Compras do BCE que têm ajudado Portugal param no final do ano

Desde 2015, o BCE comprou em média mais de 500 milhões de euros de dívida portuguesa, ajudando a manter as taxas baixas. Agora Draghi anunciou o fim do programa, mas garante que outros apoios irão continuar.

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Mario Draghi anunciou o fim do programa de compra de activo do BCE LUSA/VALDA KALNINA

Foram até agora mais de dois biliões de euros em toda a zona euro, e destes, 33 mil milhões de euros em Portugal, os montantes de dívida pública que o Banco Central Europeu comprou desde Março de 2015. Uma injecção de liquidez na economia inédita que ajudou o motor do euro a recuperar, afastou o fantasma da deflação e contribuiu para que as taxas de juro da dívida caíssem mesmo nos países que tinham estado no centro da crise do euro, como Portugal. Agora, mais confiante de que a sua tarefa está completa, a entidade liderada por Mario Draghi anunciou esta quinta-feira, que deixará de realizar novas compras de dívida no final deste ano.

A decisão já era amplamente esperada pelos mercados. Durante o último ano, o BCE já tinha vindo a reduzir progressivamente o montante das compras mensais, que são neste momento de 30 mil milhões de euros, contra um máximo de 80 mil milhões entre Abril de 2016 e Março de 2017. E, no final do ano passado, a aceleração da economia da zona euro e o aumento progressivo da inflação tinham dado mais argumentos aos que, principalmente na Alemanha, há muito defendiam que o BCE deveria parar de ajudar os Estados a financiarem-se, através desta compra em larga escala dos títulos de dívida dos países da zona euro.

Agora, explicou o presidente do BCE, as novas compras vão reduzir-se para 15 mil milhões a partir do próximo mês de Outubro e, no final do ano, deixam de realizar-se.

O fim do programa de compras de dívida satisfaz os denominados “falcões” do BCE, aqueles que defendem uma política mais restritiva do banco central. No entanto, para não deixar descontentes aqueles que têm receio de colocar em causa a retoma com um abandono repentino das políticas de estímulo (e entre os quais se inclui o próprio Mario Draghi), o BCE deixou duas garantias importantes.

Em primeiro lugar, irá continuar a reinvestir os valores das obrigações que já detém quando estas atinjirem a sua maturidade, isto é, o BCE irá manter durante mais algum tempo o volume histórico de activos acumulado no seu balanço.

Depois, Draghi assegurou que não espera uma subida das taxas de juro de referência do BCE pelo menos durante o próximo ano. Isto é, deu uma garantia de que o “preço do dinheiro” na zona euro (que é de zero no caso dos empréstimos concedidos pelo BCE aos bancos e de -0,4% no caso dos depósitos realizados pelos bancos no BCE) vai continuar a um nível histórico baixo, continuando a dar uma ajuda à concessão de crédito nas economias.

O presidente do BCE explicou que a forma cuidadosa como o BCE planeia retirar os seus estímulos se deve ao facto de se estar “na presença de uma economia mais forte, mas em que a incerteza aumentou”, assinalando os riscos provenientes de um recente abrandamento da economia da zona euro, da instabilidade que se vive nos mercados por causa da Itália ou do aumento das políticas comerciais proteccionistas em todo o mundo.

Ainda assim, ao acabar com o programa de compras de activos (na sua grande maioria títulos de dívida pública), o BCE dá motivos a vários países para se preocuparem. E Portugal é certamente um dos que mais riscos correm.

Desde 2015 que o facto de o BCE actuar como comprador de dívida pública nos mercados ajudou o Estado português a, mais facilmente, colocar as suas emissões de dívida e a uma taxa de juro mais baixa. Uma parte da descida das taxas da dívida que se registou nos últimos anos deveu-se ao facto de o BCE comprar em média mais de 500 milhões de euros de obrigações do Tesouro portuguesas.

Sem essas novas compras, e apenas com os reinvestimentos que o BCE irá continuar a fazer, a tarefa de colocar a dívida torna-se mais difícil. Ainda assim, é de notar que no último ano e meio, mesmo com o BCE já a diminuir o volume de compras mensais, as taxas conseguidas pelo país junto dos investidores internacionais continuaram a descer, beneficiadas pela melhoria dos indicadores económicos e orçamentais e pela subida das classificações atribuídas pelas agências de ratings.

Outro efeito negativo para a economia portuguesa pode advir de uma eventual subida das taxas Euribor, uma consequência natural da redução da injecção de liquidez por parte do BCE. Para as famílias e empresas portuguesas com empréstimos indexados Euribor, uma subida representa automaticamente um aumento de custos. Neste caso, a garantia do BCE de que as suas taxas de referência se irão manter inalteradas, pelo menos “ao longo do Verão de 2019”, limita a perspectiva de variações significativas na Euribor.

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