Benefício às empresas no IRC pela criação de emprego vai acabar

PS apoia bandeira do BE e PCP. Auditoria aos incentivos dos últimos anos revelava irregularidades.

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As empresas da grande distribuição, do Pingo Doce ao Continente, beneficiam deste incentivo Daniel Rocha

As bancadas do BE, PCP e PS concordaram em pôr fim ao benefício fiscal em IRC às empresas pela criação líquida de postos de trabalho, um incentivo controverso que uma auditoria da Inspecção-geral de Finanças concluíra não ser eficaz na “criação de emprego efectivo”. O fim desta medida, que terá de ser confirmado na votação global no Parlamento depois de ter sido aprovado na especialidade nesta quarta-feira, deverá ter efeitos a partir de 1 de Julho.

O incentivo tem estado concentrado num universo de três mil empresas nos últimos anos. O Pingo Doce, a TAP, o Banco de Portugal, a Teleperformance, o BNP Paribas, a Ecco Let e o Lidl ocupam os primeiros lugares, mas no grupo dos beneficiários encontram-se outras grandes empresas, como a EDP Distribuição, a Galp, o Continente (do grupo Sonae, dono do PÚBLICO) e a Caixa Geral de Depósitos.

O fim deste incentivo foi aprovado na especialidade através de uma proposta do BE que contou com os votos favoráveis do PCP e do PS. A bancada comunista também apresentara uma iniciativa idêntica para acabar com este incentivo.

O apoio do PS a esta proposta concreta – defendida tanto pelo BE como pelo PCP – surge na mesma altura em que o Parlamento se prepara para discutir as alterações à lei laboral entre críticas dos parceiros do PS a algumas das soluções encontradas na concertação social. Mas embora o incentivo que agora acaba tenha uma componente que se relaciona com os apoios à criação líquida de postos de trabalho para jovens e desempregados, trata-se de uma questão separada da revisão do Código do Trabalho que tem gerado fricção entre o Governo e os parceiros à esquerda.

Ainda que o Governo de António Costa nunca tenha fechado a porta a discutir o fim deste incentivo, o executivo tinha posto em cima da mesa uma outra solução: manter a medida de pé para já, mas tornando o benefício mais restritiva (com um incentivo mais pequeno para as grandes empresas).

Até agora, as empresas podiam abater ao lucro tributável em IRC um valor equivalente a 150% dos encargos com novas contratações (mas condicionada à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração). Mas numa análise ao que se passou entre 2009 e 2014, a Inspecção-Geral de Finanças (IGF) detectou situações irregulares de uso indevido deste benefício na ordem dos 32 milhões de euros. E considerou que a medida não garantia uma “efectiva criação líquida de emprego”, estando em mais de metade dos casos a ser usado para a “conversão de anteriores contratos de trabalho de natureza precária em contratos por tempo indeterminado”.

É um incentivo “muito caro e está a ser apropriado por empresas que não precisam dele”, reagiu no Parlamento a deputada do BE Mariana Mortágua, dando como exemplo o caso do Banco de Portugal, que, disse, não foi contratar recém-licenciados por causa desta medida.

Como entretanto havia 15 incentivos fiscais em risco de caducar, o Governo teve de apresentar ao Parlamento uma proposta de lei de forma a prorrogar aqueles que queria manter ou a revogar os que considera obsoletos. O incentivo fiscal no IRC foi um dos que o Governo propôs manter para já, mas criando diferenças baixa para as grandes empresas e com uma diferenciação positiva para as micro, pequenas e médias empresas (PME) e as que estão instaladas no interior do país.

Em relação ao ano de 2015, as estatísticas divulgadas pelo Governo mostram que o incentivo representou para o Estado uma despesa fiscal na ordem dos 36 milhões de euros (em anos anteriores foi um pouco superior).

O próprio executivo já reconheceu que o sistema de controlo dos incentivos fiscais no IRC pela criação de emprego tem brechas. E quando propôs esta alteração, reconheceu ser preciso reforçar os mecanismos de fiscalização, criando uma plataforma de partilha de informação entre a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), o Instituto da Segurança Social e o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP). O objectivo passa por dar ao fisco informação que lhe permita saber de forma eficaz se uma empresa está, ou não, a acumular incentivos relativamente ao mesmo trabalhador ou ao mesmo posto de trabalho, algo que à luz da lei não é permitido.

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