João Amaral defende que AR devia ter recebido Dalai Lama
"O Dalai Lama devia ter sido recebido no Parlamento, como chefe religioso do budismo tibetano", defende João Amaral, deputado do PCP e vice-presidente da Assembleia da República, num texto de opinião intitulado "Bem-vindo, Dalai Lama!", que ontem publicou no portal netpaque.pt.
Assumindo-se, assim, em divergência com a conferência de líderes parlamentares e com o presidente da Assembleia da República, Almeida Santos, que decidiram não receber o Dalai Lama no Parlamento, João Amaral entra também em divergência clara com as orientações da direcção do PCP sobre esta questão. Isto porque, além de o PCP não se ter feito representar no encontro de deputados com o Dalai Lama, terça-feira passada, no Hotel Tivoli, no "Avante!" da passada quinta-feira, o dirigente comunista Carlos Aboim Inglez, do departamento de relações internacionais do PCP, escrevia um cerrado ataque ao Prémio Nobel da Paz, sob o título "Tibete a 'Causa' e as causas".
João Amaral sustenta, no seu texto: "O Dalai Lama é o líder da religião, mas não só: como chefe político, ele corporiza aspirações de maior autonomia. É Prémio Nobel da Paz. Tem feito evoluir as concepções quanto ao sistema de governo, defendendo alguma separação dos poderes religioso e civil (a um nível ainda assim muito distante dos nossos padrões). É um apologista da tolerância e harmonia, e, na lógica do budismo, defende os Direitos Humanos."
Daí que conclua, criticando a direcção do seu partido, os órgãos de Estado e o embaixador da China em Lisboa : "Não tenho dúvidas da importância de manter a unidade e estabilidade da China, para esta poder prosseguir a sua evolução por forma pacífica. Mas receber com dignidade o Dalai Lama é um dever para com uma religião do mundo e para com o Tibete que a pratica. Aceitar a especificidade da situação tibetana não é atacar a China, é reconhecer a existência de uma minoria, com tudo o que isso implica. O tom imperial do embaixador chinês é desajustado."
Esta posição de João Amaral surge, agora, em contraste aberto com o texto de Aboim Inglez, que, de acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO, causou incómodo em muitos dirigentes e militantes comunistas, não só pelo conteúdo, mas também pela violência da forma. Num texto em que sustenta que o Tibete não tem direito à autonomia, nem nunca existiu individualmente,
Aboim Inglez começa por dizer: "Tivemos entre nós, uma semana, o sr. Kenzin Gyatso, mais conhecido pelo título do 14º Dalai Lama, numa das suas constantes itinerâncias pelo mundo, na condição de cabecilha do que resta da clique reaccionária e retrógrada tibetana, conluiada com o imperialismo para atacar a China pela via da mentira e do separatismo."
Aboim Inglez sustenta de seguida: "Essa é a 'Causa' do sr. Kenzin Gyatso, envolta no habitual blá-blá-blá de defesa dos 'direitos humanos', da religião, da 'espiritualidade', etc., etc." Já sobre as criticas proferidas ao Governo e à AR por não receberem o Dalai Lama, Aboim Inglez prossegue dizendo: "O grande escândalo agora foi que tão alta figura como esta 'Sua Santidade' não teve a recepção oficial dos órgãos supremos do Estado português (PR, Governo, AR) - porque era uma visita particular."
Defende Aboim Inglez: "É bom que se saiba que nem hoje nem nunca, desde o século XIII, setecentos anos, nenhum Estado do mundo reconheceu o Tibete como Estado independente, mas sim como parte integrante da China." Por isto tudo, Aboim Inglez aplaude a decisão de António Guterres e de Almeida Santos: "Bem fez neste caso o Estado português (e oxalá não ceda), não se prestando à farsa e decidindo segundo as normas habituais das relações entre Estados soberanos, neste caso Portugal e a China." E conclui: "Os ignóbeis achincalhos produzidos recaem é sobre quem os proferiu."