Kim Jong-un: de pária obscuro a estadista afável em menos de seis meses

Cimeira com Trump é o ponto alto de uma súbita e aparente metamorfose do líder norte-coreano, com quem todos querem agora conversar. Fugidos ao regime lembram que Kim não deixou de ser um “demónio”.

Kim Jong-un e Lee Hsien Loong, primeiro-ministro de Singapura
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Kim Jong-un e Lee Hsien Loong, primeiro-ministro de Singapura EPA / HANDOUT
Kim Jong-un e Xi Jinping, Presidente da China
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Kim Jong-un e Xi Jinping, Presidente da China Reuters/XINHUA
Kim jong-un e o Presidente da Coreia do Sul, Moo Jae-in
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Kim jong-un e o Presidente da Coreia do Sul, Moo Jae-in Reuters/KCNA

Quando Kim Jong-un e Donald Trump apertarem as mãos e pousarem para uma fotografia histórica, na cimeira de terça-feira em Singapura, o líder norte-coreano completará uma importante etapa da transformação vertiginosa e surpreendente da sua imagem aos olhos da comunidade internacional. 

Depois de um ano de 2017 em que contribuiu para o aumento da tensão na Península da Coreia, ordenando alguns dos mais pujantes ensaios nucleares e balísticos registados na região, que, somados às acusações de violação de direitos humanos e de repressão diárias levadas a cabo pelo seu regime, lhe ampliou o isolamento na arena mundial, Kim completa os primeiros seis meses deste ano na pele de um dirigente político afável e de sorriso fácil, que muitos líderes mundiais querem conhecer.

Aproveitando esta aparente abertura de Kim ao que se estende para lá do paralelo 38, consagrada com a visita histórica à Coreia do Sul, em Abril, e confirmada com o encontro desta terça-feira com o Presidente norte-americano, Vladimir Putin (Rússia) e Bashar al-Assad (Síria) são alguns dos chefes de Estado que já tiraram senha para ser fotografados ao lado do obscuro e misterioso líder da Coreia do Norte, como o foram recentemente Xi Jinping (China), Moon Jae-in (Coreia do Sul) e Lee Hsien Loong (Singapura), ou os chefes da diplomacia de Moscovo e Washington, Sergei Lavrov e Mike Pompeo.

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Trump acredita que foi a pressão insustentável das sanções económicas sobre Pyongyang que obrigou Kim a abrir o sorriso, mas para a maioria dos analistas é na suposta conclusão bem-sucedida do programa nuclear norte-coreano que reside a origem da mudança de atitude do líder comunista, que procura agora diversificar a economia do regime e forjar novas alianças, a partir de uma posição de força.

“Estamos a assistir à criação do ‘Kim Jong-un, o estadista internacional’ (...), muito diferente do desconhecido herdeiro [de Kim Jong-il] com cara de bebé que conhecemos em 2010”, refere Jean Lee, antiga editora da delegação da Associated Press em Pyongyang.

“Com um míssil balístico intercontinental preso no cinto, Kim surge como o líder de um país que se vê como uma potência nuclear. E os agentes internacionais estão a mergulhar de cabeça pela hipótese de o conhecer, de perceber quem ele é e saber o que quer para o seu país”, explica a jornalista, citada pela Reuters.

A suavização da imagem de Kim tem tido, no entanto, repercussões contrastantes na vizinha Coreia do Sul. Se a cordialidade demonstrada pelo líder norte-coreano no encontro com Moon contribuiu para aumentar, de 10% para 31%, a sua aprovação junto dos sul-coreanos – segundo uma sondagem da Gallup –, entre os milhares de norte-coreanos que fugiram para Sul da península ninguém esquece o “demónio” do Norte. O sentimento é, por isso, de desalento.

“Morreram tantos às mãos de Kim e do seu regime e dizem agora que ele é humano”, lamenta Song Byeok, um sobrevivente dos campos de trabalho norte-coreanos, que é hoje pintor na Coreia do Sul. À BBC, não esconde a raiva pela forma como no país que o acolheu estão a depreciar o passado da dinastia Kim: “Estão a romantizar um ditator e a ‘glamourizar’ o seu regime. Tudo isto é profundamente errado”.

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