PSD e Bloco admitem propor lei para revelar maiores devedores da CGD

Sociais-democratas pediram a lista dos 50 maiores devedores da CGD e PCP quer conhecer os créditos acima de dois milhões dos bancos intervencionados. BE quer reduzir o sigilo bancário e aumentar obrigações dos bancos que recebem ajudas estatais. PS apela à ponderação, face às consequências que a divulgação pode ter.

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MÁRIO CRUZ

Está a ser uma espécie de corrida às listas de devedores:depois de o PSD ter anunciado que quer a lista dos 50 maiores devedores da Caixa Geral de Depósitos (CGD), o PCP apresentou um requerimento em que exige que o Banco de Portugal mostre ao Parlamento a lista de todos os créditos acima de dois milhões de euros concedidos e não pagos aos bancos intervencionados pelo Estado - ou seja, BPN, Banif, BES e Caixa. O PS parece querer travar, para já, os pedidos, sugerindo que haja uma “ponderação mais alargada” e que o governador do Banco de Portugal seja ouvido sobre este assunto.

O deputado socialista João Paulo Correia argumentou que é necessário fazer uma “avaliação” do impacto sobre o banco público, se for divulgada a informação pedida. Por outro lado, recordou que o Ministério Público decidiu há dias arquivar uma queixa, no âmbito da comissão de inquérito à recapitalização da CGD, alegando que o banco não incorreu em ilegalidades ao não divulgar a lista de devedores e que o caso deve ser resolvido nos tribunais. Em declarações aos jornalistas, João Paulo Correia defendeu ainda que a divulgação da lista de devedores à CGD pode implicar que Portugal entre em "incumprimento" no acordo que fez com Bruxelas para a recapitalização do banco. 

A posição do PS é a resposta às várias iniciativas que surgiram ao longo do dia, à esquerda e à direita, sobre o acesso a listas de devedores à banca. 

Os sociais-democratas admitem vir a recorrer à via legislativa para ver a questão respondida e os bloquistas, ao fim da tarde, anunciaram que também estão a estudar iniciativas legislativas que passam pela repescagem das propostas sobre o sigilo bancário vetado por Marcelo em Setembro de 2016, pelo reforço de poderes das comissões parlamentares de inquérito, e ainda pelo aumento das obrigações de informação dos bancos alvo de ajudas estatais. 

Os comunistas lançam uma espécie de desafio aos sociais-democratas. Em vez de se escrutinar só a Caixa, como quer o PSD, é preciso ver à lupa todos os bancos em que o Estado colocou dinheiro dos contribuintes para tapar o buraco criado por créditos não pagos.

Na apresentação do requerimento do PSD, o vice-presidente da bancada António Leitão Amaro justificou o pedido mais restritivo com o facto de a CGD ser pública e, por isso, ter um dever acrescido de transparência. Caso não haja resposta, o PSD “admite a possibilidade de ir pela via legislativa”, afirmou o deputado.

Com o requerimento que deu entrada esta quinta-feira, já depois da intenção ter sido anunciada pelo líder do PSD, os sociais-democratas querem saber “quem são os maiores devedores que incumpriram, os montantes e quem concedeu os créditos que levaram a perdas do banco e que conduziram à necessidade de recapitalização”, segundo o deputado. Leitão Amaro lembra que cada português fez um esforço de 350 euros para injectar a CGD e que “boa parte foi para cobrir créditos”.

O requerimento dos sociais-democratas, dirigido à própria CGD, incide sobre os créditos incumpridos, as renegociações e os decisores que os concederam desde 2000 até à actualidade.

Bloco acusa PSD de "oportunismo político"

Ao final da tarde, Mariana Mortágua acusou o PSD de usar a Caixa como "filão de oportunismo político" e de a querer "enfraquecer". Porque, realçou, os sociais-democratas sabem que qualquer pedido de informação deste género à administração da Caixa "nunca foi dado nem será devido à lei que protege os clientes". 

O caminho, segundo a deputada do Bloco, passa por voltar a insistir, no Parlamento, na lei que previa a redução do sigilo bancário e que obrigava os bancos a enviarem ao fisco informação sobre o saldo das contas bancárias acima de 50 mil euros mas que foi vetada por Marcelo Rebelo de Sousa. Há ano e meio, o Presidente argumentou com a "inoportunidade política" da iniciativa do Governo, tanto pela situação da banca como pela necessidade de investimento do país. "Não há agora razão para não ser aplicada", defende Mariana Mortágua, desafiando o Governo a reapresentar a proposta ao Parlamento.

O Bloco está ainda a "estudar a forma legal e as iniciativas que irá apresentar", parte delas "certamente" até ao Verão, promete Mariana Mortágua. Mas será para "todo o sistema bancário e não medidas ad hoc".

Pedido ao Banco de Portugal

No caso do PCP, o pedido é feito ao Banco de Portugal. O deputado Miguel Tiago afirmou aos jornalistas que o pedido da sua bancada inclui a listagem "dos responsáveis pela aprovação de cada um desses créditos" acima de dois milhões de euros que não foram pagos, "as condições em que os aprovaram e qual o colateral ou garantia dada [pelos devedores] para cada um desses créditos".

Nessa listagem, os comunistas querem que seja incluída a relação de "todos os créditos que tenham sido removidos dos balanços dos bancos e em que condições essa decisão foi tomada", descreveu o deputado lembrando que os bancos, por não poderem ter valores muito elevados de créditos mal-parados nos balanços, "os limpam". "Queremos saber quem é que levou o dinheiro dos bancos e não pagou", "quem está a lucrar com a crise dos bancos que o contribuinte está a pagar", acrescentou.

Miguel Tiago deixou também farpas ao PSD, lembrando que o partido, que até foi o relator da comissão de inquérito do BES, entendeu na altura que "não fazia falta nenhuma saber quem devia dinheiro" ao banco. "É curiosa agora a postura do PSD sempre que se fala na Caixa, que é um banco em funcionamento", o que leva a que seja preciso mais cuidado na revelação deste tipo de informação. Por isso, o PCP está disposto a que seja o Banco de Portugal a definir as condições em que os deputados podem ter acesso a estes dados.

O deputado vincou que o partido não quer fazer o "julgamento em praça pública desta ou daquela empresa ou pessoa", mas "perceber quais as permeabilidades e fraquezas" dos bancos que levaram a que fosse preciso injectar 20 mil milhões de euros do erário público. Se, "eventualmente" se encontrarem "elementos que apontam para corrupção ou promiscuidade - que certamente apontam - então sim, devemos tirar conclusões políticas e apresentar iniciativas".

Miguel Tiago não resistiu a apontar os casos da Fundação Social-Democrata que "pediu dinheiro ao Banif, e não pagou, para comprar casas para depois alugar ao PSD na Madeira", ou no BES "a pedir ao Montepio e depois o presidente da câmara de Grândola a aprovar projectos e em seguida ir trabalhar para o Montepio. Promiscuidade há, mas com a listagem ficaremos com uma percepção mais profunda."

O pedido de acesso a estes dados sobre os maiores devedores da CGD já tinha sido feito pelo PSD e pelo CDS no âmbito da comissão de inquérito à recapitalização do banco público, mas a informação foi negada por várias entidades. O caso seguiu para tribunal. Leitão Amaro lembrou que a esquerda quis “encerrar” a comissão de inquérito antes que houvesse uma decisão final dos recursos interpostos.

 

Notícia alterada: alterado o 1.º parágrafo e acrescentados os 2.º, 3.º parágrafos, com a posição do PS

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