Eça ilustre

Com pouca pompa e circunstância, teve anteontem lugar o tiro de partida oficial das comemorações dos 100 anos da morte de Eça com o lançamento da edição crítica de "A Ilustre Casa de Ramires". "Não há forma mais correcta, digna e honrada de comemorar um escritor que não seja publicar os seus textos em condições", justifica Carlos Reis, presidente da Comissão Nacional do Centenário da Morte de Eça de Queirós. E embora não haja ainda um programa delineado já há propostas que podem ter pernas para andar.

Na Biblioteca Nacional (BN), em Lisboa, foi lançada anteontem a edição crítica de "A Ilustre Casa de Ramires", com estabelecimento de texto de Elena Losada Soler, e apresentação de Ivo Castro. Para Carlos Reis, presidente da Comissão Nacional do Centenário da Morte de Eça de Queirós (CNCMEQ), tratou-se do primeiro acto oficial das comemorações. "Desde que se começou a esboçar a constituição da comissão, tornou-se evidente que o lançamento de 'A Ilustre Casa de Ramires' deveria ser o tiro de partida das comemorações. Não há forma mais correcta, digna e honrada de comemorar um escritor que não seja publicar os seus textos em condições.""A Ilustre Casa de Ramires" é o sexto título já publicado no âmbito da Edição Crítica das Obras Completas de Eça de Queirós, com chancela da Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Iniciada em 1992, já vieram a lume "A Capital!", "Alves & Cª", "O Mandarim", e "Textos de Imprensa VI". Até ao final do ano, Carlos Reis, que é também o coordenador da equipa da Edição Crítica, garante que outros dois títulos estarão disponíveis: "O Crime do Padre Amaro" (actualmente em fase de impressão) e "Textos de Imprensa IV".No domínio editorial, não só estão bem avançados "A Cidade e as Serras" e "O Conde de Abranhos", como há ainda a possibilidade de, até ao final do ano, a obra maior de Eça, "Os Maias", entrar também na lista. "Pode parecer uma ousadia - diz Carlos Reis, que fixará o texto - mas não é tanto assim porque, paradoxalmente, não é das obras mais complicadas: não há manuscritos e só há uma edição publicada em vida de Eça. Talvez a única dificuldade é o seu tamanho." Mais: com o aparecimento destes tomos, arrancará até ao final de 2000, a edição corrente (ou popular) na Presença, que começará a editar dois a três títulos por ano.Embora o programa do centenário ainda não esteja completamente elaborado, há já algumas ideias que estão em cima da mesa. No plano audiovisual, o realizador Francisco Manso, que está a acabar uma série sobre a vida de Almeida Garrett, tem um projecto de realizar uma outra série em que o eixo central será a passagem de Eça por Cuba, Havana (ver caixa). Carlos Reis irá, também, tentar "motivar" a RTP a associar-se às comemorações. "Seria interessante que a 16 de Agosto [a data da morte do romancista] a televisão fizesse uma edição especial sobre Eça de Queirós, por exemplo." O Teatro Maizum já apresentou, por seu turno, ao Instituto Português das Artes do Espectáculo um projecto de montagem de textos intitulado "Eça entre as Mulheres", uma dramatização em torno das personagens femininas do autor de "A Relíquia".Em colaboração com o Ministério da Educação, que está representado na CNCMEQ por Helena Cidade Moura, há um pacote de iniciativas já gizado: a concepção e montagem de uma exposição itinerante e ágil, à base sobretudo de painéis, com muita informação sobre a vida e a obra do autor de "O Primo Basílio"; um programa de leituras queirosianas, eventualmente acompanhadas com acções de reciclagem para professores; a constituição de prémios escolares para estudantes do ensino secundário e a edição de roteiros queirosianos (à semelhança do que foi editado recentemente pela Câmara Municipal de Lisboa, "Com Eça de Queiroz à Roda do Chiado" com texto de Luísa Ducla Soares e ilustrações de Luís Félix).O momento alto das comemorações em termos académicos, decorrerá entre 6 e 8 de Setembro, na Faculdade de Letras de Coimbra, IV Encontro Internacional de Estudos Queirosianos - uma iniciativa que será realizada em articulação com a Universidade de Évora, com a realização de um colóquio com alguns dos estudiosos que passarão por Coimbra.Das outras instituições universitárias, a programação mais adiantada é a da Faculdade de Letras do Porto. Com quatro sessões, entre 17 de Março e 7 de Abril, contará com debates em torno de "Eça cronista-jornalista-tradutor", "Eçafilia/Eçamania", "Eça revisitado pela arte contemporânea" e, finalmente, "Eça entre milénios: o síndroma do fim".Para levar por diante o programa, a comissão conta com um orçamento de 30 mil contos provenientes do Ministério da Cultura, através do Fundo de Fomento de Cultura. Pouco? Muito? Carlos Reis destramatiza o problema: "A gestão de um programa destes, como aconteceu com as comemorações garrettianas, passa muitas vezes pela capacidade de apoiar certos projectos que vão buscar financiamento a outros lugares. Por outro lado" acrescenta, "muitas das iniciativas que se levam a cabo autofinanciam-se. Já estamos um bocadinho para além do tempo em que o Estado tinha que fazer tudo."No âmbito da CNCMEQ foi, entretanto, constituída a comissão executiva encarregada de redigir o programa comemorativo integrando, além de Carlos Reis, Luís Fagundes Duarte, Luís Santos Ferro, José Manuel Mendes e Maria Lúcia Lepécki. O director da BN gostaria de apresentar oficialmente o programa a 16 de Fevereiro, precisamente seis meses da data em que se comemora os 100 anos da morte do romancista.

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