Intervenção do Estado nos media? PS diz que debate “tem de fazer o seu caminho”

BE "acompanha" a preocupação do Presidente. CDS também está disponível para estudar a questão, PCP critica concentração dos meios e admite analisar novas medidas.

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Líder da bancada do PS salienta proposta socialista para baixar IVA das publicações digitais para 6% Nuno Ferreira Santos

O presidente do PS e do grupo parlamentar, Carlos César, considera que a questão levantada pelo Presidente da República sobre a eventual necessidade de o Estado intervir na comunicação social, face à “crise profunda” do sector, “é uma reflexão que tem que fazer o seu caminho”.

Na declaração de Carlos César, enviada ao PÚBLICO por escrito, o socialista lembra ainda que “neste Orçamento do Estado já foram aprovados apoios, designadamente propostos pelo PS, com essa preocupação”. O presidente do partido refere-se à proposta para baixar o IVA das publicações digitais para 6%.

A centrista Vânia Dias da Silva também garante que o CDS está disponível para fazer este debate. “As palavras do Presidente merecem-nos nos partilha, no sentido em que partilhamos a preocupação sobre o estado difícil em que vive a comunicação social portuguesa. Estamos disponíveis para estudar um modelo que se adeqúe e seja exequível. Mas temos noção das dificuldades e que qualquer ingerência estatal pode fazer perigar a liberdade e democracia. É uma solução que pode ter riscos. Estamos disponíveis para estudar um modelo, mas ingerências são proibidas”, começa por dizer ao PÚBLICO, insistindo que não se pode “chegar a um modelo que faça perigar o pluralismo e a liberdade de imprensa”.

“Atirar dinheiro para cima do problema pode resolver a curto prazo, mas não a longo. Há soluções que passam por incentivos ou benefícios fiscais, mas não resolvem todo o problema”, diz ainda, acrescentando que “o CDS viu chumbada neste Orçamento do Estado uma proposta que visava pagar os incentivos em falta à comunicação regional, através de um concurso normal e outro extraordinário”. Vânia Dias da Silva lança, por isso, uma crítica: “A preocupação é muita de todos os lados, mas depois quando chegamos à acção concreta esbarramos nisto”.

Já o BE, que "acompanha" a preocupação do Presidente, não tem dúvidas: "Num tempo em que os populismos se organizam na sombra, a defesa de uma comunicação social séria e rigorosa é uma exigência da democracia. O Estado pode e deve, naturalmente em articulação com os órgãos de comunicação e os grupos de media, ter um papel importante nesta defesa."

Num texto enviado ao PÚBLICO, o BE defende que tal seja feito em três níveis: "O Estado deve garantir as condições para que a comunicação social possa desenvolver o seu trabalho com a maior independência, respondendo à asfixia financeira que vivem muitos órgãos de comunicação social."

Neste aspecto, lê-se, "é necessário um plano para responder à crise da comunicação social local, conferindo-lhe condições para a sua subsistência e independência": "E o Estado tem também a obrigação de apoiar condignamente os órgãos de comunicação social públicos. A situação de asfixia que se vive em empresas do Estado como a Lusa ou a RTP, seja pela perpetuação da precariedade ou pela limitação de meios e financiamento, são um ataque ao serviço público e, com isso, a toda a comunicação social", escrevem os bloquistas.

Em segundo lugar, prosseguem, "o Estado deve intervir de forma a assegurar o cumprimento da legislação existente, assegurando a sua função regulatória": "Ao longo dos últimos anos, os poderes públicos nem sempre estiveram à altura desta responsabilidade, sendo complacentes, por exemplo, com operações de concentração que procuravam limitar a pluralidade. Esta complacência foi evidente ao nível do poder executivo como ao nível da regulação", criticam os bloquistas.

Em terceiro lugar, defende o BE, "é urgente que as instituições do Estado promovam a discussão e articulação dos órgãos de comunicação social e grupos de media, com vista à criação de plataformas que contraponham rigor informativo às crescentes campanhas populistas de desinformação".

Por seu lado, o PCP manifestou, ao PÚBLICO, a preocupação pela concentração dos meios de comunicação por grupos económicos, denunciou a mercantilização da notícia e insistiu na defesa dos direitos laborais dos profissionais e na luta contra a precariedade e os baixos salários. "O Estado deve garantir um serviço público de comunicação social", salientou a deputada Diana Ferreira, admitindo a disponibilidade da sua bancada para analisar medidas fiscais, para além da já consagrada descida do IVA para seis por cento, consagrada no Orçamento de Estado para 2019. 

"Acordo de regime"

Na terça-feira, Marcelo Rebelo de Sousa lançou a discussão: “A grande interrogação que eu tenho formulado a mim mesmo é a seguinte: até que ponto o Estado não tem a obrigação de intervir?”, questionou na cerimónia de entrega dos Prémios Gazeta 2017, em Lisboa.

O Presidente da República questionou-se se “não será possível uma forma de intervenção transversal, a nível parlamentar, que correspondesse a um acordo de regime”.

E acrescentou: “Não sei, verdadeiramente, quais são as pistas. Tenho para mim esta preocupação, que é: não queria terminar o meu mandato presidencial com a sensação de ter coincidido com um período dramático da crise profunda da comunicação social em Portugal. E, portanto, da liberdade em Portugal e, portanto, da democracia em Portugal.”

Sobre uma eventual intervenção do Estado, “nem que seja para apoiar financeiramente, economicamente, encontrar decisões ou medidas que minimizem este tipo de crise”, o Presidente da República referiu que a questão lhe suscitou inicialmente reservas.

“É o risco — nós temos essa memória, os mais velhinhos — de, ao intervir, pôr a mão e ter a tentação de abusar”, justificou.

Marcelo referiu-se ainda à possibilidade de “uma forma de intervenção transversal” ou através de “pequenas medidas”, como “o porte pago, por exemplo”, salientando o impacto na imprensa regional e local. “Apesar de tudo, não era uma intervenção escandalosa”, disse.

Marcelo lançou também como hipótese de intervenção “estudar o que se faz lá fora” em relação às “grandes plataformas multinacionais” que utilizam conteúdos da comunicação social portuguesa, “mesmo sabendo que se trata de uma luta muito desigual, para haver uma compensação do que é feito cá dentro e que devia ser remunerado”.

Para o Presidente da República, existe uma “situação de emergência da comunicação social em Portugal” que “de, ano para ano, vai sendo cada vez mais grave”, na rádio, na imprensa, na televisão, e que está “a criar problemas já democráticos, problemas de regime”.

Notícia actualizada com declarações do CDS, do BE e do PCP

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