As invenções solares do Padre Himalaya recordadas 100 anos depois

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O pireliófero recebeu o "Grand Prix" na Exposição Mundial de St. Louis, nos EUA DR

Em 1904, um português, conhecido como Padre Himalaya, recebia o "Grand Prix" na Exposição Mundial de St. Louis, nos EUA, por um engenho - chamado pireliófero - que utilizava a energia solar para derreter rochas e metais. "Era um defensor do desenvolvimento sustentável há 100 anos", sublinha Manuel Collares Pereira, que apresenta hoje, no Pavilhão do Conhecimento, em Lisboa, uma conferência sobre a vida e obra deste padre cientista, no âmbito das comemorações do Dia da Energia.

O pireliófero - que significa "eu trago o fogo do sol" - era uma estrutura de aço de 13 metros de altura e com uma larga superfície de 80 metros quadrados, formada por milhares de pequenos espelhos que reflectiam a luz do Sol num pequeno forno onde se fundiam rochas e metais, a uma temperatura que ascendia aos 3500 graus Celsius.

O seu inventor, Manuel António Gomes, nascera em 1868, no concelho de Arcos de Valdevez. A alcunha só a receberia anos mais tarde, no seminário, devido à sua elevada estatura.

O nome seria imortalizado ainda numa outra invenção - a himalaíte - um explosivo que rivalizava em eficácia com a dinamite e que terá suscitado o interesse dos EUA. Não terá vendido a patente, segundo ele próprio afirmou numa palestra da Liga Naval, por fidelidade à pátria, já que lhe era exigida a naturalização como cidadão norte-americano.

Mas o Padre Himalaya patenteou muitos outros inventos, desde motores que aproveitavam a força das marés para produzir energia eléctrica até máquinas para tratamento de lixos industriais. Defendeu a arborização do país e a criação de centrais hidroeléctricas por todo o território nacional.

"Não foi apenas um inventor técnico", explica Jacinto Rodrigues, autor do livro "A conspiração solar do Padre Himalaya", lançado em 2002. "Era um precursor do pensamento ecológico", que pensou os problemas do país à luz desta visão. Numa época em que o petróleo começava a ser usado, foi um grande defensor das energias renováveis, que entendia serem úteis para países, como Portugal, com poucos combustíveis fósseis.

Em 1909, apresentou um plano, na Academia de Ciências, onde previa a construção de uma ponte, a apenas 300 metros do actual traçado da ponte Vasco da Gama. Esta ponte suportaria ainda uma maquinaria de turbinas que utilizava a força das águas para produzir energia eléctrica e assim iluminar a cidade de Lisboa.

Os últimos anos, passou-os na Argentina, para onde partiu em 1927 com esperança de encontrar "um lugar onde as suas propostas pudessem vingar", conta Jacinto Rodrigues. Mas, numa experiência com plantas medicinais, ter-se-á envenenado e regressou a Portugal já muito doente. Morreria pouco depois em Viana do Castelo.

Dezenas de anos depois, a energia solar continua a ser pouco utilizada em Portugal, apesar de ser dos países europeus com maior número de horas de Sol por ano. Uma questão que é debatida hoje no Pavilhão do Conhecimento, numa iniciativa organizada pela Sociedade Portuguesa de Energia Solar, pelo Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação e pelo Programa Ciência Viva. Para além de uma demonstração de fogões solares, será divulgado um programa nacional que procura criar um mercado sustentável de colectores solares para o aquecimento de água. É apresentada também a futura central solar do Alentejo, que começa este ano a ser instalada na Amareleja, no concelho de Moura e que será a maior da Europa.

Tudo para mostrar que "hoje também temos coisas notáveis" no campo das energias renováveis, diz Collares Pereira. Como, há 100 anos, quando uma máquina solar deixava para a história o nome de um português de estatura e visão invulgares.

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