Ministério Público também abre inquérito à morte de bebé no Amadora-Sintra

Hospitais de Faro e Amadora-Sintra já anunciaram abertura de inquéritos. A mulher, grávida e com 32 semanas de gestação, foi transferida do Hospital de Faro para o Hospital Amadora-Sintra. O bebé acabou por morrer depois do parto.

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Rui Gaudencio

O Ministério Público também vai abrir um inquérito às circunstâncias em que ocorreu a morte de um recém-nascido no Hospital Fernando Fonseca (Amadora-Sintra), para onde a mãe foi transferida a partir do Hospital de Faro. De um hospital ao outro são 290 quilómetros de distância. Os dois hospitais por onde passou a mulher grávida de 32 semanas cujo bebé morreu já depois do parto já tinham anunciado a abertura de inquéritos para apurarem o que sucedeu em todo este processo. 

“O Ministério Público da comarca de Lisboa Oeste determinou a abertura de inquérito”, respondeu à agência Lusa a Procuradoria-geral da República (PGR). Antes, Ana Paula Gonçalves, presidente do conselho de administração do Hospital de Faro, já tinha dito ao PÚBLICO que o hospital decidiu abrir um inquérito para averiguar o que se passou no caso da grávida transferida para o Amadora-Sintra cujo bebé veio depois a morrer.

Numa informação enviada à Lusa ao meio da tarde desta quarta-feira, o Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA) esclareceu que a impossibilidade de receber mais utentes na unidade de cuidados neonatais do Hospital de Faro obrigou à transferência da mulher grávida. O conselho de administração do CHUA garantiu que a decisão de transferir a utente foi tomada “após avaliação clínica e cumprindo o protocolo definido para situações semelhantes”.

Ao deparar-se com o caso clínico desta utente, as equipas médicas procederam “ao envio da utente para o Hospital Doutor Fernando da Fonseca (Amadora-Sintra), tal como definido nas redes de referenciação hospitalar”, porque “à data, a unidade de neonatologia da unidade hospitalar de Faro, a única unidade altamente diferenciada na prestação de cuidados neonatais integrada no CHUA, encontrava-se com a sua capacidade de internamento lotada”.

O CHUA considera, por isso, que “a grávida foi encaminhada, em condições de segurança e monitorização adequadas, para o Hospital Fernando da Fonseca”, onde o bebé acabaria depois por morrer.

A grávida foi transferida do Hospital de Faro pelas 19h30, depois de dar entrada a meio da tarde, no dia 2 de Agosto. O Hospital Amadora-Sintra também “decidiu abrir um inquérito interno para averiguar os factos relativos a este caso que culminou na morte do recém-nascido”, refere o conselho de administração, numa resposta enviada à agência Lusa. 

Fonte deste hospital garantiu que a grávida foi prontamente assistida. Numa resposta enviada à Lusa, o hospital acrescenta que “a utente foi informada da complexidade da situação clínica pelos profissionais de saúde e envolvida nas decisões tomadas”. “Apesar de todos os esforços, a gravidade da situação clínica determinou a morte do recém-nascido, facto que lamentamos profundamente”, acrescenta.

À Lusa, o Ministério da Saúde referiu que continua a “acompanhar a situação junto dos hospitais, aguardando os resultados das diligências de averiguação em curso”. O ministério já tinha informado que “teve conhecimento, junto dos hospitais, de que foram seguidos todos os procedimentos de cuidados de saúde adequados”, acrescentando que “lamenta profundamente o falecimento do bebé”. No entanto, não esclarece se será ou não aberto um inquérito ou investigação a esta situação.  

É precisamente isso que pretende o bastonário da Ordem dos Médicos que também pede que o caso seja “investigado totalmente”. Miguel Guimarães disse desconhecer em pormenor o caso, mas lembra que a transferência constante de grávidas entre instituições “pode trazer riscos e ter consequências indesejadas”. Adianta, contudo, que o desfecho do caso, a morte do recém-nascido, poderia ter sucedido igualmente no Algarve.

“As autoridades competentes têm de fazer uma investigação, a situação deve ser investigada totalmente pelas instituições com capacidade inspectiva e provavelmente pelo Ministério Público”, afirmou Miguel Guimarães. O bastonário entende que, caso a transferência da grávida se tenha ficado a dever a falta de meios no Algarve para fazer o parto, “o Ministério da Saúde terá uma responsabilidade sobre isso”. Miguel Guimarães sublinha que a insuficiência de meios humanos nas maternidades do Sul do país, incluindo a região de Lisboa, foi “várias vezes denunciada” pela Ordem.

PSD e BE exigem inquérito

O caso já teve reacções políticas. “A grávida ficou várias horas à espera de ambulância, o serviço não tem espaço nem incubadoras suficientes, é tudo mau demais para ser verdade. Assim, têm de se transferir grávidas para muito longe, o que em casos destes aumenta exponencialmente os riscos para grávidas e bebés. Várias pessoas, nas quais me incluo, têm alertado para isto. O Governo nada fez”, denuncia Cristóvão Norte, deputado do PSD, numa nota enviada ao PÚBLICO.

Para o deputado, “o Algarve sofre uma hemorragia na saúde que não é nova mas que se agrava, não estanca”. “Estes episódios são cada vez mais comuns, um inaceitável novo normal, que não é pior porque há muitos profissionais que se empenham de forma extraordinária”, afirma.

O Bloco de Esquerda também já pediu um esclarecimento ao Ministério da Saúde, defendendo que este deve “accionar” os necessários “mecanismos inspectivos”, nomeadamente a Inspecção Geral das Actividades em Saúde, para que se “audite”, “investigue” e “abra um inquérito sobre este caso”.

“Qual a razão para a grávida não ter sido intervencionada em Faro, hospital aonde se dirigiu? Qual a razão para ser transferida para quase 300 quilómetros de distância? Foi a falta de meios ou de profissionais que determinou esta decisão? A transferência teve impacto no desfecho deste caso?”, questionam os bloquistas que entendem que “estas e outras questões” têm de ser “respondidas”.

O BE apresentou outro requerimento “solicitando as conclusões e o relatório do inquérito que vier a ser aberto à morte do recém-nascido no Hospital Fernando da Fonseca depois de transferido pelo Hospital de Faro”. O partido pede que “as conclusões do relatório, assim que existam, sejam enviadas ao grupo parlamentar”. Os bloquistas querem conhecer as “conclusões e o relatório do inquérito que vier a ser aberto à morte do recém-nascido no Hospital Fernando da Fonseca depois de transferido pelo Hospital de Faro por, alegadamente, falta de incubadoras”.

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