Torne-se perito

Caviar fora da mesa

É considerado uma das iguarias mais preciosas do mundo, mas o caviar corre o risco de desaparecer dos pratos dos apreciadores, devido à pesca excessiva do esturjão no mar Cáspio. A situação é tal que este peixe contemporâneo dos dinossauros corre sérios riscos de extinção.

O comércio de ovas de esturjão do mar Cáspio está a tornar-se insustentável e poderá mesmo ser vir a ser proibido, deliberou uma comissão de aconselhamento científico da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas (CITES) das Nações Unidas, que esteve reunida esta semana em Shepherdstown, no estado norte-americano da Virgínia. Recomendações sobre as restrições a impor deverão ser divulgadas nas próximas semanas mas, em Junho,numa reunião da CITES que se realizará em Paris, o comércio de caviar do mar Cáspio e do rio Amur (que fica entre a Rússia e a China) poderá ser totalmente interdito se as recomendações do painel de especialistas em conservação não tiverem sido aplicadas pelos países exportadores deste tipo de caviar - a Rússia, o Irão, a China, o Azerbeijão, o Cazaquistão, o Turquemenistão, a Bulgária e a Roménia.A bacia do mar Cáspio está na origem de mais de 60 por cento do caviar consumido em todo o mundo. Estas bolinhas pretas ou rosa e com intenso sabor a peixe são consideradas um dos alimentos mais requintados, mas para que o palato dos apreciadores possa ser deliciado com esta iguaria há que matar fêmeas de esturjão cujos ovos não foram ainda fertilizados. Um esturjão pode demorar entre seis a 25 anos para atingir a maturidade sexual e as fêmeas de muitas espécies deste peixe contemporâneo dos dinossauros reproduzem-se apenas cada três ou quatro anos. Portanto, os efeitos da pesca excessiva deste peixe assumem facilmente grande gravidade, uma vez que se reproduzem com pouca frequência e muito tarde. Quando são pescados em excesso, a recuperação das populações é particularmente difícil.As espécies mais ameaçadas de esturjão são aquelas que produzem as ovas que atingem preços mais elevados no mercado, como o esturjão beluga (que está na origem do caviar do tipo beluga) e esturjão russo, que está na origem do caviar osetra. Associações ambientalistas calculam que a população de espécies de esturjão do Cáspiodiminuiram cerca de 90 por cento nas décadas mais recentes, em resultado da pesca excessiva e clandestina. Em resultado deste declínio, apenas mil toneladas deste peixe são pescadas anualmente nos últimos anos da década de 90, quando nos anos 70 esses valores rondavam as 20 mil toneladas anuais.O mercado mundial do caviar vale actualmente cerca de mil milhões de dólares anuais (223,5 milhões de contos), com o preço desta iguaria a poder atingir valores extremamente inflaccionados, em resultado da sua raridade crescente. Em alguns casos, o preço das ovas de esturjão pode atingir os 90 dólares (20 contos) por cada 500 gramas. "O principal motivo que contribuiu para a diminuição das populações de esturjão foi o desmantelamento da antiga União Soviética", que tornou mais difícil a fiscalização da pesca deste peixe, disse Craig Hoover, dirigente da Traffic, uma organização que trabalha na área da conservação das espécies e que tem trabalhado com a CITES, monitorizando a exploração do esturjão no Cáspio. "Devido à pesca clandestina e às grandes proporções que tomou o mercado ilegal de caviar chegámos a um ponto em que é urgente a aplicação de medidas de conservação das populações de esturjão no mar Cáspio", concluiu.O painel de cientistas reunido esta semana na Virgínia deliberou que seis espécies de esturjão sejam colocadas no anexo I da Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas - o quer dizer que serão consideradas espécies que não são protegidas de forma adequada a nível nacional. A CITES é uma convenção assinada por 152 países para reger o comércio internacional de mais de 30 mil espécies protegidas de animais e plantas.Os países exportadores de caviar terão de provar que a exploração deste comércio não está a ter consequências nefastas para as populações de esturjão nos seus territórios. Paralelamente, a CITES está também a elaborar um sistema de etiquetagem universal para o caviar, que permita combater a comercialização de ovas colhidas ilegalmente.No entanto, representantes da Rússia e do Irão - os maiores exportadores mundiais de caviar - já se manifestaram contra a imposição de restrições a este comércio. A sua argumentação baseia-se na afirmação de que as medidas que conservação que já impuseram no seu território - como a criação de viveiros para repovoar zonas de pesca - iriam ser afectadas se os lucros desta actividade económica diminuíssem. "A situação relativa ao comércio ilegal está a melhorar", afirmou Serguei Nikonorov, representante russo na reunião realizada na Virgínia. "Conseguimos já eliminar cerca de 95 por cento deste comércio clandestino", declarou.O Irão, no entanto, que é considerado um país que tem um sistema de gestão modelo para o esturjão, poderá receber um conjunto de recomendações e restrições mais suaves do que outros países da região do mar Cáspio, onde a conservação deste peixe não é tão bem gerida. Ainda assim, Muhammad Pourkazemi, director do Instituto de Investigação sobre o Esturjão iraniano avisou que "diminuir as exportações não resolverá os problemas de conservação".

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