O gremlin

"Looney Tunes..." marca, após cinco anos de ausência, o reencontro com uma ave rara: aos 57 anos, Joe Dante é talvez o último dos grandes artesãos de Hollywood (o seu sonho sempre foi ser como Jack Arnold, o mestre da série B por trás de "O Monstro da Lagoa Negra"), capaz de se mover por diversos projectos sem deixar de lhes impor cunho pessoal. O "carimbo" está lá: delírio "cartoonesco", humor anárquico e bulimia cinéfila.

A sua infância e juventude, nos 50's e 60's, foram marcadas pela relação obsessiva com a cultura "pop": TV, BD, cartoons, cinema. Devorava tudo, mas guardava no coração um cantinho para os filmes B de terror e FC. Por isso, não espantou que aos 13 anos enviasse a primeira carta à mítica revista "Famous Monsters of Filmland", e que aos 16 já escrevesse para a concorrente "Castle of Frankenstein". Ou que a entrada "a sério" no cinema se fizesse - como Coppola, Scorsese, Bogdanovich... - sob a égide de Roger Corman. Para a companhia da lenda da "exploitation", New World, foi montador de "trailers" (muitas vezes incluindo cenas de outros filmes que não o anunciado...) e realizador de duas pérolas de baixo orçamento.

Pode-se dizer que já estava tudo aí, em "Hollywood Boulevard" (76) - paródia/homenagem à "exploitation" construída à volta de excertos de outros títulos da New World, no seguimento de uma aposta com Corman de que seria possível fazer o filme mais barato de sempre da produtora... - e "Piranha" (78), plágio auto-irónico de "Tubarão". Mas o primeiro momento decisivo é "The Howling" (81), filme de lobisomens e sublime ilustração do "Dante touch": colagem de registos e géneros; humor cortante, que parodia e homenageia o fantástico; profusão de "private jokes" cinéfilas e recurso às velhas glórias (John Carradine ou o incontornável Dick Miller) da tão querida série B, para explicitar a dimensão de segunda instância e a multiplicidade de níveis de leitura.

Clássico moderno (e o filme mais sensual de Dante), valeu ao autor o passaporte para Hollywood, pela mão de um fã, Spielberg, que o convidou a dirigir um dos segmentos de "Twilight Zone: The Movie" (83), homenagem à série de TV de culto. Devido à tragédia que assolou a produção - na rodagem do episódio de John Landis, um acidente matou o actor Vic Morrow -, Dante gozou de inusitada liberdade. O resultado foi "It's a Good Life", peça essencial na evolução do cinema do realizador e um dos objectos mais bizarros e a sair de um estúdio. Surrealista e alucinatório, era a versão demoníaca de um "cartoon" da Warner - Dante consultou um dos seus heróis, Chuck Jones, pai de Bip-Bip, Coiote ou Pepe Le Pew - e uma visão sombria da família americana, com os adultos reféns aterrorizados de uma criança-monstro.

A associação com Spielberg prosseguiu com "Gremlins" (84), o único grande êxito de Dante. A fusão de comédia e terror tornava-se mais clara, como se o sentimentalismo "cute" de Spielberg e o idealismo de Capra - a cidade destruída no Natal pelos monstros funcionava como réplica, às avessas, da Bedford Falls de "Do Céu Caiu Uma Estrela" - fossem assaltados pelos sustos de um "filme de monstros" e pela anarquia absurda do burlesco e do desenho animado.

Ficava traçado o destino de Dante: terrorista, qual "gremlin" perverso, no seio da indústria, corroendo os alicerces do "mainstream" com a sua veia subversiva (alimentada em criança, nas páginas da "Mad"). Por isso, quando a Warner lhe propôs a continuação do inesperado sucesso, recusou até lhe ser dada carta branca para fazer o que quisesse. E nasceu "Gremlins 2" (90), o cume da arte do realizador.

Obra-prima absoluta, foi o "Heaven's Gate" de Dante, paródia que fintava as expectativas dos espectadores, troçava do primeiro filme e de todo o "merchandising" derivado e punha a nu o absurdo da noção de sequela (em qualquer caso, é, como "O Padrinho II", um dos exemplos em que o original foi ultrapassado). A lógica era a de um "cartoon" gigante, com a auto-referencialidade pós-moderna (os "gremlins" chegavam a parar o filme) e as alusões cinematográficas - de "Rambo III" a "O Feiticeiro de Oz", ou um número musical "à la" Busby Berkeley - a atingir a saturação. A metáfora anti-capitalismo selvagem era simples: as criaturas como produto de uma sociedade sem alma. Resultado: "flop"...

Dante avançou então para "Matinee" (93), a sua obra mais pessoal. Evocação de um tempo perdido (o início dos 60's), em que um grupo de miúdos espera impacientemente por "Mant!" - o filme dentro do filme, saborosa revisitação dos "monster movies" da era atómica -, era uma carta de amor a um tipo de cinema, feito de ingenuidade, desaparecido. É um dos grandes filmes, esquecidos, da década.

Depois, o reencontro com Spielberg em "Small Soldiers" (98) e novo dissabor comercial. Dante transformou um filme para crianças numa demencial parábola antimilitarista: dois grupos de bonecos ganham vida e confrontam-se num subúrbio do Ohio. Eterno sabotador, para Dante os "bons", soldados patriotas e representantes da autoridade, são brutamontes sádicos, e os "maus", "monstros" "outsiders" gentis. Mas as subtilezas satíricas passaram despercebidas à crítica americana, que crucificou o filme ("hipócrita", por ser demasiado "violento"), suposta tentativa de "remake" de "Gremlins" e "cópia maldosa" de "Toy Story"...

Visto agora, pelo cruzamento entre dois "mundos", é um esboço para "Looney Tunes", o corolário lógico de toda uma obra, universo maravilhoso onde tudo é possível. Como nos "cartoons".

Special Guests

Nos filmes de Joe Dante, a memória do cinema está sempre presente, quer pela citação de cenas, quer pelo recurso a ícones da 7ª arte. "Looney Tunes" não foge à regra: as piscadelas de olho a "Psico" ou "Star Wars" são deliciosas, mas mais divertido ainda é o desfile de "convidados especiais". Aqui ficam alguns:

Roger Corman

Eminência da "exploitation", surge no filme como o realizador de um novo "Batman" (Corman à frente de um "blockbuster"? Só mesmo ficção...). É uma das figuras mais influentes do cinema americano, venerado pela geração de "baby-boomers" que cresceu a absorver os seus filmes feitos por tuta e meia num par de dias. A reavaliação como autor chegou na década de 60, com as mais ambiciosas adaptações de Poe. À excepção do infeliz "Frankenstein Unbound" (90), deixou a realização em 70 (foram cerca de 50 títulos, desde 1954), mas a sua importância como produtor não pode ser esquecida, pela quantidade de jovens talentos - de Coppola a Cameron - que formou (e explorou...). Dante foi um deles e não esqueceu a dívida. Por isso, em "The Howling", pôs Corman à cata de moedas numa cabine telefónica...

Mary Woronov

A vice-presidente da pérfida ACME é na verdade um ícone da contra-cultura. Primeiro, nos anos 60, com a Factory de Warhol (entre vários filmes, foi uma das míticas "Chelsea Girls" e da experiência saiu um livro, "Swimming Underground"), depois, a partir de meados dos 70's, com a New World de Corman, tem passeado a sua beleza exótica, entre sensualidade e frieza, pelas margens. Estrela de culto por excelência, alta e de voz rouca, agraciou inúmeros produtos "offbeat" com a sua presença fascinante, entre eles os clássicos "Rock 'n' Roll High School" (uma reitora autoritária, ao lado dos Ramones) e "Eating Raoul" (é Mary Bland, homicida reaccionária), do amigo Paul Bartel, ou o irresistível "Hollywood Boulevard", de Dante, para quem faz de diva "trash" egocêntrica. Além de actriz, é também pintora e escritora. O primeiro romance, "Snake", é essencial.

Série B

Mesmo num filme dedicado aos "Looney Tunes", Dante não podia deixar de lado a homenagem aos títulos da série B que marcam o seu imaginário. Numa das cenas, vemos entrar Kevin MacCarthy, a preto e branco e tudo, saído de "Invasion o the Body Snatcher", de Don Siegel (1956). E numa das melhores sequências, Bugs Bunny e Daffy cruzam-se com célebres protagonistas das ficções de terror e FC dos 50's e 60's. O destaque vai para Robby the Robot, o simpático (e falador) companheiro artificial de Walter Pidgeon em "Forbidden Planet" (56), que Dante convoca pela terceira vez, após "Hollywood Boulevard" e "Gremlins". Mas outros não faltam à chamada, do ET benigno do "Man From Planet X" (51) de Edgar Ulmer às plantas assassinas de "Day of the Triffids" (62), passando pelos Daleks, mutantes guerreiros e principal ameaça na popular série de TV inglesa "Dr. Who" (iniciada em 63).

Special Guests

Nos filmes de Joe Dante, a memória do cinema está sempre presente, quer pela citação de cenas, quer pelo recurso a ícones da 7ª arte. "Looney Tunes" não foge à regra: as piscadelas de olho a "Psico" ou "Star Wars" são deliciosas, mas mais divertido ainda é o desfile de "convidados especiais". Aqui ficam alguns:

Roger Corman

Eminência da "exploitation", surge no filme como o realizador de um novo "Batman" (Corman à frente de um "blockbuster"? Só mesmo ficção...). É uma das figuras mais influentes do cinema americano, venerado pela geração de "baby-boomers" que cresceu a absorver os seus filmes feitos por tuta e meia num par de dias. A reavaliação como autor chegou na década de 60, com as mais ambiciosas adaptações de Poe. À excepção do infeliz "Frankenstein Unbound" (90), deixou a realização em 70 (foram cerca de 50 títulos, desde 1954), mas a sua importância como produtor não pode ser esquecida, pela quantidade de jovens talentos - de Coppola a Cameron - que formou (e explorou...). Dante foi um deles e não esqueceu a dívida. Por isso, em "The Howling", pôs Corman à cata de moedas numa cabine telefónica...

Mary Woronov

A vice-presidente da pérfida ACME é na verdade um ícone da contra-cultura. Primeiro, nos anos 60, com a Factory de Warhol (entre vários filmes, foi uma das míticas "Chelsea Girls" e da experiência saiu um livro, "Swimming Underground"), depois, a partir de meados dos 70's, com a New World de Corman, tem passeado a sua beleza exótica, entre sensualidade e frieza, pelas margens. Estrela de culto por excelência, alta e de voz rouca, agraciou inúmeros produtos "offbeat" com a sua presença fascinante, entre eles os clássicos "Rock 'n' Roll High School" (uma reitora autoritária, ao lado dos Ramones) e "Eating Raoul" (é Mary Bland, homicida reaccionária), do amigo Paul Bartel, ou o irresistível "Hollywood Boulevard", de Dante, para quem faz de diva "trash" egocêntrica. Além de actriz, é também pintora e escritora. O primeiro romance, "Snake", é essencial.

Série B

Mesmo num filme dedicado aos "Looney Tunes", Dante não podia deixar de lado a homenagem aos títulos da série B que marcam o seu imaginário. Numa das cenas, vemos entrar Kevin MacCarthy, a preto e branco e tudo, saído de "Invasion o the Body Snatcher", de Don Siegel (1956). E numa das melhores sequências, Bugs Bunny e Daffy cruzam-se com célebres protagonistas das ficções de terror e FC dos 50's e 60's. O destaque vai para Robby the Robot, o simpático (e falador) companheiro artificial de Walter Pidgeon em "Forbidden Planet" (56), que Dante convoca pela terceira vez, após "Hollywood Boulevard" e "Gremlins". Mas outros não faltam à chamada, do ET benigno do "Man From Planet X" (51) de Edgar Ulmer às plantas assassinas de "Day of the Triffids" (62), passando pelos Daleks, mutantes guerreiros e principal ameaça na popular série de TV inglesa "Dr. Who" (iniciada em 63).

Special Guests

Nos filmes de Joe Dante, a memória do cinema está sempre presente, quer pela citação de cenas, quer pelo recurso a ícones da 7ª arte. "Looney Tunes" não foge à regra: as piscadelas de olho a "Psico" ou "Star Wars" são deliciosas, mas mais divertido ainda é o desfile de "convidados especiais". Aqui ficam alguns:

Roger Corman

Eminência da "exploitation", surge no filme como o realizador de um novo "Batman" (Corman à frente de um "blockbuster"? Só mesmo ficção...). É uma das figuras mais influentes do cinema americano, venerado pela geração de "baby-boomers" que cresceu a absorver os seus filmes feitos por tuta e meia num par de dias. A reavaliação como autor chegou na década de 60, com as mais ambiciosas adaptações de Poe. À excepção do infeliz "Frankenstein Unbound" (90), deixou a realização em 70 (foram cerca de 50 títulos, desde 1954), mas a sua importância como produtor não pode ser esquecida, pela quantidade de jovens talentos - de Coppola a Cameron - que formou (e explorou...). Dante foi um deles e não esqueceu a dívida. Por isso, em "The Howling", pôs Corman à cata de moedas numa cabine telefónica...

Mary Woronov

A vice-presidente da pérfida ACME é na verdade um ícone da contra-cultura. Primeiro, nos anos 60, com a Factory de Warhol (entre vários filmes, foi uma das míticas "Chelsea Girls" e da experiência saiu um livro, "Swimming Underground"), depois, a partir de meados dos 70's, com a New World de Corman, tem passeado a sua beleza exótica, entre sensualidade e frieza, pelas margens. Estrela de culto por excelência, alta e de voz rouca, agraciou inúmeros produtos "offbeat" com a sua presença fascinante, entre eles os clássicos "Rock 'n' Roll High School" (uma reitora autoritária, ao lado dos Ramones) e "Eating Raoul" (é Mary Bland, homicida reaccionária), do amigo Paul Bartel, ou o irresistível "Hollywood Boulevard", de Dante, para quem faz de diva "trash" egocêntrica. Além de actriz, é também pintora e escritora. O primeiro romance, "Snake", é essencial.

Série B

Mesmo num filme dedicado aos "Looney Tunes", Dante não podia deixar de lado a homenagem aos títulos da série B que marcam o seu imaginário. Numa das cenas, vemos entrar Kevin MacCarthy, a preto e branco e tudo, saído de "Invasion o the Body Snatcher", de Don Siegel (1956). E numa das melhores sequências, Bugs Bunny e Daffy cruzam-se com célebres protagonistas das ficções de terror e FC dos 50's e 60's. O destaque vai para Robby the Robot, o simpático (e falador) companheiro artificial de Walter Pidgeon em "Forbidden Planet" (56), que Dante convoca pela terceira vez, após "Hollywood Boulevard" e "Gremlins". Mas outros não faltam à chamada, do ET benigno do "Man From Planet X" (51) de Edgar Ulmer às plantas assassinas de "Day of the Triffids" (62), passando pelos Daleks, mutantes guerreiros e principal ameaça na popular série de TV inglesa "Dr. Who" (iniciada em 63).

Special Guests

Nos filmes de Joe Dante, a memória do cinema está sempre presente, quer pela citação de cenas, quer pelo recurso a ícones da 7ª arte. "Looney Tunes" não foge à regra: as piscadelas de olho a "Psico" ou "Star Wars" são deliciosas, mas mais divertido ainda é o desfile de "convidados especiais". Aqui ficam alguns:

Roger Corman

Eminência da "exploitation", surge no filme como o realizador de um novo "Batman" (Corman à frente de um "blockbuster"? Só mesmo ficção...). É uma das figuras mais influentes do cinema americano, venerado pela geração de "baby-boomers" que cresceu a absorver os seus filmes feitos por tuta e meia num par de dias. A reavaliação como autor chegou na década de 60, com as mais ambiciosas adaptações de Poe. À excepção do infeliz "Frankenstein Unbound" (90), deixou a realização em 70 (foram cerca de 50 títulos, desde 1954), mas a sua importância como produtor não pode ser esquecida, pela quantidade de jovens talentos - de Coppola a Cameron - que formou (e explorou...). Dante foi um deles e não esqueceu a dívida. Por isso, em "The Howling", pôs Corman à cata de moedas numa cabine telefónica...

Mary Woronov

A vice-presidente da pérfida ACME é na verdade um ícone da contra-cultura. Primeiro, nos anos 60, com a Factory de Warhol (entre vários filmes, foi uma das míticas "Chelsea Girls" e da experiência saiu um livro, "Swimming Underground"), depois, a partir de meados dos 70's, com a New World de Corman, tem passeado a sua beleza exótica, entre sensualidade e frieza, pelas margens. Estrela de culto por excelência, alta e de voz rouca, agraciou inúmeros produtos "offbeat" com a sua presença fascinante, entre eles os clássicos "Rock 'n' Roll High School" (uma reitora autoritária, ao lado dos Ramones) e "Eating Raoul" (é Mary Bland, homicida reaccionária), do amigo Paul Bartel, ou o irresistível "Hollywood Boulevard", de Dante, para quem faz de diva "trash" egocêntrica. Além de actriz, é também pintora e escritora. O primeiro romance, "Snake", é essencial.

Série B

Mesmo num filme dedicado aos "Looney Tunes", Dante não podia deixar de lado a homenagem aos títulos da série B que marcam o seu imaginário. Numa das cenas, vemos entrar Kevin MacCarthy, a preto e branco e tudo, saído de "Invasion o the Body Snatcher", de Don Siegel (1956). E numa das melhores sequências, Bugs Bunny e Daffy cruzam-se com célebres protagonistas das ficções de terror e FC dos 50's e 60's. O destaque vai para Robby the Robot, o simpático (e falador) companheiro artificial de Walter Pidgeon em "Forbidden Planet" (56), que Dante convoca pela terceira vez, após "Hollywood Boulevard" e "Gremlins". Mas outros não faltam à chamada, do ET benigno do "Man From Planet X" (51) de Edgar Ulmer às plantas assassinas de "Day of the Triffids" (62), passando pelos Daleks, mutantes guerreiros e principal ameaça na popular série de TV inglesa "Dr. Who" (iniciada em 63).

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