PCP abstém-se na primeira votação do Orçamento para 2020

Posição do PCP abre a porta à aprovação do Orçamento, mas ainda não a garante. Comunistas fazem depender a sua votação final das medidas que conseguirem ver aprovadas na especialidade.

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Jerónimo de Sousa, secretário-geral do PCP mÁRIO CRUZ/LUSA

O PCP vai abster-se na votação do Orçamento do Estado para 2020 (OE 2020) na generalidade na próxima sexta-feira. Mas já avisou que fará depender o seu sentido de voto na votação final global, agendada para 7 de Fevereiro, das medidas que conseguir aprovar durante a discussão na especialidade. O anúncio foi feito nesta quarta-feira pelo líder parlamentar comunista, João Oliveira, na Assembleia da República.

É a primeira vez que o PCP se abstém na votação de um Orçamento do Estado.

Para os comunistas, apesar de “consolidar no essencial muito do que” se fez nos orçamentos dos últimos quatro anos, a proposta de OE 2020 do Governo “apresenta insuficiências e limitações relevantes, não se verificando continuidade no ritmo nem na expressão e alcance dos avanços registados nos orçamentos da anterior legislatura”. E “fica muito longe das opções que se impõem para responder aos problemas estruturais com que o país está confrontado”.

O PCP não quer, no entanto, travar já o Governo de António Costa e por isso se abstém, colocando, porém, o executivo na guilhotina, fazendo depender o seu sentido de voto na votação final global do que conseguir fazer aprovar na especialidade.

“O voto de abstenção que o PCP adoptará na votação na generalidade do OE é assumido como uma forma de não fechar as possibilidades de avançar nesse sentido de defesa, reposição e conquista de direitos e de resposta aos problemas estruturais com que o país está confrontado”, avisa ainda o PCP. Esses avanços devem “ser considerados na especialidade”, ou seja, concretizados pelo PS, para que os comunistas possam então “perceber em definitivo o balanço final”, aponta João Oliveira.

Os comunistas dizem que a proposta de Orçamento é marcada pela “insuficiência do investimento público face às necessidades nacionais que persistem e se agravam”, por exemplo, nos serviços públicos como a Saúde, Educação e transportes; pela “manutenção de injustiças”; e pela “repetição de normas programáticas que em anos anteriores não foram concretizadas”.

PS “menos condicionado”

A explicação para a atitude do Governo? O quadro político, lembra  PCP: “O PS está hoje menos condicionado do que na anterior legislatura e tenta impor as suas opções de sempre.” Além disso, pretende continuar a obedecer a Bruxelas e a querer brilhar com um excedente orçamental. E para o fazer deixa para trás a valorização dos trabalhadores, salários e pensões, assim como dos serviços públicos; poupa no investimento público, na cultura e no meio ambiente, por exemplo.

Mas João Oliveira desvaloriza a questão do excedente orçamental na avaliação do número pelo número. Quando questionado se a existência de superavit nas contas é um dos argumentos para o PCP recusar o Orçamento, o líder parlamentar responde que “o excedente não é propriamente determinante” para o voto. “Chegar ao fim e saber se tem ou não excedente orçamental para nós não é relevante. O que é preciso é responder aos problemas.”

O líder parlamentar fez questão de garantir que não há uma questão, uma medida ou uma área que “decida” a posição do PCP sobre o Orçamento. “Fazemos a apreciação do Orçamento em função da globalidade das questões”, frisou. E vincou que “a abstenção na generalidade não determina nada no sentido da votação final global, que será feita consoante a apreciação dos avanços na discussão na especialidade”.

As reuniões entre o PCP e o Governo têm-se sucedido. A última foi a de terça-feira à tarde, no Parlamento, mas os comunistas não levantam uma única ponta do véu. João Oliveira apenas admite que não foram “infrutíferas” e que há abertura do Governo para “considerar soluções” sobre aumentos de pensões, criação da rede de creches públicas, fim das taxas moderadoras, redução dos custos da energia, aumento do abono de família e do subsídio de desemprego, reforço do SNS e criação do Laboratório Nacional do Medicamento.

Mas também será certo que não houve algo suficientemente estruturado que permitisse o voto a favor dos comunistas. “Na fase em que estamos, garantias, garantias, só quando forem mesmo aprovadas”, disse João Oliveira quando questionado sobre o nível de compromisso assumido pelo executivo.

Se os comunistas tiveram o derradeiro encontro com o Governo na tarde de terça-feira, no Parlamento, os bloquistas só têm a última reunião esta tarde, antes da discussão do Orçamento durante dois dias no plenário. João Oliveira não quis dizer se o PCP tentou antecipar-se ao Bloco, preferindo afirmar que esse “não é o sentido da intervenção” dos comunistas. “Assumimos o trabalho com seriedade; fazemos uma apreciação fundamentada e sólida.”

Até agora, do lado dos votos a favor ainda só está garantido o PS (com 108 deputados). PSD (79), CDS (5) e Iniciativa Liberal (1), pelo contrário, já afirmaram que votam contra. Estes partidos totalizam 85 deputados, mas ainda não é garantido que os três parlamentares do PSD-Madeira também votem contra o OE. A deputada do Livre apenas anunciará o sentido de voto na quinta-feira. Já o PAN e o deputado do Chega irão anunciar esta quarta-feira à tarde o sentido do seu voto.

Se o PAN (4) e o PEV (2) também se abstiverem, a proposta de Orçamento é aprovada com 108 votos a favor e 106 contra (caso o Bloco vote contra, alinhado com a direita).

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