O regime fiscal das fundações

Se quiserem aproveitar o papel ímpar das pequenas e médias empresas ligadas à indústria de segurança, as políticas públicas devem apoiá-las na colaboração com as grandes empresas locais, na investigação e desenvolovimento, na descoberta de novos mercados e na disseminação do conhecimento à área civil

As fundações surgiram na Idade Média como instrumento para a burguesia e nobreza poderem deixar, após a sua morte, bens ou direitos a instituições religiosas. Porém, é nos finais do século XIX, com a explosão do crescimento económico gerado pela industrialização, que se verifica uma proliferação de fundações privadas criadas para fins caritativos, educativos ou sociais. São muitos e conhecidos os exemplos de detentores de grandes fortunas que no século XX instituiriam fundações, tais como Rockefeller, Henry Ford, Calouste Gulbenkian. Dado terem fins de carácter filantrópico, os Estados rapidamente criaram um regime fiscal particularmente atraente, estimulando ainda mais o crescimento destas. Por exemplo, nos Estados Unidos, de acordo com uma lei de 1913, as fundações que se dedicassem a fins altruístas estavam isentas de pagamento de imposto. Mas a criação de fundações nem sempre esteve ligada à prossecução de finalidades altruístas. Estas foram também usadas para afectar um património a determinada linhagem familiar, instituindo-se assim uma "fundação familiar". Porém, com os ideais da Revolução Francesa, foi desaparecendo de muitas ordens jurídicas a possibilidade de instituição deste tipo de fundações. Portugal, muito permeável à influência francófona, proibiu a existência deste tipo de fundações, obrigando a que tenham de prosseguir fins de interesse social. Diferentemente, veja-se o exemplo das "Stiftung" na Alemanha, cujo fim tem apenas de ser permitido por lei, não ofender os bons costumes e não ser uma actividade comercial.Mas é precisamente por a existência de uma fundação estar ligada a uma finalidade de interesse social que desde cedo o seu regime fiscal tem sido claramente favorável. Até porque é frequente as fundações assumirem funções sociais, diferindo do Estado apenas na medida em que o fazem com uma maior eficácia de gestão. Há uma frase muito interessante sobre fundações reveladora desta ideia e que afirma que "a principal diferença entre o Estado e uma fundação é que este por cada dólar que recebe desperdiça 90 cêntimos e aplica bem 10, uma fundação desperdiça 10 e aplica bem 90". Bem merece o regime fiscal privilegiado.Em Portugal, há basicamente três regimes fiscais aplicáveis a fundações, variando conforme o tipo de actividade que exercem e se são ou não declaradas pessoas colectivas de utilidade pública. Veja-se por exemplo o caso da Fundação Calouste Gulbenkian, que foi instituída para fins caritativos, artísticos, educativos e científicos, tendo sido declarada pessoa colectiva de utilidade pública em 1979. Ficou por isso isenta de pagamento de IRC e alguns impostos sobre o património. Será provavelmente o que irá acontecer com o vastíssimo património generosamente deixado pelo senhor António Champalimaud para instituir uma fundação em nome dos seus pais e que se destina a contribuir para a investigação e avanço da ciência médica, uma área tão carenciada em Portugal (um bom exemplo que deveria ser seguido por outros empresários portugueses). As fundações que ainda assim prossigam fins de interesse social, mas que não vejam reconhecida utilidade pública pelo Estado, e que não exerçam a título principal actividade comercial, também usufruem de alguns benefícios fiscais.De acordo com este regime especial, será devido imposto sobre o rendimento global a uma taxa de 20 por cento, que corresponde à soma de todos os rendimentos considerados em sede de IRS sujeitos a tributação (por exemplo, as rendas que a fundação receba provenientes de imóveis, as mais valias realizadas com a venda de imóveis). Mas outros rendimentos estão isentos de tributação, designadamente as quotas pagas pelos associados em conformidade com os estatutos e os subsídios e incrementos patrimoniais obtidos a título gratuito, uns e outros destinados à directa e imediata realização dos seus fins estatutários. E existem outros que conferem a possibilidade de dedução de 50 por cento, caso resultem de lucros distribuídos por entidades residentes sujeitas e não isentas de IRC ou de rendimentos auferidos, na qualidade de associado, da associação em participação, desde que estes rendimentos tenham sido efectivamente tributados.O terceiro caso são fundações que exercem a título principal actividade comercial, industrial ou agrícola, que ficam sujeitas aos impostos normais pagos por qualquer empresa ou pessoa. Como em tudo na vida, há do bom e do mau e há fundações em Portugal que não merecem os benefícios fiscais que usufruem. Há no entanto outras, como a Fundação Gulbenkian, Serralves e a futura fundação a instituir por vontade de António Champalimaud, que pelos fins que prosseguem ou irão prosseguir e pelo progresso que originaram no nosso país, não só merecem a tutela e benefícios fiscais que lhes foram atribuídos, como o reconhecimento de todos nós pelo papel fundamental que têm desempenhado e desempenham na sociedade portuguesa.tguerreiro@fcguerreiro.com

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