Putin, Erdogan e Rouhani sentam-se à mesa para decidir o rumo da guerra na Síria

Prestes a tornarem-se as potências dominantes, Rússia, Turquia e Irão realizam uma cimeira em Ancara para encontrar terreno comum para os seus interesses divergentes.

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Vladimir Putin inaugurou uma central nuclear na costa turca construída pela empresa estatal russa Rosatom TOLGA BOZOGLU/EPA

Os líderes dos três países que mudaram o rumo da guerra da Síria – Rússia, Turquia e Irão – vão começar esta quarta-feira a desenhar o futuro do conflito. Vladimir Putin, Recep  Erdogan e Hassan Rouhani reúnem-se em Ancara para tentar encontrar uma convergência nos seus diferentes interesses, numa altura em que cresce o seu poder na Síria.

Nos últimos anos as potências no terreno de guerra anunciavam como prioridade a destruição do Daesh. Por exemplo, os Estados Unidos, que queriam a queda do Presidente sírio, Bashar al-Assad, deixaram de lado esse objectivo para combater os jihadistas, cuja presença na Síria foi quase extinta.

No meio do combate ao terrorismo jihadista, a guerra civil síria continuava. O regime de Damasco continuou a combater os rebeldes. Até que a entrada da Rússia, com o apoio do Irão, provocou uma reviravolta e permitiu que Assad derrotasse praticamente toda a oposição armada.

Damasco está prestes a dominar totalmente o enclave de Ghouta Oriental, um dos poucos territórios ainda sob controlo dos rebeldes. E a atenção de Assad vai virar-se para o Norte, onde se encontra o que resta da oposição armada. Mas aí, Damasco pode dar de caras com os turcos.

Em Janeiro, a Turquia entrou em força no conflito sírio iniciando uma intensa ofensiva sobre Afrin para expulsar as milícias curdas sírias YPG (Unidades de Protecção Popular). Depois de dar a cidade como controlada, Erdogan tem debaixo de olho a zona Nordeste da Síria, onde os curdos, apoiados pelos EUA, dominam – a cidade de Manbij será o próximo alvo.

Assad, por sua vez, vai centrar atenções em Idlib, para onde fugiram os rebeldes de Ghouta, Alepo e de outras zonas. Esta é a última área controlada pela oposição. Mas alguns destes grupos, nomeadamente os considerados moderados, são apoiados por Ancara.

As grandes potências envolvidas na Síria têm interesses que entram em confronto: a Turquia quer derrotar os curdos, que são apoiados pelos EUA; Damasco, apoiada pela Rússia e Irão, quer acabar com os rebeldes que são apoiados pela Turquia; os EUA querem estancar o crescimento da influência iraniana na região.

Na fase da guerra que agora se inicia, estes interesses correm o risco de entrar em choque. E por isso, os principais aliados de Assad (Rússia e Irão) vão sentar-se com um dos maiores opositores do líder sírio, a Turquia (Erdogan criticou a ofensiva de Ghouta e defende a queda de Assad). O objectivo é não se confrontarem entre eles e definirem qual é o espaço de acção de cada um. 

Uma fonte oficial turca disse à Reuters que na reunião de quarta-feira Ancara vai pedir a Moscovo para “controlar mais o regime” sírio. Já uma fonte oficial iraniana explicou que “independentemente das intenções, as acções da Turquia na Síria” devem ser interrompidas “o mais cedo possível”.

“Existem assuntos onde os três países têm diferentes políticas na Síria”, admitiu a fonte turca. “Um dos objectivos é encontrar um meio-termo e criar políticas que melhorem a situação actual”.

Depois de um pico de tensão com o abate de um caça russo por parte do Exército turco na fronteira com a síria, Ancara e Moscovo reaproximara-se, ao mesmo tempo que ambos viram as suas relações com o Ocidente deteriorarem-se. A visita que Putin começou esta terça-feira à Turquia (e que dura dois dias), onde inaugurou uma central nuclear russa na costa turca, é exemplo da estreita cooperação entre os dois países.

“A Rússia e a Turquia têm interesses comuns, mas que vão contra os do Irão e de Damasco. Moscovo está a tentar gerir três parceiros que se odeiam”, disse à AFP Aaron Stein, do think  tank Centro Rafik Hariri para o Médio Oriente.

Apesar de esta cimeira servir para estabelecer linhas vermelhas na escalada militar e encontrar terreno comum para os diferentes interesses, um possível entendimento terá apenas efeitos no curto prazo.

“A perspectiva da Rússia, Turquia e Irão concordarem com um novo status quo na Síria é, na melhor das hipóteses, uma medida de curto prazo, e que ignora as causas subjacentes e por resolver da guerra”, analisa Nick Paton Walsh, correspondente internacional da CNN. “Rússia, Irão e Turquia podem sorrir para as câmaras em Ancara, mas continuam a andar sobre o vidro estilhaçado da Síria”.

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