Torres de Ofir vão abaixo no final do ano

O anúncio da demolição das torres e da frente marítima do hotel de Ofir feito ontem, em Esposende, pelo ministro do Ambiente, José Sócrates, deixou moradores e responsáveis pela unidade hoteleira divididos. Os proprietários das três torres não se opõem à demolição, mas lamentam o facto de Sócrates nunca os ter ouvido no processo. Alegam ainda desconhecer os valores das indemnizações e os métodos de avaliação que serão aplicados. E têm pressa: "É uma negociação que deveria ter sido feita antes, porque as notícias acabam por nos prejudicar", disse ao PÚBLICO Joaquim Neves, administrador de uma das torres. O responsável deixa, no entanto, um alerta: "Esperemos que isto não seja teatro, que seja a sério, porque o Governo não pode brincar com os investimentos das pessoas".A administração do hotel não quer prestar declarações, mas uma fonte contactada pelo PÚBLICO lamentou a decisão e garantiu que, "se demolirem a frente marítima, fica em causa a sobrevivência da unidade hoteleira e de muitos postos de trabalho". Tudo porque "a mais-valia turística do hotel são os 20 quartos, os dois restaurantes e a sala de congressos que existem na parte que querem demolir".Mais radical é a posição de alguns habitantes de Fão, muitos dos que viram nascer as torres e o hotel. Classificam a decisão como "uma loucura... um disparate". "A população de Fão não concorda com este disparate. Há anos que estão dezenas de casas por demolir nas Pedrinhas. Há anos que nos prometem arranjar as estradas do pinhal. Há anos que dizem que vão proteger a costa do avanço do mar. E agora, que dizem que há dinheiro, vão gastar milhões em deitar abaixo um hotel que é vital para a economia da região. Isso é uma loucura", disse ao PÚBLICO Fernando Pieira, ex-presidente da Junta de Freguesia de Fão e comandante honorário dos bombeiros locais.De acordo com José Sócrates está a Câmara de Esposende. Ontem, na conferência de imprensa que serviu para o ministro anunciar as demolições e a execução do Plano Estratégico de Recuperação do Litoral e Esposende (PERLE), João Cepa, o presidente do município, deixou claro que "todos os passos que se possam dar para a concretização deste projecto são óptimos". O autarca entende que estão em causa outras intervenções, que se traduzem na recuperação e requalificação ambiental da costa, e que são determinantes para o desenvolvimento do turismo da região. A possibilidade de, em Março, o Governo mudar é uma questão que não preocupa o autarca social-democrata, porque está convicto de que "este é um projecto demasiado importante para a economia local e não pode ser qualquer vontade partidária que o pode pôr em causa".Na região há, entretanto, uma outra corrente de opinião que contesta o uso de verbas públicas, tão avultadas, para a demolição das torres. Segundo os seus defensores, ao Estado não cabe indemnizar os proprietários que construíram em zonas de risco. E vai mais longe ao afirmar que se, durante muitos anos, os proprietários tiraram proveito de um privilégio - ter uma casa em plena praia - agora deverão suportar os incómodos, como é o caso da demolição. Esta corrente não aceita que seja o contribuinte a pagar "privilégios de quem quis correr o risco de ser privilegiado".José Sócrates deixou ontem claro que o projecto não é estranho à política do Governo de defesa do litoral. Pelo contrário, entende que "é mais uma página que se vira na defesa do litoral", que recorda ser propriedade "de todos e não de alguns". E justifica a intervenção com a necessidade de "dar uma resposta aos erros que se cometeram no passado (construções nas dunas)" e que, "como os estudos indicam, só podem ser corrigidos desta forma". "Não adianta andarmos todos os anos a gastar milhões de contos para protegermos construções que foram feitas em zonas de risco. Em definitivo, é preciso intervir, encontrar a melhor solução e esta é a melhor porque no futuro fica mais barato demolir e renaturalizar que proteger o que é apenas de alguns e não dos portugueses", disse.O PERLE deverá estar concluído no final deste mês e as demolições poderão iniciar-se "no final do ano, princípio do próximo", garantiu o ministro. Quem mora nas torres ou está hospedado no hotel sai de casa e não precisa de dar mais do que um passo para cair na praia. As torres sempre foram vistas como verdadeiros "mamarrachos", numa zona de alto valor paisagístico e ecológico como é a praia, o pinhal de Ofir e a restinga - que divide o Atlântico do estuário do Cávado. O primeiro edifício do hotel foi construído em 1947. Chegou às dunas em 1972, com a sua ampliação. As duas primeiras torres foram construídas por uma empresa de Barcelos, entre 1973 e 74. A construção da última terminou nos últimos anos da década de 70. Nos anos 90, os novos empresários dos vales do Cávado e do Ave encontraram nas torres os seus "recantos" de lazer.

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