Um rapaz e o seu cavalo

Um conto de coming of age, variação sobre a fórmula das histórias de amizade entre adolescentes e animais, de uma delicadeza discreta.

Estados Unidos
Fotogaleria
Andrew Haigh, inclinado em Pete, Willy Vlautin, 45 anos
Fotogaleria
Magra em pete, andrew haigh, cavalo
Fotogaleria
Lean Pete, Andrew Haigh, Filme, Crítica cinematográfica
Fotogaleria
Lean on Pete, Festival Internacional de Cinema de Dublin, Cinema, Cinema
Fotogaleria

Mudança drástica para o britânico Andrew Haigh, que do drama conjugal, psicológico e vivido entre quatro paredes, do filme anterior (45 Anos), passa para o confronto com a vastidão da paisagem americana. Uma coisa que Haigh não deve ser mesmo nada é naif, e O Meu Amigo Pete evita ficar pasmado perante o “mito” e perante a memória do cinema que imprimiu a “lenda americana”. Se há recordações do western, inevitáveis num filme que se passa entre cavalos e as paisagens abertas do Oregon, nem por um segundo elas aparecem enquanto “revisão mitológica”. É muito por isso que este filme, menos coeso, até menos intenso, do que 45 Anos, acaba por nos ir conquistando – a forma como Haigh o constrói, numa inteligência empregue como quem não quer a coisa, sempre sem empurrar nada pelos olhos do espectador adentro, ajuda bastante. Descobre-se que é como um conto de coming of age, quase uma variação sobre a fórmula tradicional das histórias de amizade entre adolescentes e animais, e isso é dado com uma delicadeza discreta, alimentada por cenas onde tudo o que importa ver é o bonding entre um rapaz solitário (Charlie Plummer) e o seu amigo equídeo.

É realista, mas o realismo mais contundente é económico. O pano de fundo é o de uma “economia de subsistência”, onde toda a gente se esgadanha por um punhado de dólares, porque são os únicos dólares disponíveis. Mesmo o circuito das corridas de cavalos é uma coisa working class, empregos e formas de ganhar a vida que valem exactamente por isso, não pelo glamour que não existe. Essa “pequenez” económica contrapõe-se à “grandiosidade” da paisagem, e essa deve ter sido uma ideia que Haigh cultivou, porque é nesse conflito de “escalas” que se desenha a tristeza severa deste olhar sobre a América rural (nos planos muito fechados sobre as casas e os trailers atravancados e o horizonte amplo dos planos mais paisagísticos). Naturalmente, o nó central também é criado por uma razão económica: Pete, o cavalo, está “obsoleto”, é uma despesa insustentável, o seu destino é um matadouro a troco de algum dinheiro. O rapaz decide tentar salvá-lo. Uma história de educação económica transforma-se numa história de educação sentimental. Ou vice-versa, mas sempre com a mais realista das tristezas.

i-video
Sugerir correcção
Comentar