O merecido Pritzker da dupla de arquitectos Herzog & de Meuron

É a primeira vez que a arquitectura suíça é galardoada com o famoso Prémio Pritzker. O galardão, atribuído pela Fundação Hyatt sediada nos Estados Unidos a um arquitecto vivo, conta no seu restrito grupo de laureados nomes fundamentais da arquitectura internacional, como o português Álvaro Siza, o mexicano Luis Barragan, o brasileiro Oscar Niemeyer, o japonês Tadao Ando ou o holandês Rem Koolhaas, autor da Casa da Música, cujas obras decorrem no Porto, e que foi distinguido na última edição.A situação excepcional da arquitectura helvética no panorama europeu, famosa através de alguns dos seus maiores arquitectos, desde Mario Botta a Peter Zumthor, viu finalmente confirmada por um júri do Pritzker o valor internacional que há muito lhe era reconhecido. Coube a Jacques Herzog e Pierre de Meuron, que trabalham em parceria em Basileia, sua cidade natal, terem merecido tão cobiçado prémio. Ambos nasceram em 1950 e completaram o curso de arquitectura em Zurique. Partilham ainda o facto de terem sido alunos do italiano Aldo Rossi, também um antigo galardoado Pritzker.Dotados de uma enorme capacidade de síntese, que conjuga a melhor tradição europeia do Movimento Moderno com as exigências de uma civilização actual que progressivamente se universaliza, Herzog & de Meuron conseguiram criar imagens tão fortes, que estas foram rapidamente assimiladas em diferentes territórios. Edifícios concebidos com um desenho "limpo", despidos de excessos e soberbos. No entanto, os materiais, principalmente os que configuram a superfície ou a pele dos seus edifícios, são assumidos como elementos formais fortissímos, capazes de conferirem identidade à obra. Os exemplos sucedem-se, desde os primeiros ensaios com a Casa de Pedra (Itália, 1982-1988) às Caves Dominus (Estados Unidos, 1995-1998), onde o revestimento, uma rede de aço que segura fragmentos de basalto, responde à necessidade de obter um controle ideal da temperatura interna (dispositivo indispensável ao armazenamento de vinho) enquanto é explorado plasticamente no exterior. São respostas como estas, magistralmente geridas na fábrica e armazém Ricola (França, 1992-1993), que revelam a capacidade de invenção da dupla, tendo projectado a sua obra como modelo.Mesmo em Portugal é possível detectar vestígios da sua influência em autores como os irmãos Aires Mateus. A repercussão que mereceu um projecto como o da residência de estudantes para a Universidade de Coimbra, duas vezes premiado e amplamente publicado, mostra como internacionalmente obras filiadas nas propostas de Herzog & de Meuron ganham unanimidade.Herzog & de Meuron "refinam as tradições do modernismo numa simplicidade elementar, enquanto transformam materiais e superfícies através da exploração de novas técnicas e tratamentos inovadores". Foi desta forma que a crítica de arquitectura Ada Louise Huxtable, membro do júri do Pritzker, justificou a excepcionalidade do percurso dos dois suíços. A descrição pode muito bem aplicar-se ao projecto do atelier do artista plástico Rémy Zaugg, seu colaborador assíduo. Uma caixa de betão, traçada a partir de uma planta rectangular, aberta pontualmente por planos envidraçados protegidos por palas. As citações da arquitectura moderna são evidentes, designadamente daquela que é herdeira de Mies van der Rohe. No atelier de Zaugg, um artifício, que permite que a água da chuva escorra pelas paredes cegas, imprime uma "marca" volátil ao edifício, porque favorece o aparecimento de um "desenho" configurado pela passagem do tempo. Se por um lado se busca a perfeição em sólidos puros inspirados pela história, por outro, aceita-se a contemporaneidade, a transformação dos conceitos que antes orientavam os mestres do Movimento Moderno.Na Casa Rudin (França, 1997) esse aspecto parece ter sido determinante. A residência, apesar de formalmente incorporar o arquétipo de uma casa (poderia corresponder ao desenho de uma criança), conjugando um paralelepípedo, um telhado e uma chaminé, foi definida como um "bunker" de betão, um volume único. O desenho parece assim desajustado aos materiais escolhidos: uma forma tradicional construída com materiais modernos. É nesse sentido que Herzog & de Meuron revolucionam as ideias preestabelecidas, contrariando os padrões que a historiografia fixou: materiais tradicionais como a pedra são usados em edifícios de aparência "moderna", enquanto formas ancestrais são edificadas através de sofisticados sistemas contemporâneos.

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