Israel admite corrigir traçado do muro na Cisjordânia

O Governo israelita está disposto a "reconsiderar" o traçado do muro de segurança, anunciou ontem o procurador do Estado, Michael Blass, perante o Supremo Tribunal que começou a analisar em Jerusalém dois recursos contra a legalidade daquela linha. Entretanto, a direcção palestiniana ameaça declarar a independência da Palestina em resposta ao "programa de separação unilateral" do primeiro-ministro Ariel Sharon."A vedação [termo israelita para o muro] será provavelmente deslocada (...) de forma a facilitar tanto quanto possível a vida dos palestinianos", disse Blass. Na véspera, declarara ao diário "Ha'aretz" que a Procuradoria estava a estudar uma deslocação da "vedação" para mais perto da Linha Verde, a fronteira internacionalmente reconhecida, de modo a eliminar a maioria das situações de enclave.Os recursos foram apresentados por duas organizações israelitas, o Centro de Defesa do Indivíduo e a Associação para os Direitos Cívicos, que contestam, não a construção do muro, mas a sua implantação em território palestiniano, que consideram ilegal e que isolará, segundo a ONU, perto de 350 mil palestinianos. A reunião do Supremo Tribunal ocorre antes do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) de Haia examinar, a 23 de Fevereiro, um pedido de parecer da Assembleia Geral da ONU, que aprovou em 8 de Dezembro passado uma resolução que condena a construção do muro. O Governo israelita ainda não decidiu se envia uma delegação de juristas a Haia ou se boicota a sessão.Haia e as pressões dos Estados Unidos parecem estar por trás deste recuo táctico. O correspondente do "New York Times" em Jerusalém admite a mudança de traçado da linha, de modo a torná-la "mais aceitável" para Washington. A declaração mais importante foi feita em Munique, Alemanha, pelo presidente do Conselho Nacional de Segurança, Giora Eiland, o homem encarregado por Sharon de elaborar a versão final do seu "programa de separação unilateral". Disse que os planeadores da "vedação" falharam na avaliação da perturbação da vida quotidiana de "palestinianos inocentes" e que era necessário "corrigir esses erros" e "mudar o traçado original".Há semanas, o ministro da Justiça, o centrista Tommy Lapid, advertiu o Governo: "Há o risco real de nos expormos a um boicote internacional, como foi o caso da África do Sul até à queda do regime."Concebido para impedir a entrada de terroristas em território israelita, o muro rapidamente passou a englobar colonatos, devendo no final incluir 80 por cento dos 220 mil colonos da Cisjordânia e 200 mil israelitas de Jerusalém Oriental (árabe). Ao penetrar profundamente em território palestiniano, o muro torna-se num instrumento de anexação. O Governo admitiria reduzir a sua extensão de 760 para 670 quilómetros. Na versão original deveria ter 350.O anúncio da retirada unilateral dos colonatos de Gaza, feito há uma semana por Ariel Sharon, deu credibilidade ao seu "programa de separação unilateral". Os palestinianos vêem satisfeita uma imensa reivindicação sem nada lhes ser pedido em troca. Não se trata contudo de uma oferta: o primeiro-ministro cede em Gaza para reforçar a colonização da Cisjordânia. A "separação unilateral" significa, de facto, o abandono do processo negocial do "Roteiro" para a paz, o que desagrada a Washington. Mas em ano eleitoral, baixa a margem de intervenção americana.Ontem, o dirigente palestiniano Yasser Abed Rabbo, próximo de Yasser Arafat e um dos promotores da Iniciativa de Genebra, anunciou que a Organização de Libertação da Palestina (OLP) estava a estudar a resposta ao plano Sharon, declarando que uma das opções é a Autoridade Palestiniana "proclamar-se como autoridade representativa do Estado palestiniano independente nas fronteiras de 1967 e com Jerusalém como capital". Pediria imediatamente o reconhecimento da ONU e da comunidade internacional. A OLP fizera idêntica ameaça em Setembro de 2000, depois do fracasso das negociações com Israel, recuando perante a pressão internacional. Recentemente, tanto Arafat como o seu primeiro-ministro Ahmed Qorei (Abu Ala) tinham feito a ameaça inversa, sublinhando que o modelo de "dois Estados" estava a ser inviabilizado por Israel e que, nesse caso, apostariam num Estado único e na luta pelo princípio "um homem, um voto", jogando na sua futura maioria demográfica.O conselheiro de Sharon, Zalman Shoval, respondeu que caso a Autoridade Palestiniana proclame a independência, Israel anexará as "terras em disputa", ou seja, grande parte da Cisjordânia.

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