou a Arábia Saudita por albergar forças militares dos Estados Unidos, nas vésperas da invasão militar do Iraque. O príncipe saudita abandonou a reunião em sinal de protesto, sem deixar de invectivar Kadhafi sobre a forma como alcançou o poder.
Em Tripoli, e duas semanas após a cimeira, o responsável oficial líbio disse a Al-Amudi que pretendia punir os sauditas e provocar agitação e "dores de cabeça" na Arábia Saudita. Em encontros posteriores na Primavera de 2003, onde participou um "alto responsável oficial do Governo líbio", Al-Amudi terá informado que dissidentes sauditas já se tinham disponibilizado para promover o atentado. Os documentos disponibilizados revelam que, nos meses seguintes, Al-Amudi contactou com pelo menos dois sauditas em Londres e transportou centenas de milhares de dólares em dinheiro.
Responsáveis do FBI citados pela Reuters garantiram ainda que Al-Amudi lhes terá dito que a conspiração tinha sido aprovada com Kadhafi, mesmo que o líder líbio estivesse envolvido num processo de reaproximação do Ocidente, na sequência do desfecho do "caso Lockerbie" e na revelação do seu "programa nuclear".
O suspeito é passível de uma pena de prisão até 23 anos, de uma multa de 750 mil dólares (635 mil euros) e de uma revogação da cidadania. Este importante membro da comunidade muçulmana norte-americana deslocou-se pelo menos 10 vezes à Líbia numa época em que os cidadãos norte-americanos não eram autorizados a visitar o país. Os documentos divulgados precisam ainda que em Agosto de 2003 a alfândega britânica confiscou 340 mil dólares a Al-Amudi no aeroporto londrino de Heathrow, e no mês seguinte foi detido no aeroporto Dulles de Washington, por "falsas declarações aos responsáveis da imigração". Encontra-se preso desde então.
A Líbia - que recentemente deixou de figurar na "lista negra" dos chamados "Estados párias" após uma espectacular reaproximação entre Tripoli, Londres e Washington - já reagiu e negou categoricamente qualquer envolvimento nesta suposta conspiração para assassinar o príncipe herdeiro saudita.