Torne-se perito

"Visão" afasta Clara Pinto Correia

A "Visão" acabou ontem com a colaboração que Clara Pinto Correia mantinha semanalmente na revista depois de ter descoberto que a escritora plagiou as suas duas últimas crónicas. Os seus dois últimos textos, publicados na rubrica "A Deriva dos Continentes", foram copiados - um praticamente por inteiro, outro apenas metade - de outros dois artigos que saíram recentemente na conceituada revista "The New Yorker". A revista portuguesa não aceitou as explicações dadas pela cronista e professora universitária.Depois de anteontem à tarde se ter sabido que o artigo de opinião assinado pela escritora na penúltima edição da "Visão" é uma cópia quase integral de um texto publicado a 6 de Janeiro pelo colunista David Remnick, ontem descobriu-se que a sua crónica da edição desta semana é também a tradução à letra de metade de um texto de Hendrik Hertzberg que saiu na "The New Yorker" a 13 de Janeiro. Anteontem, Clara Pinto Correia disse ao PòBLICO que para escrever as suas crónicas costuma utilizar material de diversas publicações, mas com as "devidas atribuições". O que acontecera desta vez fora uma "distracção" quando, ao cortar parte do seu texto por estar grande demais, acabou por retirar precisamente os comentários de sua autoria. E confessou-se "bastante envergonhada" pelo sucedido.O texto de Remnick, sobre a vida e obra de Vaclav Havel antes e durante o seu mandato como presidente da República Checa - que terminou a 2 de Fevereiro -, intitulava-se "Leaving the castle" ("Abandonando o castelo"). Na edição de dia 30 de Janeiro da "Visão", Clara Pinto Correia chamou ao seu artigo "O castelo", traduziu à letra quatro dos sete parágrafos do original sem citar qualquer fonte, alterou a ordem de um deles e acrescentou dez linhas no final. Na sua conclusão, a autora elogiava Havel: "A gente precisa de saber que há pessoas para quem dá gosto olhar."Na edição de ontem da "Visão", a docente universitária debruçava-se sobre o livro de David Frum, um antigo assessor e autor dos discursos de George W. Bush. O seu texto chamava-se "O eixo do mal". Ainda que o primeiro parágrafo e o último sejam comentários da autora, o resto, isto é, pouco mais de metade, trata-se novamente de uma tradução à letra. Desta feita do artigo de Hendrik Hertzberg intitulado "Axis Praxis" (algo como "A prática do eixo"). Diversos comentários de Clara Pinto Correia são também claramente inspirados no texto de Hertzberg.A direcção da revista ouviu ontem as explicações da escritora e professora universitária e, depois de conversar com o Conselho de Redacção, "resolveu suspender a publicação das crónicas", anunciou à redacção em comunicado. "Achámos que as explicações não eram válidas nem aceitáveis", disse ao PòBLICO o director-adjunto. Sem nunca querer falar em "plágio", Pedro Camacho acrescentou que "o que aquilo é está à vista de toda a gente; é irrefutável". A redacção está espantada com o caso e "ainda lhes custa a acreditar que isto se está a passar". A direcção da "Visão" contactou ontem os responsáveis da "The New Yorker" para lhes contar o que aconteceu. "Achámos que o devíamos fazer. Agradeceram a comunicação e talvez voltemos a falar sobre o assunto", afirmou Pedro Camacho.A "Visão" explicará aos seus leitores, na edição da próxima semana, os traços gerais deste processo. A direcção só teve conhecimento do caso na quarta-feira à tarde, quando a edição desta semana já estava impressa e a ser distribuída. O PòBLICO não conseguiu ontem voltar a contactar Clara Pinto Correia.O plágio (a utilização por uma pessoa de um texto, ou parte dele, de outro autor, mas apresentando-o como seu) não está consignado na lei com tal designação. De acordo com o Código do Direito de Autor, aquilo a que vulgarmente se chama plágio configura um crime de contrafacção e é punível, pela lei portuguesa, com pena de prisão até três anos e multa de 150 a 250 dias.

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