As afirmações do presidente da ANA que roçam a injúria

Na minha atividade de consultor participei em projetos de grande dimensão no país e no estrangeiro. Por isso não aceito recados do Dr. Luís Arnaut nesta matéria.

No PÚBLICO de 18 de março é apresentada uma entrevista ao presidente da ANA, cujo conteúdo, na parte que me diz respeito, roça a injúria.

Desta vez não se limitou a desinformar sobre o processo do aeroporto complementar no Montijo. Foi mais longe ao afirmar, e passo a citar: “Há algumas pessoas, como o ex-presidente do LNEC Matias Ramos, que discutem de uma forma quixotesca esta questão dos custos (…), mas que nunca construíram um aeroporto nem do Lego.”

Estranha forma de intervir. O meu currículo fala por si. É transparente e baseia-se numa atividade profissional sustentada na investigação e em estudos e projetos que tive o prazer e a honra em coordenar ou em colaborar. Os cargos que ocupei foram, ou por eleição (bastonário) ou por convite e não por pertencer a grupos particulares. Atingi o topo da carreira de investigação sempre com base em concursos públicos. Sou autor ou coautor de diversos livros e memórias técnicas, de mais de uma centena de artigos em congressos nacionais e internacionais e de meia centena de estudos e projetos de grandes infraestruturas no país e no estrangeiro.

Tive sempre uma única preocupação. Desempenhar, com lealdade, as funções que me foram atribuídas no serviço público. Fi-lo sempre com o único propósito de defesa dos interesses da instituição que servi e os do país e nunca no interesse pessoal ou de grupos. Fui sempre reconhecido interpares, sendo membro eleito da Academia de Engenharia.

Na minha atividade de consultor participei em projetos de grande dimensão no país e no estrangeiro. Por isso não aceito recados do Dr. Luís Arnaut nesta matéria. A sua afirmação que nunca “construí um aeroporto nem do Lego”, e que as minhas intervenções têm sido “quixotescas”, revelam bem a intenção do presidente da ANA de, na falta de argumentos sérios e justificados para defender os seus pontos de vista, optar por descredibilizar quem defende posições opostas.

Quanto ao Lego, quero informá-lo que os meus pais tiveram que emigrar. Nunca tive um Lego ou brinquedo semelhante. Tive sim um percurso académico com o apoio de pessoas que não esqueço e da Bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, que me permitiram chegar onde cheguei. Tentei sempre ser honesto, pragmático e não “quixotesco”. Segui sempre o lema “com perseverança tudo se alcança”. O que alcancei foi sempre transparente e com comportamento cívico de que me orgulho.

Lamento que o Dr. Luís Arnaut tenha optado pela ofensa pessoal e ataque à minha dignidade profissional e, mais uma vez, se tenha refugiado em afirmações sem qualquer suporte documental que seja conhecido (estudos, projetos). Tem sempre evitado o confronto direto. Disponibilize esses documentos, já que não devem ser segredo de Estado.

O Dr. Luís Arnaut não pode argumentar que não conhece o relatório elaborado por consultores internacionais da NAER/ANA que integra um dos Planos Diretores da ANA. Nesse relatório constam as estimativas de custo de construção do novo aeroporto de Lisboa no Campo de Tiro de Alcochete (CTA). O custo apresentado nesse estudo é de 1,9 mil milhões de euros. Corresponde à solução final com duas pistas independentes, com comprimento de 4000 metros e com capacidade para 100 movimentos por hora.

Não é, portanto, um projeto comparável ao que a ANA pretende fazer no Montijo. Nada obsta a que, também no CTA, se possa começar por uma solução minimalista de uma construção com pista única e instalações de terra e ar análogas às do Montijo. Ter-se-ia podido fazer comparação séria entre estas duas soluções. Só faz sentido comparar o que é comparável. Não se compara um Ferrari com um carro utilitário.

Segundo o presidente da ANA, o prazo de construção do aeroporto no CTA será de oito anos. Tem na empresa a que preside documentos que definem o prazo para a solução no CTA com duas pistas como sendo de cinco anos.

Presumo que esta afirmação é baseada nos tais três anos adicionais de “desminagem” que referiu em diversas entrevistas e que facilmente desmontei num artigo recente (Expresso, 12 de março).

Gostaria que o presidente da ANA justificasse o conceito de “reciclagem” da BA6. A construção do aeroporto na BA6 não aproveitará muito mais que o espaço. Expliquei isso em artigos anteriores. Demonstre que, em vez de eminentemente técnica, esta é uma posição “quixotesca”.

As suas afirmações têm sido sempre em forma de homilia, sem contraditório sério, ou em acontecimentos promovidos pela ANA com vistosos PowerPoints e vídeos, que não passam de mero marketing.

Um exemplo desta situação continuada de recusa de enfrentar o contraditório por parte do Dr. Arnaut. Fomos ambos convidados para, no dia 19 de dezembro de 2019, participarmos como oradores numa sessão na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa que tinha como objetivo discutir o tema do aeroporto de Lisboa. Eu aceitei logo. O presidente da ANA não compareceu. De que tem medo?

Furtar-se ao contraditório é sinal de insegurança. Quem não deve não teme!

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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