Despedida de Montenegro: elogios, aplausos e silêncios mal compreendidos

No momento de homenagem no hemiciclo, só falou o líder parlamentar do CDS, o que indignou deputados na bancada do PSD.

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Montenegro começou por cumprimentar os deputados da esquerda, como o líder dos comunistas, Jerónimo de Sousa José Sena Goulão/Lusa
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Nuno Magalhães, do CDS, foi o único líder parlamentar a dedicar uma intervenção a Montenegro José Sena Goulão/Lusa
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Luís Montenegro foi aplaudido de pé pelo grupo parlamentar do PSD, que liderou durante seis anos José Sena Goulão/Lusa

Foram quase 24 horas de uma despedida de 16 anos de vida parlamentar em que houve elogios – incluindo de Passos Coelho – sorrisos e cumprimentos de deputados das bancadas da esquerda, e aplausos do PSD, do CDS e de alguns na bancada do PS. Luís Montenegro escusou-se a deixar a função de deputado com o rótulo de opositor de Rui Rio, mas realçou que a “força de uma liderança” se faz na “pluralidade de opiniões”.

O social-democrata que liderou a bancada do PSD durante seis anos (até Julho de 2017) entrou no hemiciclo pela última vez antes do debate quinzenal desta quinta-feira e começou a cumprimentar os deputados das bancadas da esquerda, como o líder do PCP Jerónimo de Sousa, a deputada do PEV Heloísa Apolónia e o vice-presidente da bancada do PS Filipe Neto Brandão.

Já com os membros do Governo na sala, o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, não escondeu os desencontros com Montenegro – “além de adversários leais ficámos bons amigos” –, mas também deixou um elogio: “É muito jovem, sei que vai continuar a intervir no espaço público e isso só enriquece [o debate]”. É habitual haver uma ronda de intervenções, mas só falou o próprio Montenegro e o líder da bancada do CDS, Nuno Magalhães. Fernando Negrão, líder da bancada do PSD, só se dirigiu a Montenegro mais tarde, desejando-lhe felicidades, na primeira intervenção no debate quinzenal, o que deixou muitos deputados indignados.

Uma das vozes críticas foi a de Miguel Santos, ex-vice-presidente da bancada, e apoiante de Santana Lopes. Num email enviado ao grupo parlamentar e a que o PÚBLICO teve acesso, o deputado expressou "lamento e tristeza", por ver que, "no momento de plenário em que a despedida [de Montenegro] é referida (...), o elogio tenha surgido somente da parte do líder parlamentar do CDS". Outra crítica partiu de Carlos Abreu Amorim, outro ex-vice-presidente da bancada. “Infelizmente, ninguém de qualquer outra bancada entendeu ter o dever de tomar a palavra. Contrariando a tradição, assumida nas despedidas de Bernardino Soares, Paulo Portas, Alberto Martins, Mendes Bota, entre tantos outros, os demais líderes parlamentares restaram num silêncio que lhes caiu muito mal. Fica o registo”, escreveu no Facebook.

Foi Nuno Magalhães que fez as despesas da despedida do social-democrata, contrariando a “frase feita” de que na política não há amigos. “É mentira. E esses amigos podem ser de partidos diferentes”, disse o líder da bancada do CDS.

Sentado na última fila da bancada do PSD, Luís Montenegro disse não acreditar ter deixado “inimizades” nas restantes bancadas e pediu aos deputados que “continuassem a dignificar” o trabalho parlamentar, deixando um aviso: “O populismo é o pai da mediocridade e a mediocridade é a mãe da pobreza”.

Foram as últimas palavras do deputado de uma despedida que começou num jantar na quarta-feira à noite. Luís Montenegro juntou à mesa mais de 150 sociais-democratas entre os quais um dos seus maiores apoiantes, Miguel Relvas, os ex-líderes do PSD Pedro Passos Coelho e Luís Marques Mendes, mas também ex-ministros como Maria Luís Albuquerque, José Pedro Aguiar-Branco e Paula Teixeira da Cruz, e o antigo secretário-geral do partido, José Matos Rosa. Os elogios multiplicaram-se, segundo relatos feitos ao PÚBLICO, num jantar em que esteve também Fernando Negrão.

O próprio Passos Coelho, que não tem agenda pública há um mês, desde que saiu do Parlamento, reconheceu o talento do ex-líder parlamentar e disse ser uma “pena que não esteja em plenas funções”. Luís Marques Mendes disse ser apreciador das “qualidades políticas” de Montenegro e apontou o discurso do ex-líder parlamentar no congresso de Fevereiro como um exemplo de “nobreza e de dignidade raras” na política.

Depois dos elogios, Luís Montenegro disse não escamotear a percepção criada de um dia poder vir a representar todos os que estavam ali, mas que isso poderia acontecer ou não. Nestes últimos dias, o social-democrata que recusou ir a jogo nas últimas directas, tem afastado a ideia de ser o protagonista da oposição interna. Mas - como sublinhou à saída de uma audiência com Ferro Rodrigues -, isso não significa pensamento único: “A força e a riqueza da liderança faz-se na pluralidade de opiniões”. E a opinião de Montenegro, já se sabe, terá espaços mediáticos semanais no Expresso, TSF e TVI.

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