Num G7 de ataque a Trump, a Europa hesita em usar todas as armas

Num G7 em que Trump se prepara para ser o foco de todas as críticas, a Europa ainda tem que gerir a preocupação de evitar uma escalada no conflito comercial, da qual poderia sair como grande perdedora.

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É num clima de tensão entre blocos que hoje começa mais uma cimeira do G7 REUTERS/Yves Herman

Com o clima de guerra fria definitivamente instalado nas relações comerciais internacionais, Donald Trump irá ter pela frente na reunião do G7 que se inicia nesta sexta-feira seis outros líderes mundiais que mostraram, com as retaliações anunciadas nos últimos dias, que estão dispostos a lutar contra a política comercial proteccionista seguida pela administração norte-americana. Ainda assim, do lado europeu, a estratégia de confronto a seguir está limitada pelos interesses diferenciados dos vários países da UE e pelo medo, principalmente da Alemanha, das consequências de uma escalada do conflito comercial com os EUA.

Dois dias antes de se iniciar a reunião dos líderes dos sete grandes países industrializados, que desta vez se encontram no Canadá, a União Europeia – que conta com Alemanha, França, Itália e Reino Unido no G7 – decidiu deixar uma mensagem a Donald Trump: anunciou a imposição de uma taxa alfandegária mais elevada, numa série de produtos importados dos EUA, como retaliação para a subida de taxas confirmada em Maio por Washington ao aço e alumínio europeus.

Da lista de produtos visados pela Comissão Europeia – e que vão passar a estar sujeitos a uma taxa de 25% – constam ex-libris norte-americanos como os jeans, o whiskey bourbon, as motas Harley Davidson ou mesmo os baralhos de cartas. No total, as novas taxas incidiram sobre produtos exportados pelos EUA para a UE no valor de 2800 milhões de euros por ano.

Na semana anterior, Canadá e México também tinham anunciado a sua própria retaliação comercial às medidas proteccionistas dos EUA, e, para tornar ainda mais tenso o ambiente para o G7, foram notícia os telefonemas pouco amigáveis entre o Presidente norte-americano e o seu homólogo francês, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro canadiano, Justin Trudeau. A Trudeau, Donald Trump terá chegado a falar do incêndio na Casa Branca feito por forças britânicas (presentes no que viria mais tarde a ser o Canadá) em 1814 quando dava justificações para ter invocado motivos de segurança nacional para aumentar as taxas sobre o aço e alumínio canadianos.

A hesitação europeia

Mas se é verdade que o ambiente será de tensão e crítica aberta aos EUA (não só por razões comerciais) pelos países seus tradicionais aliados, não é de todo provável que, principalmente do lado europeu, se assista a uma estratégia de ataque cerrado a Trump e à sua política comercial.

O problema é que, para a Europa, as perdas provocadas pelas taxas sobre o aço e alumínio até agora impostas pelos EUA são incomparavelmente menores do que os custos potenciais de uma escalada do conflito, que inclua a aplicação de medidas proteccionistas noutros mercados.

No caso do aço e do alumínio, as taxas aplicadas pelos EUA (de 25% e 10%, respectivamente) incidem sobre exportações europeias anuais no valor de 6600 milhões de euros, isto é, 1,7% das exportações totais.

O impacto é muito mais baixo do que aquele que aconteceria se, por exemplo, os EUA decidissem agravar as taxas alfandegárias sobre os automóveis europeus. A indústria automóvel tem um peso de 10% no total da indústria da UE e, em 2016, as exportações para os EUA (de longe o principal destino) atingiram os 37 mil milhões de euros (seis vezes mais do que o aço e alumínio). Da Alemanha, saíram 22 mil milhões de euros destas exportações.
Por isso, não é de espantar que, na cabeça dos responsáveis políticos europeus – e principalmente dos alemães –, esteja como prioridade evitar que os EUA, num cenário de escalada do conflito comercial, avancem com medidas de represália no sector automóvel.

O receio de que isso aconteça é real, até porque Donald Trump não tem tido problemas em fazer publicamente essa ameaça. “Abram as barreiras e acabem com as vossas taxas. Se não fizerem isso, nós iremos taxar a Mercedes-Benz. Nós iremos taxar a BMW”, afirmou o Presidente norte-americano num discurso feito dois dias depois de ter anunciado as taxas sobre o alumínio e o aço.

Outro problema para a Europa é a dificuldade em conciliar os interesses e perspectivas diferentes das várias capitais. Se, em Berlim, a prioridade é claramente evitar uma escalada (o que explica o discurso muito prudente do ministro da Economia), em Paris e Bruxelas acredita-se que mostrar força agora é a maneira de travar Trump, enquanto em Roma a dúvida é ainda muito grande sobre qual será a posição em relação à administração norte-americana.

Para já, por aquilo que se pode ver da retaliação anunciada na quarta-feira, a Europa optou por uma via de prudência, seguindo estritamente aquilo que está previsto nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC). Também esta semana, a UE anunciou a entrega de uma queixa na OMC contra os EUA, contrariando o argumento norte-americano de defesa da segurança nacional, e é pela utilização das regras da instituição que se chega aos 2800 milhões de euros de produtos sujeitos a taxas mais elevadas (que é muito menor do que os mais de 6000 milhões taxados pelo Canadá).

Mas mais do que na OMC, as esperanças europeias residem nos próprios EUA. Não em Trump e na sua administração, mas no Partido Republicano tradicional, que sempre foi o principal defensor das políticas de comércio livre. “Tentamos convencer os nossos parceiros americanos que não existe nenhuma razão para se portarem desta maneira”, afirmou na quarta-feira o vice-presidente da Comissão, Jyrki Katainen, lembrando que “dos congressistas dos dois partidos e dos seus empresários continuamos a ouvir o que ouvíamos no passado”.

Do lado de Trump, contudo, poucos são os que apostam na possibilidade de um recuo nesta fase. Principalmente numa altura em que está, com o mesmo tipo de tácticas, a obter cedências da China e se sentir que na Europa, e principalmente na Alemanha, a defesa dos princípios do comércio livre são menos fortes do que o medo de perder o acesso ao maior mercado mundial.

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