UE abre as portas aos Balcãs, mas insiste que a entrada não é livre

Comissão Europeia apresenta documento estratégico com "perspectivas para o alargamento" do bloco no futuro pós "Brexit".

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Skopje, a capital da Macedónia, que disputa o seu nome com a Grécia GEORGI LICOVSKI/EPA

A União Europeia tem uma mensagem política “muito clara” para os seis países dos Balcãs Ocidentais — Sérvia, Montenegro, Macedónia, Albânia, Bósnia Herzegovina e Kosovo — que estão interessados em juntar-se ao clube de Bruxelas: apesar de estarem longe, vocês também fazem parte da família. “Temos em comum a mesma História, a mesma cultura e património; partilhamos os mesmos interesses, enfrentamos os mesmos desafios e as mesmas oportunidades”, lembrou a alta representante para a Política Externa, Federica Mogherini, esta terça-feira.

Ao lado do comissário europeu para o Alargamento, Johannes Hahn, Mogherini apresentou um novo documento estratégico sobre as perspectivas de expansão futura do bloco, no qual a Comissão Europeia reforça o seu interesse em acolher os Estados dos Balcãs, ao mesmo tempo que lembra que a entrada não é livre e que o clube tem regras e princípios definidos que precisam de ser respeitados por todos aqueles que querem fazer parte dele.

Por enquanto, os seis candidatos à entrada estão longe de observar esses princípios e respeitar essas regras, adverte a Comissão, que refere problemas (gerais e específicos) nas questões de funcionamento do Estado de Direito, do mercado ou da administração, corrupção e crime organizado, competitividade e liberalização do mercado. Bruxelas também reconhece as dificuldades dos países, antigos inimigos nas guerras que resultaram do desmembramento da antiga Jugoslávia, para resolver disputas bilaterais sobre território, fronteiras ou até a designação oficial do nome de um país. Mas só depois de serem cumpridas as etapas da reconciliação e normalização de relações entre vizinhos os processos poderão avançar. 

Para já, são a Sérvia e o Montenegro, cujas negociações formais para a adesão à UE começaram respectivamente em 2014 e 2012, que estão no pelotão da frente. A Comissão admite que são os dois países mais bem posicionados para poder vir a integrar o bloco até 2025 — um prazo que, segundo fonte da Comissão, apenas foi formulado como “base de trabalho” e que no documento aparece mencionada como “demasiado ambiciosa”, principalmente tendo em conta que o diálogo entre Belgrado e Pristina ainda não produziu resultados.

Outros estados, como por exemplo a Albânia, têm registado progressos muito significativos no cumprimento do seu Acordo de Associação e Estabilização e a Comissão admite poder recomendar em breve que as negociações para a adesão sejam oficialmente abertas — tal como a Macedónia, que aguarda desde 2005 por uma declaração semelhante.

Já no caso da Bósnia Herzegovina ou do Kosovo — que nem sequer vem especificamente mencionado como possível candidato à UE no documento estratégico —, o processo está a avançar mais lentamente. Mas “quando falamos em pelotão da frente, não quer necessariamente dizer que uns têm de chegar primeiro do que os outros. Depende de cada corredor decidir qual é o ritmo com que quer cumprir o seu percurso”, comparou a mesma fonte, num esforço para mitigar as sensibilidades nacionais destes Estados.

O que a Comissão quer que estes países saibam é que, independentemente do tempo que demorem até chegar à meta, Bruxelas está disponível para apoiar os seus esforços e recompensar o seu “processo de transformação” com o acesso à UE. “Não estamos condenados a ser só 27 [Estados membros]”, observou Mogherini, antecipando uma União pós “Brexit” com mais parceiros no futuro. “Os países dos Balcãs Ocidentais têm agora uma janela de oportunidade histórica para de forma firme e inequívoca ligarem o seu futuro à União Europeia”, lê-se no documento, que apela a uma “acção determinada” desses países para cumprir esse objectivo.

Apesar de ter repetido que não vislumbra nenhum movimento concreto no sentido do alargamento durante o seu mandato, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, voltou a sublinhar a “importância geoestratégica do investimento na estabilidade e prosperidade” da região, que aliás se prepara para visitar, num périplo com início em Skopje no próximo dia 25. “Com vontade política e reformas sustentadas, bem como com soluções definitivas para os conflitos com os vizinhos, os Balcãs terão todas as condições para entrar na União”, garantiu Juncker.

Os analistas lembram que a questão da eventual entrada dos países dos Balcãs se tornou mais premente para Bruxelas nos últimos dois anos, não só por causa da crescente preocupação com as movimentações da Rússia para alargar a sua área de influência, que ameaçam a estabilidade do bloco, como também para reposicionar a Europa no “confronto” económico com a China, que está a investir fortemente na região.

Além disso, a crise migratória que atingiu a UE em 2015 veio mostrar até que ponto a aliança e entendimento com os Balcãs é importante para os actuais Estados membros: assim que países como a Hungria e Áustria fecharam as suas fronteiras para impedir o acesso das populações que fugiam da guerra da Síria ou da pobreza extrema de África, o fluxo de refugiados e migrantes passou a fazer-se através da região — também procurada para o regresso à Europa de terroristas e membros de redes radicais.

Algumas das acções concretas de cooperação entre Bruxelas e os Balcãs que foram apresentadas esta terça-feira passam pela área da defesa e segurança, bem como da justiça e administração interna. Mas o plano de acção da Comissão para apoiar o desenvolvimento dos seis países do Oeste dos Balcãs — que em 2018 conta com um financiamento global de 1,07 mil milhões de euros — abrange ainda as áreas do mercado único, energia, transportes, educação, inovação e mundo digital (uma das propostas para avançar a curto prazo tem a ver com a expansão da banda larga e a redução das tarifas de roaming na região).

Chamando a atenção para o aumento do envelope financeiro (que a Comissão pretende fazer crescer conforme possível até 2020), um dos responsáveis ligados às negociações notava que “o financiamento substantivo que está disponível para os países é contingente à execução de reformas”. E reconhecendo que “existem muitos outros actores activos, a investir na região”, dizia que o que é fundamental para Bruxelas é que o impacto das verbas canalizadas para os Balcãs se faça sentir no sentido de melhorar as democracias, desenvolver as economias, qualificar as populações ou proteger o ambiente dos respectivos países, para acelerar a sua convergência com o restante espaço europeu.

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