Morreu César Milstein, pai dos anticorpos monoclonais

César Milstein, que foi Prémio Nobel de Medicina em 1984 pelos seus trabalhos na área da imunologia, morreu no domingo em Cambridge (Grã-Bretanha) de doença cardíaca, aos 74 anos de idade. Milstein ocupou, até 1995, o cargo de subdirector do laboratório de biologia molecular de Cambridge, uma das mais destacadas instituições científicas do mundo.Nascido a 8 de Outubro de 1927 em Bahía Blanca, na Argentina, Milstein era filho de imigrantes judeus. "Para ambos os meus pais", conta Milstein num pequeno texto autobiográfico publicado no sítio da Fundação Nobel (www.nobel.se), "nenhum sacrifício era grande demais para garantir que os seus três filhos (eu era o do meio) fossem à universidade. Eu não era um estudante particularmente brilhante, mas era muito activo no sindicato de estudantes universitários e no movimento estudantil".À saída da Universidade de Buenos Aires, após uma licenciatura em ciências químicas, Milstein casa em 1953 com Celia Prilleltensky e juntos embarcam numa viagem de um ano, à boleia pela Europa, chegando até Israel, onde trabalham durante uns meses num "kibutz". Quando regressam à capital argentina, Milstein começa a fazer o seu doutoramento, enquanto ambos trabalham para sobreviver. Milstein doutora-se em 1957 e, em 1958, parte com uma bolsa do British Council trabalhar no Departamento de Bioquímica da Universidade de Cambridge. Durante os anos que se seguem, começa a trabalhar com Fred Sanger (Prémio Nobel de Química em 1958 pelo seu trabalho sobre a estrutura das proteínas e em particular da insulina).Uma vez terminado o seu doutoramento, em 1960, Milstein permanece no laboratório de Sanger durante mais uns tempos e, em 1961, regressa à Argentina. Mas, por razões políticas, a sua estadia no país será de curta duração. "A perseguição política dos intelectuais e cientistas liberais", relata Milstein no mesmo documento, "manifestava-se como uma vingança contra o director do instituto onde eu trabalhava. Isto obrigou-me a demitir-me". É assim que, em 1963, Milstein regressa ao laboratório de Sanger. E, seguindo os conselhos deste, começa a interessar-se pela imunologia.Vinte e um anos depois, em 1984, Milstein - que entretanto adquirira a nacionalidade britânica - recebe o Prémio Nobel de Medicina juntamente com o alemão Georges Köhler (seu aluno "post doc" na altura dos trabalhos premiados) e o dinamarquês Niels K. Jerne, "pelas teorias que dizem respeito à especificidade do desenvolvimento e do controlo do sistema imunitário e pela descoberta do princípio de produção dos anticorpos monoclonais".Foi em 1975 que Milstein e Köhler conseguiram obter, pela primeira vez, graças à hibridação "in vitro" de células cancerosas, linhagens imortais de células imunitárias, produtoras de anticorpos altamente específicos, extremamente puros, a que deram o nome de "hibridomas".Os anticorpos são moléculas fabricadas pelo sistema imunitário que detectam os agentes agressores que penetram no organismo, permitindo que as defesas imunitárias entrem em acção e eliminem o potencial perigo. As vacinas, por exemplo, tornam-nos imunes a determinadas doenças incitando o nosso organismo a produzir anticorpos contra os micro-organismos causadores dessas doenças.A produção de "hibridomas" abriu o caminho ao fabrico, de forma virtualmente inesgotável, de anticorpos artificiais extremamente puros, capazes de serem utilizados para detectar, muito especificamente, um sem-fim de agentes biológicos (bactérias, vírus, etc).Não é de estranhar que a descoberta de Milstein tenha revolucionado não só a biologia, mas também a medicina - permitindo nomeadamente o desenvolvimento de testes de diagnóstico médico simples e rápidos. Do teste de gravidez ao da infecção pelo vírus da sida, o arsenal de ferramentas de despistagem de que hoje dispomos deve a sua existência aos anticorpos monoclonais.

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