Importações portuguesas de "boi gordo" disparam com picanha em destaque

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Os sabores da carne brasileira conquistaram definitivamente os portugueses DR

As importações portuguesas de carne bovina brasileira mais do que duplicaram nos últimos três anos, com a "picanha" em destaque nos restaurantes e supermercados, onde a carne do chamado “boi gordo” conquistou um espaço próprio.

De acordo com dados do departamento de estatísticas europeu Eurostat, as importações portuguesas de carne bovina do Brasil - fresca ou refrigerada - mais do que duplicaram, passando de 862 toneladas em 2000 para 2.396 toneladas em 2003.

Este aumento de 178 por cento não contabiliza as importações indirectas via Holanda, Alemanha ou Espanha, placas giratórias na União Europeia das importações de carne com proveniência da América Latina.

"Portugal é o único mercado da UE onde cortes como a picanha, a maminha ou o cupim, (a bossa do zebu) têm procura", explicou à agência Lusa Fernando Sampaio, responsável pelo mercado português, na importadora/exportadora holandesa Zandbergen, uma das maiores da Europa.

O défice crónico em carne de Portugal - que importa quase 50 por cento do seu consumo - aliado à "ligação muito especial" ao Brasil, explica a boa aceitação da carne desta região do mundo em Portugal, indica o técnico.

Segundo Fernando Sampaio, a tendência é para um aumento sustentado das importações em proveniência do Brasil, país que em 2003 se tornou primeiro fornecedor de carne bovina da UE, suplantando a Argentina.

Na rede de supermercados Carrefour, a carne bovina do Brasil e da Argentina já representa uns 10 por cento nas vendas da família do novilho, de acordo com dados obtidos junto da cadeia de distribuição. Os cortes mais vendidos são a picanha e a maminha.

Na cadeia Continente, é num espaço próprio e com a indicação "Carnes da América do Sul", que são comercializados os cortes embalados sob vácuo dos bois criados em pastos no Brasil, na Argentina, no Uruguai ou ainda Paraguai.

Com maior visibilidade em Portugal do que noutros países da UE, a carne bovina brasileira entrou em força no supermercado na década de 90 aproveitando, nomeadamente, a crise das vacas loucas que afectou a Europa.

Brasil em força

Com um efectivo bovino de 170 milhões de cabeças, o segundo maior após a Índia, o Brasil investiu fortemente nos últimos anos neste segmento da sua agro-indústria.

Jogando o trunfo do gado "verde e limpo" alimentado em pasto, e livre da BSE (Encefalite Espongiforme Bovina), o governo, trabalhando em estreita ligação com o poderoso “lobby” dos produtores ABIEC (Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Bovino) passou a apostar na exportação de parte crescente da sua produção de carne.

Em Maio passado, o Brasil anunciou que ia abandonar o açúcar como produto prioritário nas negociações agrícolas entre o Mercosul e a União Europeia, para apostar na carne bovina.

Um aumento sensível dos contingentes com direitos alfandegários reduzidos vai estar portanto em cima da mesa, quando a maior parte da carne exportada pelo Brasil entrar na UE pagando tarifas alfandegárias plenas.

Produtores europeus preocupados

A forte progressão das importações de carne da América Latina e a política comercial e negocial agressiva adoptada pelos países do Mercosul estão a preocupar os produtores de carne bovina europeus, que receiam "cedências" da parte da União Europeia.

Para o presidente da Federação Portuguesa das Associações de Bovicultores (FEPAB), Francisco Carolino, a posição da Comissão Europeia neste dossier é "fragilíssima".

Os produtores europeus receiam "servir de moeda de troca barata", nestas negociações, declarou à agência Lusa este responsável, ao regressar de uma reunião de representantes do sector em Bruxelas.

Sem questionar a qualidade - sabor e aspecto - das carnes latino-americanas, destaca o fosso existente entre o nível de exigências em termos de segurança alimentar em vigor na UE e nos países em causa.

Segurança alimentar no centro das atenções

A chamada rastreabilidade "do prado ao prato", os controlos sanitários em todos os níveis da fileira, as obrigações decorrentes da luta contra a doença das vacas loucas (BSE) dão ao consumidor uma garantia de qualidade total mas têm "custos elevados" para a produção, sublinha Carolino.

Não sendo obviamente de desejar que se renuncie a estas exigências, seria de esperar que as mesmas regras sejam impostas aos países exportadores, que estão neste domínio "a anos-luz" da Europa, defende.

Para os produtores europeus trata-se de assegurar uma situação de "concorrência leal".

Das negociações encetadas dependerá essencialmente o nível de preço em que a carne latino-americana entrará na UE, já que o aumento das importações nos próximos anos se afigura inevitável.

Tradicionalmente excedentária em carne bovina, a União passou em 2003 a "ligeiramente deficitária" e de acordo com projecções comunitárias para o horizonte 2010 - que antecipam uma quebra marginal da produção de 1,6 por cento e um aumento do consumo de 13,2 por cento - as importações deverão aumentar 41 por cento.

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