Covid-19: Sindicato sai de reunião com ministra da Cultura sem certezas nem garantias

Cena-STE insiste na necessidade de o Governo tomar medidas urgentes para um sector que está paralisado, e outras para a retoma da actividade num sector que é dos mais precários na situação actual.

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O Sindicato dos Trabalhadores de Espectáculos, Audiovisual e Músicos (Cena-STE) saiu esta terça-feira de uma reunião com a ministra da Cultura “sem qualquer certeza e com muito poucas garantias” em relação à situação de emergência que se vive no sector.

“Saímos da reunião sem qualquer certeza e com muito poucas garantias. A garantia que temos é que vamos ter que continuar a fazer pressão sobre a ministra da Cultura, sobre o Governo e sobre o Ministério do Trabalho para ter algumas destas medidas urgentes cá fora, porque elas vão continuar a ser urgentes nos próximos meses e a cada dia que passa vão ser cada vez mais urgentes”, afirmou Rui Galveias, da direcção do Cena-STE, em declarações à Lusa, no final de uma reunião com a ministra Graça Fonseca, em Lisboa.

A reunião esteve inicialmente marcada para quinta-feira da semana passada e, nesse dia, o Cena-STE decidiu divulgar um pacote de medidas de “emergência, retoma e reforma” do sector, para aplicação “a curto, médio e longo prazo durante os próximos dois anos”, apresentado agora à ministra.

Rui Galveias salientou que o sector está a viver uma realidade de que não há memória: “Nem no período mais violento da troika foi assim”. “Tendo em conta as características do meio e dos trabalhadores que têm uma forte expressão precária, de orquestras regionais a trabalhadores de festivais, a muita gente que acompanha as companhias de teatro do interior do país, técnicos, profissionais e actores, todas estas pessoas, neste momento, têm a vida em suspenso”, referiu.

Segundo o sindicalista, têm surgido “grupos informais, para poderem cuidar uns dos outros”. “Felizmente há solidariedade no sector”, afirmou, alertando que “há muita gente a distribuir cabazes de comida e a dar dinheiro a colegas de trabalho”. “Estamos nesta base”, acrescentou Rui Galveias.

Segundo o representante do Cena-STE, a reunião com a ministra da Cultura “pode ser dividida em duas metades”. “Uma foi sobre medidas para o futuro, que têm que ver com a avaliação do sector, uma regulamentação e uma legislação diferentes, para proteger os trabalhadores”, contou. Da parte do Ministério da Cultura, segundo o sindicato, “há abertura para esse trabalho e para essa discussão, houve trabalho desenvolvido e há trabalho futuro”.

Já na parte relativa às “medidas de emergência”, aquilo que o Cena-STE tinha considerado ser o mais importante, agora, “não saiu quase nada”. “Saiu apenas a consciência de que, pelo que nós percebemos, as medidas transversais de que tanto se tem falado não estão a chegar à maior parte dos trabalhadores do sector, como não chega a outros trabalhadores na mesma situação na sociedade”, afirmou Rui Galveias.

Num sector “muito marcado pela precariedade, essas medidas de emergência, que seriam fundamentais, porque as pessoas têm que pagar as contas hoje e comer amanhã, não estão a chegar”. O apoio aos trabalhadores independentes, alertou o sindicalista, “chega de forma insuficiente, chega com contradições”.

“Recebe-se um dinheiro, o apoio do IAS [Indexante dos Apoios Sociais] na ordem os 100, 120, 200 euros, e também se recebe a Segurança Social para pagar, na ordem dos 80, 90 euros”, exemplificou, alertando para que os problemas mais urgentes “não estão a ser resolvidos”.

Segundo Rui Galveias, a ministra da Cultura “ouviu” as preocupações, “mas depois devia haver uma acção”, quer deste ministério como do Ministério do Trabalho, "para intervir sobre estes temas”. “O Governo fala em quase três mil milhões de euros investidos na Economia, mas o problema é que esse dinheiro e essas medidas, muitas bem-vindas, não estão a chegar aos trabalhadores do nosso sector”, realçou.

Apelo ao Ministério do Trabalho

O Cena-STE pediu também uma reunião com a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, mas que “até agora não foi marcada”.

O caderno reivindicativo do sindicato apresenta dezenas de medidas a aplicar em vários tempos, desde a curto prazo, para acautelar as necessidades imediatas dos trabalhadores da cultura, uma vez que a actividade cultural praticamente paralisou por causa da covid-19, até ao longo prazo, dada a precariedade já denunciada do sector.

Entre as medidas a curto prazo, está a equiparação do apoio extraordinário a um mínimo de 635 euros, um desagravamento fiscal e uma isenção ou redução das obrigações à Segurança Social.

O Cena-STE quer ainda que os apoios já anunciados para os trabalhadores independentes sejam mesmo estendidos “aos mais vulneráveis”, como por exemplo os “trabalhadores das frentes de sala dos equipamentos públicos, que foram imediatamente dispensados” ou os que têm dívidas à Segurança Social.

As medidas de retoma incluem, entre outras, a criação de um “cartão-cultura” para que cada português gaste um valor mensal em cultura e espectáculos e a revisão das condições de apoio à internacionalização, por causa das limitações de circulação de artistas fora do país.

A longo prazo, o Cena-STE quer que passe a ser obrigatório e seja uniformizada a existência de contratos “em todos os projectos com subvenções públicas”, seja de curta ou de longa duração. É ainda pedido um “levantamento exaustivo do tecido cultural existente para “diagnosticar necessidades específicas de regiões ou comunidades”.

Segundo o sindicato, este caderno reivindicativo foi desenhado com base nos resultados do inquérito feito ao sector, já durante o estado de emergência por causa da pandemia da covid-19, e em “diálogo com estruturas culturais e grupos informais de defesa da cultura”.

O inquérito revela que 98% dos trabalhadores inquiridos tiveram trabalho cancelado por causa das medidas restritivas para conter a pandemia. Em termos financeiros, para as 1.300 pessoas que responderam ao questionário, as perdas por trabalhos cancelados representam ainda dois milhões de euros, apenas para o período de Março a Maio deste ano, de acordo com o Cena-STE (o que indica a perda de um valor médio de receita, por trabalhador, de cerca de 1.500 euros).

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