Como Stephanopoulos perdeu o sono

Viveu cinco anos no que descreve como "a montanha russa de Clinton" e acabou por ir a um psiquiatra, perder o sono, ficar com urticária e depender de anti-depressivos. As histórias de Stephanopoulos não são humilhantes como as de antigos funcionários da Casa Branca sobre antigos Presidentes. São, sobretudo, as de um homem desencantado.

O livro chama-se "All too Human" e, no início, esteve para ser a "história de um homem que ultrapassou as suas fraquezas e se tornou num bom Presidente". Mas no dia em que o escândalo de Lewinsky rebentou, George Stephanopoulos deitou fora um ano de trabalho e começou a escrever um livro novo."Não acreditei em Clinton", escreve o antigo director de comunicação do Presidente democrata nas suas memórias dos anos na Casa Branca, "All Too Human: A Political Education", publicadas esta semana nos Estados Unidos.Stephanopoulos começou a tomar anti-depressivos em 1994, quando Vince Foster, amigo dos Clinton e membro da Administração, se suicidou, mas com o passar dos meses a depressão foi-se tornando mais aguda e as insónias mais comuns e mais graves. No pico da sua "crise nervosa" deixou crescer a barba para disfarçar a irritação da pele.Antes de abandonar a Casa Branca, em 1996, Stephanopoulos, o jovem consultor político, estava a acordar dez e 12 vezes por noite."Eu sabia que ele estava a mentir", escreve do momento em que viu as primeiras negações públicas de Clinton na televisão, em Janeiro do ano passado, sobre o "affair" com a ex-estagiária.E sabia porque já tinha visto, por dentro e por fora, uma história igual (Gennifer Flowers), que ele próprio combatera publicamente, em nome do então Governador do Arkansas que se estava a candidatar à presidência.Como é que se sente por ter defendido o Presidente num caso parecido? "Não senti que era um hipócrita." A sua defesa contra as chamadas "erupções de mulheres" no passado de Clinton tinha sido feita com base na "promessa de que não haveria novas erupções". "Por muitos anos, fui a testemunha de defesa do carácter de Clinton. Agora, senti-me um parvo."E assim, ao contrário do primeiro esboço do seu livro, as "fraquezas" não tinham sido "ultrapassadas".Mesmo assim, continua a dizer, Clinton "tornou-se num bom Presidente", "apesar destas falhas horríveis"."Nós conseguimos, e ele conseguiu, mais do que eu pensei ser humanamente possível. Mas ele perdeu a batalha com ele próprio e manchou a sua presidência e todos nós que a ela estavamos associados", disse numa entrevista à "Newsweek", onde publica artigos com frequência. "Se soubesse tudo o que sei hoje, é claro que não teria (trabalhado para Clinton)."Stephanopoulos continua sem saber se se sente orgulhoso pelo facto de ter trabalhado para Clinton, mas diz que o Presidente "é demasiado capaz para ter sido afastado do cargo", embora ao mesmo tempo acredite que, com o que se sabe hoje, "não seria eleito".Como durante os seus quatro anos na Casa Branca, Stephanopoulos continua um homem dividido. De página para página, oscila entre o desprezo e a admiração pelo homem que, pouco depois do escândalo rebentar, o declarou "persona non grata - o meu nome não podia ser mencionado na sua presença", escreve.Stephanopoulos não acreditou em Clinton e, já como comentador da ABC, na altura fez comentários que se não tornavam isso evidente não estavam muito longe. O distanciamento era óbvio. "O que significou - escreve - que a partir daí eu era um inimigo." "Era assim com os Clinton: ou se está do lado deles ou contra eles."O antigo conselheiro conta como Bill e Hillary Clinton têm temperamentos difíceis e revela segredos da intimidade, mas - e esse é um dos seus receios - não são humilhantes como os de antigos funcionários sobre antigos Presidentes, nem como os de Dick Morris, o antigo conselheiro político que se demitiu em 1996 por causa do seu próprio escândalo sexual e que hoje se tornou uma espécie de comentador oficial das "fraquezas de carácter" de Clinton."Quando Hillary estava zangada, nem sempre se sabia isso imediatamente - uma frieza calculada começava a surgir com o tempo. A ira de Clinton era mais uma força física impessoal, como um tornado. As fúrias surgiam e desapareciam num acesso de raiva instantâneo e violento."Conta o episódio de 1992, durante a campanha, de quando abriu uma porta e só viu Clinton a comer cereais e Hillary, furiosa, "a apontar com o dedo à cara dele". E o de 1994, quando começou a tornar-se óbvio que o Departamento de Justiça iria nomear um procurador independente para investigar Whitewater e Stephanopoulos disse que a defensiva era a pior das atitudes."Nunca acreditaste em nós", disse Hillary, antes de começar a chorar. "'Estivemos sozinhos e agora estou a sentir-me sozinha. Ninguém está a lutar por mim'. Ela olhou para mim e disse a última frase: 'Se não acreditas em nós, deves ir-te embora' e saiu pela porta fora."Mas fala sobretudo da lealdade entre os dois. São "parceiros completos que se tratam em reuniões como pessoas de negócios, mas que entre eles se tratam como crianças", escreve. O exemplo que dá, porém, é de ternura. Um dia, em 1992, encontrou Hillary sentada ao colo de Clinton a dar-lhe rodelas de limão com mel (o Governador-candidato estava com tosse) e os dois falavam com linguagem de bebé.Gosta do modo como Clinton "define o seu carácter" - "acordar todos os dias e fazer um bocadinho melhor do que no dia anterior" - mas o problema é que, a seguir, "isso simplesmente desaparecia". "Detesto ter que concordar com Dick Morris, mas é de facto como se ele fosse duas pessoas diferentes. A tristeza de toda a experiência com Clinton é que foi uma história de um homem que confronta as suas fraquezas e se tornou todos os dias um Presidente melhor, e que, depois, pôs tudo a perder."No que pensa hoje Stephanopoulos? "Imagino o que este bom Presidente poderia ter sido se tivesse sido um homem melhor."

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