Mr. Smith e Mr. Jones

"Homens de Negro II" põe novamente fatos pretos e óculos escuros em Tommy Lee Jones e Will Smith. A sequela segue ao milímetro a fórmula do original, mas os dois actores não se preocupam com isso. "Faço qualquer coisa por dinheiro" (Mr. Jones). "Sou viciado em fazer as pessoas rir" (Mr. Smith). Conversámos (tentámos) com eles em Nova Iorque.

Tommy Lee Jones e Will Smith parecem os velhotes dos Marretas. Ou talvez uma versão mais sofisticada de Beavis & Butthead. Numa conferência de imprensa para promover "Homens de Negro II", em Nova Iorque, os dois actores riram-se constantemente, sussurraram piadinhas nos ouvidos um do outro e divertiram-se para lá do que é humanamente explicável a brincar com os gravadores dos jornalistas.

Will Smith foi sempre o primeiro a responder às questões da imprensa e o mais palavroso. Quando lhe perguntaram sobre como manter o interesse no trabalho ao filmar uma sequela, entrou numa laboriosa explicação sobre como fingir que não se estava a fazer uma sequela. "E tu Tommy, que é que achas?" Tommy Lee Jones, com um fato de "tweed" e uma gravata de gosto duvidoso, disse apenas: "Hmm, a mesma coisa."

A dinâmica entre mr. Jones e mr. Smith é o trunfo de "Homens de Negro II", uma sequela do filme de 1997 novamente realizada por Barry Sonnenfeld. Retoma as personagens de fatos pretos e óculos escuros, agentes secretos que defendem a Terra de "aliens" mal intencionados. Segue à risca a receita do primeiro filme. No original, o argumento acompanhava Tommy Lee Jones a pacientemente explicar o mundo dos "homens de negro" ao recruta Will Smith. Agora, os papéis invertem-se: é Smith que tem de mostrar os segredos de combater extraterrestres a Jones, cuja personagem teve a memória apagada no fim do primeiro filme e iniciou uma bucólica vida como funcionário dos correios.

A estrutura inclui inúmeras outras semelhanças em relação ao primeiro filme. Há uma personagem feminina, uma humana arrastada involuntariamente para uma conspiração extraterrestre (Rosario Dawson); um "alien" com planos para destruir a Terra (Lara Flynn Boyle); um lojista cuja cabeça é feita em bocadinhos (Tony Shalhoub); armas bizarras e de efeitos imprevisíveis (o "grilo barulhento" aparece outra vez); papéis secundários com vedetas de Hollywood em situações inesperadas (em particular, uma participação de Michael Jackson, que NÃO faz de extraterrestre).

"Homens de Negro II" também volta a ter um cão falante, "Frank the Pug". O cão é interpretado pelo mesmo animal do primeiro filme - embora, como o bicho já estivesse mais velho, tenham sido usados efeitos especiais para disfarçar os pelos brancos. O cão tem um papel reforçado, e acaba até por roubar algumas cenas, mesmo com piadas tão pouco subtis como pô-lo a ladrar ao ritmo da música "Who let the dogs out?".

Será que as estrelas do filme receiam a competição de um cão falante? Will Smith ouviu a pergunta, conferenciou aos sussurros com o outro velhote dos Marretas, os dois desataram a rir e depois respondeu: "Sou viciado em fazer as pessoas rir. Tudo o que resulte em comédia para mim serve. Tenho instintivamente de pôr as pessoas a rir, seja de que maneira for."

Will, o "rapper"

Tal como o filme original, este passa-se em Nova Iorque. Na primeira versão do argumento, escrita antes do 11 de Setembro, a cena final passava-se no topo do World Trade Center. "É quase fazer batota ver o filme aqui em Nova Iorque", dizia Will Smith, "porque há uma série de piadas que só as pessoas de cá é que vão perceber" - como uma em que é revelado que certos extraterrestres só têm autorização para circular pelo bairro da East Village, onde se presume que ninguém dará por eles.

Outra semelhança entre o primeiro e o segundo filmes é que a canção principal de "Homens de Negro II" ("Black suits comin'") foi convertida no single de promoção do novo álbum de Will Smith, "Born to Reign". Smith começou a sua carreira na música, e embora se tenha tornado mais famoso como actor não renega as origens: "Considero-me antes de tudo um 'rapper'."

O novo disco tem o mesmo estilo "limpo" e "familiar" dos álbuns anteriores. O estilo que levou o "rapper" Eminem a atacá-lo há alguns anos, numa música em que vociferava: "O Will Smith diz que não precisa de dizer palavrões/ pois eu digo, e olha Will, podes ir..."

"Acho que [Eminem] é um 'rapper' talentoso", concedeu Smith. "Se ele não tivesse falado mal de mim fazia-lhe mais elogios. Assim, não faço." E se fosse Tommy Lee Jones a cantar a música de um futuro "Homens de Negro III"? Smith sugeriu um tema de "country". Jones pegou: "Sou capaz de fazer qualquer coisa por dinheiro."

Por falar em dinheiro: "Homens de Negro" foi um colossal "blockbuster" - 250 milhões de dólares nas bilheteiras dos EUA e 326 milhões no resto do mundo -, o que aumentou a pressão sobre a sequela. Até porque este ano a fasquia foi elevada, com um filme como "Homem-Aranha" a obter 114 milhões no fim-de-semana de estreia (até agora, já registou mais de 400 milhões de dólares, só nos EUA).

"Bom, por várias razões, não vamos poder atingir os números do 'Homem-Aranha'", assumiu Will Smith. "Ai vamos, pois", contrapôs Tommy Lee Jones. Até agora, facturou 186 milhões nos EUA, menos que o primeiro mas longe de ser um mau resultado. O que significa que pode haver um "Homens de Negro III" num horizonte não muito longínquo. Mr. Jones diz que não se importa nada de fazer filmes de acção: "Sou muito superficial. Na minha cabeça não se passa nada. Gosto é de ter emprego. E, felizmente, nunca tive um emprego aborrecido na vida." Mr. Smith também não se importa de voltar a vestir o fato preto e pôr os óculos escuros. Mas, por agora, tem outros projectos: "Quero ser o próximo Bond. Eu podia ser o primeiro Bond negro. Se a Halle [Berry] pode ser uma Bond-girl, eu também posso ser um Bond-boy. Não, esperem, isto não soa lá muito bem. Bond-boy, isso já era outro tipo de filme."

Jones e a língua na orelha

Durante o encontro com a imprensa estrangeira, Lara Flynn Boyle, a actriz de Twin Peaks que interpreta a extraterrestre má-da-fita Serleena em "Homens de Negro II", entrou dentro da sala só por um instante, o suficiente para gritar: "Não acreditem numa palavra do que esse indivíduo vos disser!" O indivíduo em causa era Barry Sonnenfeld, o realizador. Que não perdeu a compostura. "Quando falarem com ela, perguntem-lhe de onde é que lhe vieram os peitos que ela tem neste filme. Porque ela na vida real é assim" - e começou a fazer gestos explicativos com as mãos - "mas no filme ficou assim. Esticámos-lhe a pele toda, desde os tornozelos até ao peito. Foi um efeito especial complicado, e deve ter sido doloroso."

A maior parte dos cineastas, mesmo os que se especializam em "blockbusters", gostam de falar em termos sérios sobre a sua obra. Barry Sonnenfeld, realizador, não consegue ser assim. Quando lhe perguntaram sobre um dos efeitos especiais do filme - uma cena em que a personagem de Lara Flynn Boyle introduz uma longuíssima língua na orelha de Tommy Lee Jones -, respondeu: "Eu já sabia que toda a gente me ia fazer perguntas sobre isso."

"Essa cena não estava originalmente prevista. Mas vi que ainda tínhamos algum orçamento para gastar em efeitos especiais. E perguntei ao nosso director de efeitos especiais quanto dinheiro é que custava enfiar a língua da Lara na orelha do Tommy Lee. Ele disse-me 20 mil dólares. E eu pensei, mais 20 mil dólares, menos 20 mil dólares..."

Sonnefeld começou a sua carreira em Hollywood como director de fotografia, e iniciou-se na realização com os dois filmes "A Família Addams". Teve outros êxitos com "Get Shorty" e o primeiro "Homens de Negro", mas também registou percalços, como "Wild Wild West". O recente "Big Trouble", comédia negra baseada no livro de Dave Barry, foi um fiasco que se afundou sem deixar rasto. Por isso - foi o próprio Sonnenfeld que contou -, a Sony, produtora de "Homens de Negro II", estava "muito, muito nervosa". E, por isso, Sonnefeld também ficou muito nervoso. Tanto que chegou a ter um ataque cardíaco.

Mas não é uma surpresa que tenha uma personalidade nervosa. O homem é cheio de tiques, fala a cem à hora e salta rapidamente de uma ideia para outra. Aliás, velocidade é uma das suas obsessões. O argumento de "Homens de Negro" estava planeado para render 120 minutos, mas a realização e a montagem têm uma tal economia narrativa que o filme acaba aos 80. "Homens de Negro II" está draconianamente cortado até ao osso.

"Sou ao mesmo tempo um anarquista e um viciado em controlo. Tenho uma grande insegurança básica de achar que as pessoas não vão achar graça a nada que faça", disse Sonnenfeld.

Como diria Tommy Lee Jones, "Hmm".

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