Portugal pede à UE adiamento da decisão sobre abertura das águas portuguesas
Frazão Gomes confessou que o Governo pediu à presidência italiana da União Europeia (EU) que "não faça precipitar uma decisão", enquanto decorrem as negociações bilaterais entre Portugal e Espanha. "Não temos uma estratégia dilatória, mas queremos chegar a um acordo que satisfaça as duas partes", adiantou o governante, que participou ontem num fórum sobre o futuro das pescas, em Vila do Conde, promovido pela autarquia local. Frazão Gomes disse que, esta semana, foram dadas instruções a todos os embaixadores nas capitais europeias para que convençam os governos locais de que uma "decisão precipitada terá consequências imprevisíveis".
No entanto, contrariando as expectativas dos presentes, o secretário de Estado escusou-se a revelar o ponto da situação nas negociações com Madrid, justificando que a "sensibilidade política" exige do Executivo o maior dos segredos. Assim, apenas adiantou que "já houve avanços" e que, em cima da mesa, está a negociação de um "acordo global em matéria de pescas que inclui o estabelecimento de acordos fronteiriços em relação aos rios Minho e Guadiana".
O secretário de Estado reclamou que, desde que a Comissão Europeia anunciou "a sua posição de princípio - obrigar Portugal a abrir a sua ZEE" - já compreendeu que a entrada da frota espanhola provocará "enormes consequências" nos recursos e meios portugueses. "É uma matéria difícil que está a envolver todo o Governo e que só pode ter um resultado: vencer", disse Frazão Gomes, que decepcionou as dezenas de armadores, sindicalistas e membros de associações que acorreram ao fórum, ávidos por conhecerem novidades.
Sindicato quer acções de luta"Entrámos com o pé descalço e saímos com o pé descalço", ironizou José Trocado Gabriel, presidente da Apropesca- Organização de Produtores de Pesca Artesanal. O mesmo lamento foi deixado, no final, por António Pontes, presidente da Associação de Armadores de Pesca do Norte e por António Macedo, coordenador do Sindicato dos Trabalhadores de Pesca do Norte. Este último revelou ao PÚBLICO que vai solicitar à federação onde está presente (um dos braços da CGTP) a criação imediata de um grupo de trabalho que prepare acções de luta. Isto porque Macedo prevê uma cedência do Governo a Espanha e "a entrada de um só barco espanhol já será uma derrota para Portugal e terá efeitos nocivos na frota portuguesa".
Ao longo da tarde, alguns dos intervenientes também se tinham queixado da falta de informação por parte do Governo. Foi o caso de José Apolinário, deputado do PS e ex-secretário de estado das Pescas, que teme o enredo do "filme" que está a ser preparado nas negociações com Madrid: "A pesca vai toda desaparecer, mas só daqui a três anos". Também Honório Novo (PCP) contestou o facto de a Assembleia da República "saber zero" do que se passa, mesmo depois de ter sido unânime a condenação, no Parlamento, da imposição da Comissão Europeia. O deputado comunista exortou o governo a ter "firmeza" já que, na sua opinião, a decisão da comissão "não tem sustentação política".
Do ponto de vista dos recursos, o investigador Bordalo e Sá, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, não tem dúvidas de que Portugal tem no horizonte um "caso muito grave". "Tem diminuído o pescado descarregado em lota e continua a grande dependência (45 por cento) da pesca da sardinha", disse. Ora, como sustentou Vasco Valdez, outros dos especialistas convidados, a frota espanhola utiliza "artes" mais agressivas que são proibidas em Portugal e que em pouco tempo dizimariam os pesqueiros da nossa ZEE.
Os proprietários de barcos que assistiram ao fórum realizado nas Caxinas (um lugar onde vive o maior núcleo piscatório do país) desdobravam-se em lamentos pela falta de informação sobre o futuro próximo da classe, o que está a amedrontar os pescadores e armadores. Por isso, Mário Almeida, presidente da Câmara, alertou o secretário de Estado para "os graves problemas sociais e económicos" da região, caso a proposta da comissão vá avante.