Sem portas e sem alarmes, incêndio de Kemerovo só podia acabar em tragédia

O incêndio no centro comercial na cidade russa de Kemerovo matou pelo menos 64 pessoas, na sua maioria crianças. Muitos não tiveram alternativa que não atirar-se das janelas para escaparem às chamas.

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Memorial às vítimas do incêndio no centro comercial de Kemerovo Reuters/STRINGER

As portas fechadas e a ausência de alarmes de incêndio tornaram o centro comercial da cidade siberiana de Kemerovo numa “armadilha” para as dezenas de pessoas que se encontravam no edifício na tarde de domingo, quando um fogo destruiu parte do edifício. Pelo menos 64 pessoas morreram, na sua maioria crianças, e mais de dez continuam hospitalizadas.

O incêndio começou por volta das 17 horas locais (10h em Portugal continental), e terá tido origem na zona de jogos infantis do centro comercial, que àquela hora estava cheio de crianças que iniciavam as férias da Páscoa. Foram enviados mais de 600 bombeiros para o local.

Uma testemunha contou à televisão estatal RT que estava no cinema no terceiro andar quando uma mulher entrou no local enquanto gritava “Fogo!”. “Todos nós começámos a correr, eu e as crianças, estavam sete connosco. Quando saímos, ninguém sabia como nos ajudar com nada”, disse a mulher.

A origem da ignição ainda não foi apurada, mas é possível que tenha sido causado por um isqueiro que incendiou as bolas de espuma de borracha na zona de diversão infantil, propagando as chamas por vários andares do edifício. O canal Rossiya 24 dizia, por outro lado, que a origem mais provável terá sido uma falha eléctrica. Outros responsáveis sugeriram que a origem do fogo estaria relacionada com as velas utilizadas numa festa de aniversário, segundo a Reuters.

Independentemente da causa do incêndio, as condições de segurança no centro comercial “Cereja de Inverno” tornavam o local propício a um desastre como o de domingo. Não foi dado qualquer sinal de alarme assim que o incêndio começou a deflagrar e a maioria das pessoas foi apanhada de surpresa. Um técnico de segurança “desligou o sistema de alerta”, disse o Comité de Investigação que abriu de imediato um inquérito. Foram detidas cinco pessoas para interrogatório, incluindo o director técnico do edifício.

Outra das conclusões preliminares é de que as portas das saídas de emergência estavam bloqueadas e que alguns dos extintores utilizados para combater as chamas não funcionavam. “As portas de emergência estavam fechadas, transformando o complexo numa armadilha e não houve uma evacuação organizada”, escreveu o político local Anton Gorelkin, através da sua conta de Facebook, citado pela BBC. Em várias imagens publicadas nas redes sociais era possível ver pessoas que tentavam abandonar o edifício atirando-se de janelas. Uma criança de onze anos, que perdeu os pais e a irmã, está em coma depois de se ter atirado de um dos andares mais altos.

Vários sites de informação publicaram mensagens que algumas das crianças presas durante o incêndio enviaram às famílias. “Estamos a queimar-nos. Talvez adeus”, lia-se numa das mensagens enviada por uma menina à mãe.

O centro comercial, com uma área de 23 mil metros quadrados, foi inaugurado em 2013 e, segundo a Reuters, foi alvo de uma inspecção às condições de segurança em 2016. Para além de várias lojas, inclui um parque infantil, salas de cinema, sauna, e um pequeno jardim zoológico com cabras, gatos e porquinhos-da-índia.

“Foram cometidas violações graves enquanto o centro comercial estava a ser construído e durante o seu funcionamento”, disse a porta-voz do Comité de Investigação, Svetlana Petrenko. Em 2009, um incêndio numa discoteca em Perm causou a morte a 156 pessoas durante um espectáculo pirotécnico. Também na altura se descobriu que as saídas de emergência eram insuficientes.

O Presidente russo, Vladimir Putin, não falou publicamente sobre o desastre, apenas enviando as “profundas condolências” às famílias das vítimas através de um comunicado do Kremlin. Foi declarado um período de luto reservado apenas à cidade de Kamerovo, a mais de três mil quilómetros de Moscovo. O Governo desvalorizou as críticas de que as notícias sobre o incêndio demoraram muito tempo até serem transmitidas pelos canais de televisão estatais.

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