Marcelo leva mensagem de confiança ao palco do massacre de Batepá

Pela primeira vez, um Presidente da República português irá evocar no local a Guerra da Trindade, um episódio sangrento do colonialismo luso em terras de São Tomé e Príncipe.

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Há 18 anos que um Presidente português não visita São Tomé Miguel Madeira

Marcelo Rebelo de Sousa tem um encontro marcado com o lado negro da história do colonialismo português: a 21 de Fevereiro, no segundo dia da visita de Estado a São Tomé e Príncipe, o Presidente da República vai depositar uma coroa de flores no monumento dos Mártires da Liberdade, em Fernão Dias. Ali onde, numa prisão e em seu redor, a partir de Fevereiro de 1953, morreram mais de mil são-tomenses, alguns torturados até à morte durante a ofensiva militar do governador luso Carlos Gorgulho, naquilo que ficou na história como o massacre de Batepá.

Nesta primeira vez que um chefe de Estado português se vai juntar aos são-tomenses na evocação daquilo que é, para este país, o marco do início de uma revolta contra a ocupação colonial portuguesa, é expectável que haja, da parte de Marcelo Rebelo de Sousa, uma mensagem de confiança para o futuro das relações entre os dois países, na tentativa de sarar feridas históricas que ainda doem nas relações com as antigas colónias.

“Portugal tem uma dívida histórica para com os povos africanos”, escreveu o historiador angolano Carlos Pacheco, no prefácio de Crónicas de uma guerra inventada, de Sum Marky [Ed. O Chão da Palavra, 1999], que relata a também chamada Guerra da Trindade. “Neste país até hoje ainda não se ouviu um Presidente da República ou um primeiro-ministro pedir desculpas por casos como o de São Tomé e outros ocorridos em Angola, Moçambique e Guiné-Bissau. Embora não se trate só de pedir desculpas, pelo menos o gesto denotaria uma mudança de estilo e de comportamento mais saudável para se encararem problemas ainda tão difíceis como é o passado colonial”.

Não se sabe se Marcelo Rebelo de Sousa vai pedir desculpa, mas o gesto só por si justifica esta primeira visita de Estado em 18 anos – quando Jorge Sampaio visitou o país, em 2000, o monumento dos Mártires da Liberdade ainda não existia. No entanto, a visita vai sobretudo percorrer os caminhos do presente, e do futuro.

Acompanhado pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, o Presidente vai contactar com dezenas de Organizações Não-Governamentais portuguesas activas no país, profissionais lusos nas áreas da saúde e educação, visitar escolas, a universidade e a famosa Obra das Irmãs Franciscanas, e encontrar-se com a comunidade portuguesa. Subirá também a bordo do Zaire, o navio da Armada que vai estar um ano naquele ponto nevrálgico do Golfo da Guiné.

No Príncipe, além dos encontros oficiais, Marcelo visita o Parque Natural Ôbo e as suas florestas densas e ricas em biodiversidade, e faz o balanço final na varanda da Roça Sundy, onde em 1919 Sir Arthur Eddington comprovou, graças a um eclipse solar, a Teoria Geral da Relatividade de Einstein.

Na vertente política, a Presidência faz questão de garantir que a visita estava a ser preparada há muito e que não há qualquer intuito de intervir na crise política são-tomense que se agudizou em meados de Janeiro, quando os deputados da oposição tentaram boicotar a eleição de cinco juízes para o Tribunal Constitucional autónomo, o que levou o governo a destacar forças especiais que entraram na sala de plenário do parlamento para expulsar deputados da oposição.

Certo é que Marcelo Rebelo de Sousa se vai reunir com os diferentes partidos políticos, além das autoridades nacionais, em ano de eleições locais e legislativas.

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