Mais uma torre na Póvoa

As enormes torres de habitação ainda marcam a imagem da cidade, mas a aposta na reabilitação urbanística da "Quarteira do Norte" promovida pelo actual executivo municipal tinha posto um travão nos arranha-céus. Agora, porém, os pilares de cimento com janelas vão regressar. A Câmara diz que é uma herança do passado...

Já há alguns anos que, na Póvoa de Varzim, não se ouvia falar da construção de um imóvel com 15 andares. É certo que a cidade, sobretudo na década de oitenta, e na zona norte, assistiu ao nascimento de uma muralha de prédios altos junto à praia, mas, nos tempos mais recentes, a malha apertada do Plano Director Municipal (PDM) conseguiu nivelar, por baixo, a volumetria dos novos edifícios. Daí que, em relação ao que se passou nos últimos anos, seja uma novidade o anúncio da edificação de um novo complexo com "uma torre de 15 pisos e cinco blocos de sete pisos cada, num total de 138 apartamentos e três lojas". O empreendimento é promovido pela Imoloc - Investimento Imobiliário, S.A, que estima a realização de "um volume de negócios de seis milhões de contos". Será construído a partir "do primeiro semestre do próximo ano e deve ficar concluído num prazo de 30 meses". Ocupará "uma área de cerca de 23 mil metros quadrados de construção" e foi baptizado de "Forte de S. Pedro". Localiza-se na Avenida do Repatriamento dos Poveiros, na zona norte da cidade, mas vai criar ligações rodoviárias até à Rua de Gomes de Amorim (Estrada Nacional nº13).O presidente da Câmara da Póvoa, Macedo Vieira, explicou ao PÚBLICO que a possibilidade de ser construída uma torre com 15 pisos é uma herança de gestões anteriores do município. "A falta de ordenamento do passado ainda vai prolongar-se por alguns anos", justificou. Isto porque, se o projecto tivesse surgido após a entrada em vigor do PDM, só seria permitida a construção de edifícios com rés-do-chão e três pisos - o que é valido, por exemplo, para os terrenos livres mesmo ao lado do empreendimento da Imoloc.O projecto imobiliário em causa tem origem em 1988, com o licenciamento, pela câmara, da fase inicial de construção. Estava previsto "um corpo com 21 pisos e um volume alongado de oito pisos". Decorridos dois anos, o promotor imobiliário (que não a Imoloc) colocou à disposição da edilidade, por depósito bancário, a verba necessária para a liquidação das taxas e licenças. Ou seja, como referiu ao PÚBLICO, o vereador com o pelouro da Gestão Urbanística, Aires Pereira, o construtor "segurou" parte dos seus direitos. O certo é que a autarquia, ainda na gestão de Manuel Vaz, recusou-se a licenciar a 2ª fase da obra, esgrimindo "a recusa [do promotor] de apresentação dos projectos para abertura e infra-estruturação do arruamento a norte do empreendimento".O requerente recorreu à impugnação judicial da decisão da câmara, argumentando que o que lhe tinham solicitado era da "exclusiva responsabilidade" da própria edilidade e, por outro lado, o arruamento atravessava terrenos de vários proprietários. O caso arrastou-se pelos tribunais e, decorridos cinco anos, o executivo já presidido por Macedo Vieira (embora no mandato anterior) decide, por unanimidade, enterrar o desentendimento. A câmara entendeu que, "após uma análise profunda" do processo, "não havia motivos de natureza técnico-administrativa para manter o conflito". Em bom rigor, a vereação considerava previsível uma derrota na barra dos tribunais. Macedo Vieira, diz que, assim, ainda foi a tempo de negociar a redução da altura da torre e garantir a construção do arruamento e a sua infra-estruturação sem custos para o município. "Um mal menor", desabafou.O presidente da câmara frisa que, por "pudor", tem evitado mencionar casos semelhantes em que a edilidade é "obrigada a aceitar" a dimensão de projectos imobiliários que só agora aparecem, mas com direitos adquiridos "há muitos anos". Foi o caso de um prédio na Rua da Banda Musical e outro na Avenida do Repatriamento dos Poveiros. Ambos estavam integrados no Plano da Zona Norte, gizado pelo executivo de Manuel Vaz. Mas Vieira alerta que "os erros do passado ainda não acabaram". Nesta altura, a câmara adoptou como "modelo de desenvolvimento urbano" a regra de que as construções não devem ultrapassar "os quatro pisos acima do solo". Só que a cidade ainda vai assistir ao nascimento de prédios mais altos. Fruto de um licenciamento de 1988, vão surgir, na zona dos Mourões, edifícios com oito pisos.Um dos casos que mais preocupam Vieira é o licenciamento de um loteamento a poente da estrada marginal de A-ver-o-mar, que chegou a mobilizar a população para um protesto no local da obra, muito próximo ao areal. É mais um caso que está a aguardar uma resolução judicial, uma vez que o executivo considerou que o alvará, emitido em 1988, tinha entretanto caducado. O interessado recorreu ao tribunal, que lhe deu razão, e a câmara apresentou recurso, do qual se aguarda uma decisão. Contudo, neste caso, há dois trunfos que o edil vai utilizar, caso o processo tenha um desfecho desfavorável: o projecto teve a anuência de organismos estatais e o Plano de Ordenamento da Orla Costeira não permite a construção no local. Se os tribunais atribuírem indemnizações ao promotor imobiliário, Macedo Vieira diz que o "Governo também terá de assumir as suas responsabilidades".

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