A baronesa Blixen

Karen Blixen, de seu verdadeiro nome Dinesen, é uma escritora dinamarquesa que soube integrar, na sua obra, uma forte cultura nórdica e um fascínio pela África. São livros de mistério, alegorias, fábulas, contos góticos, uma escrita original saída da pena de uma figura apaixonante.

Os seus "Sete Contos Góticos" (Dom Quixote) são considerados uma obra-prima. A sua "África Minha" (Querco) uma história romântica sobre a alma negra. "Contos de Inverno" (Relógio d'Água) uma recolha de histórias fascinantes. "História Imortal" (Assírio e Alvim) uma magnífica novela que inspirou Orson Welles. "Ehrengarda, a Ninfa do Lago" (Quetzal) um pequeno tesouro escrito como um conto de fadas. São alguns dos livros da escritora dinamarquesa Karen Blixen (1885-1962) cujo perfil pode ser visto no domingo à noite, no programa Artes e Letras da RTP 2.Karen Christentze Dinesen - que se tornou baronesa ao casar, em 1914, com o seu primo, o barão Bror Blixen-Finecke - nasceu a 17 de Abril de 1885 em Rungstedlund. Descende de uma família de gostos literários profundos. O seu pai, o capitão Wilhelm Dinesen, publicou livros com o pseudónimo de Bogdanis e o seu irmão Thomas Dinesen, no meio de uma vida aventureira, escreveu diários, ensaios e novelas. Karen Blixen escolheu também alguns pseudónimos como Isak Dinesen, com que publicou, basicamente em inglês, a maior parte da sua obra, Osceola ou Pierre Andrézel. Estudou arte em Copenhaga, Paris e Roma, tendo ido viver para o Quénia a seguir ao casamento, país onde viveu até 1931 e onde possuía uma extensa plantação de café, perto de Nairobi. Regressou arruinada à Dinamarca onde se dedicou ao jornalismo e à literatura, passando por Genève, Berlim e Finlândia. Morreu a 7 de Setembro de 1962.O seu romance "Out of Africa", escrito em 1937, é a sua obra mais mediática através do filme "África Minha" de Sidney Pollack, com Robert Redford e Meryl Streep. É um livro escrito com alguma originalidade e muita paixão que permite à autora descobrir "a alma negra". Passa-se numa enorme quinta gerida de um modo feudal por uma "m'saba" (patroa) como se se estivesse na Idade Média. Mas a personagem possui a abertura de espírito de uma mulher culta do séc. XX. A autora, fascinada pela cultura, costumes, leis e crenças da população indígena acaba por colocar acima do poder absoluto o desejo de liberdade total.Outros contos foram recolhidos num volume publicado em 1958 a que chamou "Shadows on the Grass" ("Sombras no Capim", Dom Quixote). Também aqui Karen Blixen continua a sua fixação pela África. O conto que dá o título ao livro está construído em torno de uma personagem misteriosa, um criado somali chamado Farah. Através dele reflecte sobre a mentalidade indígena, a língua, os interesses da quinta, transformando-se no grande amigo e conselheiro da patroa. Diz a autora que quando encontrou os Somalis fez de imediato o paralelo entre a sua cultura, as antigas sagas islandesas e as lendas nórdicas."Festa de Babette e Outras Histórias" (Asa), de 1958, também adaptado ao cinema, é uma recolha de fábulas escritas de um modo escorreito que focam temas como a justiça, o medo, a morte e o amor, num misto de poesia e mistério que tem a ver com o universo nórdico em que a autora vivia. Na história de "Babette", Karen Blixen cria uma cozinheira francesa, refugiada na Noruega, em casa de duas solteironas puritanas que pertencem a uma seita. Ao servir um jantar que lhe custa uma fortuna, ganha na lotaria, fá-lo de uma tal maneira que os convidados são iluminados por uma estranha espiritualidade que se confunde com a eternidade.A escritora gótica. "Seven Gothic Tales" ("Sete Contos Góticos"), publicado em 1934, é um conjunto de contos que se situam no país de Hamlet na primeira metade do sec. XIX e são góticos na medida em que o séc. XIX romântico se liga à Idade Média. As meditações filosóficas, o humor, a poesia, a emoção, o mistério, a ternura em relação ao ser humano, são sinalizações com que a autora marca a seu universo literário: os albergues onde os velhos príncipes bebiam vinho aromático e filosofavam antes de um duelo, as jovens disfarçadas de cavaleiros, os antigos castelos, os fantasmas, as abadessas, os cardeais, os bailes de máscaras e outras fantasmagorias.Para a crítica inglesa e norte-americana, a autora possui "uma prosa verdadeiramente cintilante e uma embriaguês engenhosa". A sua voz é cruel: "não há falso conforto para os seus heróis e heroínas solitários. A verdade reside num desejo secreto que jamais é confessado ou realizado". São histórias fantásticas como esta: duas velhas solteironas recebem em casa a visita do fantasma do seu irmão que está morto há muito tempo e através dele elas próprias ganham vida. Ou esta: uma inundação cobre a terra enquanto uma cerimónia de casamento é realizada numa casa maldita por um assassino disfarçado de cardeal. Como se escreve na edição inglesa das "Gothic Tales", é um mundo de espelhos mágicos em que a realidade é distorcida até que se torna mais fantástica do que a própria fantasia.

Sugerir correcção