Administração Interna manda abrir inquérito a fuga de informação do SIS

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O ministro da Administração Interna, António Figueiredo Lopes, ordenou ao director do Serviço de Informações de Segurança (SIS) que procedesse "às necessárias averiguações para apuramento da responsabilidade relativa ao acesso" da RTP a um relatório da "secreta" portuguesa sobre o mercado paralelo de armas no país.

O documento, a que o PÚBLICO também teve acesso e que ontem divulgou detalhadamente, é considerado confidencial e conclui que o comércio ilegal de armas assumiu tal importância que poderá estar a pôr em causa a segurança interna.

A fuga de informação para a imprensa estará a criar mau ambiente entre o Governo, a PSP e a secreta portuguesa.

Numa nota enviada ao PÚBLICO sobre as conclusões do relatório - intitulado "O mercado ilegal das armas ligeiras em Portugal", e datado de 20 de Junho de 2002 -, o Ministério da Administração Interna (MAI) limita-se a informar que "estão em curso os estudos para a definição de uma nova estratégia de prevenção e combate à criminalidade, da qual o controlo do fabrico, armazenamento, comercialização uso e transporte de armas é um dos pontos fundamentais". O MAI refere ainda que o documento é "um dos contributos técnicos para esse efeito", mas que por se tratar de "matéria classificada" não deveria ter sido entregue à imprensa.

O relatório do SIS informa que o mercado paralelo de armas está em "franco crescimento" em Portugal e a "contribuir para um efectivo agravamento do potencial e violência dos grupos de delinquentes e do crime organizado". Uma das causas apontadas releva da deficiente fiscalização efectuada pela PSP, nomeadamente aos armeiros, com grande actividade no mercado negro. Segundo os investigadores, a quantidade de armas a circular é tal que os fornecedores portugueses estão a vender em Espanha, admitindo-se inclusive que algumas unidades tenham sido adquiridas pela organização separatista basca ETA.

Ontem, a agência de informação espanhola EFE, referindo-se à reportagem do PÚBLICO, noticiou, com exagero, o caso, dizendo que um dos principais clientes dos negociantes portugueses é a ETA.

Num comunicado enviado a este jornal, a Direcção Nacional da PSP indica que existem 531 armeiros licenciados e que estes "são frequentemente fiscalizados, tendo sido detectadas algumas infracções, nomeadamente ao nível da escrituração e registo nos livros competentes". No âmbito das acções de fiscalização em armeiros não foram contudo detectadas armas ou outro material proibido, com a excepção de dois armeiros localizados na cidade do Porto, os quais se encontram detidos e com os respectivos alvarás cancelados, por indícios de venda ilegal de armas.

Aquela corporação acrescenta que, só nos anos 2000 e 2001 e primeiro semestre do corrente ano, a PSP apreendeu mais de cinco armas de fogo ilegais, de vários calibres e modelos.

Também a presidente da Associação dos Armeiros portugueses reagiu ontem ao relatório do SIS. Ana Ferreira disse que a reportagem do PÚBLICO dá uma imagem "equilibrada" do que se passa neste sector, admitindo existirem bons e maus armeiros. Esta responsável realçou contudo que "a legislação portuguesa é caótica, antiga e ultrapassada". "A realidade social de hoje não tem nada a ver com a realidade social de 1949, ano de que data a legislação sobre a matéria", disse.

Ana Ferreira exemplificou com o facto de só em Lisboa e no Porto ser permitida a venda de armas de caça grossa. E de só nas lojas situadas nas capitais de distrito e em Lisboa e no Porto ser autorizada a venda de armas de defesa. "Começa aqui uma discriminação que não interessa a ninguém", critica.

A representante dos armeiros aduz haver outras exigências, inclusive inconstitucionais. É o caso de os compradores de uma arma curta, de defesa, serem obrigados a apresentar um comprovativo da Direcção-Geral de Viação em como nunca foram apanhados a conduzir com excesso de álcool no sangue. "Isto não se entende, porque o cidadão já cumpriu uma pena por esse erro. E ninguém pode ser punido duas vezes pela mesma falha." Ana Ferreira deixa a questão: "Como é que se impede que um verdadeiro alcoólico, sem carta de condução, compre uma arma?"

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