Jorge Miranda: proibição de filiação partidária combate clientelismo

“A garantia da isenção de titulares de cargos públicos no Estado democrático” é a razão apresentada pelo constitucionalista Jorge Miranda para ter proposto a proibição de filiação partidária aos ocupantes de altos cargos públicos no seu estudo feito para a Assembleia da República que serviu de base aos projectos de lei de partidos do PSD e do PS.

Esta sugestão de Jorge Miranda foi seguida à letra pelo PSD logo no seu primeiro projecto de lei dos partidos, apresentado em 2000, tendo, à época, merecido um violento parecer do presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos, que, ainda que admitindo o projecto à discussão, apontava várias violações da Constituição.

Agora, no âmbito da comissão eventual para a reforma do sistema político, o PSD ficou, no seio da coligação com o CDS, com a tarefa de reapresentar este projecto, enquanto aos centristas cabe avançar formalmente com a lei dos financiamentos. E voltou a apresentar o mesmo texto de 2000, por uma questão de coerência.

Quer o líder parlamentar do PSD, Guilherme Silva, quer o responsável social-democrata pelo “dossier” da reforma do sistema político, Luís Marques Guedes, assumiram, desde o início, que uma das razões pelas quais avançavam com o mesmo texto era para demonstrar, à partida, que estavam abertos a sugestões de alteração.

Tudo indica que a proposta do PSD venha a ser alterada na comissão e é provável que este ponto seja um dos que possam sofrer modificações, até porque as dúvidas sobre esta questão são várias. O responsável por este “dossier” no PS, o deputado e membro do secretariado socialista Alberto Martins afirmou ao PÚBLICO que a proposta do PSD configura “uma restrição excessiva de direitos”. O PÚBLICO sabe também que o próprio líder parlamentar do CDS, Telmo Correia, tem dúvidas sobre este ponto. E contactado pelo PÚBLICO, o constitucionalista e ex-líder do PSD, Marcelo Rebelo de Sousa comentou apenas: “É espantoso e é completamente surrealista.”

O princípio da isenção é inerente à democracia

Em defesa da ideia e do estudo que está na base dos dois projectos de lei e que é mantida na versão integral pelo PSD, o constitucionalista Jorge Miranda declarou ao PÚBLICO que as propostas avançadas por si no estudo “fundamse no princípio da isenção inerente à democracia”. E lembrou que, “por exemplo, o juiz já é proibido de militar em partidos pela lei da magistratura”. Já sobre os diplomatas, Jorge Miranda advogou que estes são “responsáveis pela política externa e pela soberania do Estado”.

Sustentando que deve ser garantida a “imparcialidade e a plena eficácia de actuação dos dirigentes”, Jorge Miranda assume que o objectivo da sua proposta é “acabar com o clientelismo”. Dá como exemplo as recentes nomeações de gestores hospitalares pelo actual Governo e adverte para que o mesmo privilegiar de militantes do partido no poder poderá acontecer com os gestores escolares.

E argumenta que, apesar de a lei portuguesa prever que os directores-gerais e equiparados são cargos de nomeação política, esse sistema deve ser alterado e introduzido um modelo de “carreiras públicas de administração como acontece em França, na Inglaterra e na Alemanha, em que os funcionários da administração são profissionais de carreira e não são nomeados por clientelismo”.

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