Torne-se perito

Rádios, caixas de música

Quem sintoniza uma rádio em Portugal, tem todas as probabilidades de apanhar música. As melodias que fazem os êxitos das tabelas de sucessos e as rádios temáticas de diferentes géneros musicais, têm vindo a multiplicar-se no panorama radiofónico nacional, onde o lema é "quanto menos conversa, melhor". Este é, de resto, a receita de sucesso da rádio que mais subiu nas audiências no último ano: a Rádio Comercial. Em Espanha, aqui mesmo ao lado, são os debates, as tertúlias e as entrevistas que dominam as antenas. O que se passa afinal? Aproveitando o pretexto oferecido pelo Congresso Nacional de Rádios, que hoje se inicia em Óbidos, o PÚBLICO fez uma viagem pelas tendências actuais dos canais de rádio e tenta adivinhar o futuro do meio rádio no espaço multimédia.

A música impera no panorama de rádios a nível nacional e, sobretudo, na Grande Lisboa. Ouve-se música na RFM, na Cidade, na Nostalgia, na Comercial e na Mega FM, sem contar com os canais locais espalhados pelo país. O exemplo mais recente de uma estação musical bem sucedida é o da Rádio Comercial, que, num ano, triplicou a audiência. O palavra de ordem é "mais música e menos palavra". Quem quer ouvir informação, debate, conversa ou um "talk-show" nas ondas hertzianas tem uma escolha bastante limitada. Pode sintonizar o Canal 1 da Renascença, a Antena 1 ou o canal de informação por excelência, a TSF. Ou ainda noutras estações, mas sempre de uma forma pontual. Se procura ouvir música, a escolha é esmagadora: só nos últimos doze meses nasceram pelo menos cinco rádios de perfil musical, todas na Grande Lisboa. A Lights FM, vocacionada só para música instrumental, a Voxx, música alternativa, a Mega FM, que passa o chamado "Rock Mainstream", a Romântica, que passa todas as canções de amor, e a Luna, consagrada à música clássica. E há que não esquecer a Rádio Cidade que com sotaque brasileiro, tem vindo a provar o sucesso de um canal de música de "tabelas", aproximando-se ou mesmo ultrapassando (já aconteceu uma vez na Grande Lisboa) o líder nacional inabalável de audiências - o Canal 1 da Renascença. Mas o último ano viu nascer um projecto totalista quase exclusivamente sustentado numa fórmula musical - a Rádio Comercial. O grupo Media Capital tomou conta da Comercial o ano passado e encomendou um estudo de mercado para tentar perceber as preferências dos ouvintes. Ouviram-se pessoas entre os 25 e os 35 anos, em Lisboa e no Porto, sobre o que gostam e o que detestam numa emissão de rádio. E no fim, reuniram-se sete oportunidades de mercado a explorar com êxito garantido, todas elas formatos musicais. A que obteve maior expressão foi a do "rock clássico", o actual modelo da Comercial. A estação quer agora pôr em prática a segunda hipótese eleita pelo estudo de mercado - uma rádio só de música de dança. A pesquisa revelou que "os ouvintes queriam poucos anúncios, muita música e pouca conversa", explica Luís Montez, administrador da Comercial, ex-director da Radical e da XFM. A estação apostou na música, equilibrando as novidades com êxitos dos Pink Floyd ou dos Doors, e reduziu os noticários à sua versão minimal.A receita das preferências do público alvo estudado foi seguida à risca e em menos de um ano a Comercial passou de 1,3 por cento de Audiência Acumulada de Véspera para 5 por cento, em termos nacionais, segundo a empresa de estudos de mercado Marktest. Um salto que é difícil passar despercebido dada a estabilidade das audiências da rádio em geral. Meses depois da aquisição da Comercial, a Media Capital comprou também a Nostalgia, um projecto criado por Rui Pêgo, actual director da Rádio Paris Lisboa, e que é um modelo existente em mais de 50 países. "Quisémos optimizar porque este formato "oldie" já provou que tem sucesso", afirma. A explicação para o crescimento do número de rádios de cariz musical está longe de ficar confinada a um motivo único. Para Luís Montez é difícil que o ouvinte médio sintonize apenas uma rádio por dia: "as necessidades variam ao longo do dia - de manhã as pessoas querem entretenimento, informação sobre as horas, o tempo, o trânsito e sobre o mundo. E a partir das 10h00 ouvem música". A falta de comunicadores é uma das razões apontadas para a tendência das rádios em fugir aos formatos de palavra. "Não há uma escola profissional. Há excelentes locutores, mas poucos comunicadores", explica Montez, que aponta ainda razões culturais para explicar este fenómeno. "Ao contrário dos espanhóis, os portugueses são um povo mais introvertido", diz o administrador da Comercial reconhecendo que nas rádios musicais "os custos de execução são muito menores do que nas de informação".Para Pedro Tojal, director da Mega FM, "a escola de comunicação desapareceu e hoje o que se ouve é as pessoas anunciarem as músicas". Lançada no Verão do ano passado para agradar aos jovens entre os 15 e os 22 anos, a Mega FM é o mais recente projecto da Renascença destinado a chegar a um público mais difícil de atingir pelos dois outros canais do grupo - Canal 1 e RFM. Também neste caso as preferências dos ouvintes revelaram a mesma tendência. "Com o projecto da Mega FM percebemos que a juventude quer ouvir música", explica Pedro Tojal, referindo-se também a um estudo de mercado que apontou para uma receita de emissão musical e sem qualquer publicidade. Para justificar o aparecimento de rádios construídas à volta de um género musical, Tojal avança ainda com outra explicação. "Está a começar a acontecer em Portugal um fenómeno que já ocorre no estrangeiro - a fragmentação. No mesmo escalão etário alguns gostam de música de dança, outros só de rock e se uma rádio misturar as duas coisas, os ouvintes afastam-se", diz considerando necessária uma rádio de "notícias e de palavra". "A própria TSF não é 100 por cento de notícias - tem também música", exemplifica.

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