Em dois minutos, os 27 acertaram guião para o período de transição do “Brexit”

Michel Barnier já tem mandato para negociar com Londres os termos do relacionamento com Bruxelas depois da aplicação do Artigo 50.

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“É essencial que o Reino Unido expresse claramente as suas posições", disse Michel Barnier STEPHANIE LECOCQ/EPA

No imenso e complexo processo de separação do Reino Unido da União Europeia, esta deverá ser uma das negociações mais fáceis de fechar entre Londres e Bruxelas: a definição dos termos que vigorarão durante o período de transição do “Brexit”, quando o país já não tiver assento ou direito de voto nas instituições europeias, mas continuar vinculado ao quadro legal e regulatório de Bruxelas e obrigado a respeitar as quatro liberdades previstas para a participação na união aduaneira e no mercado único.

“Durante o período de transição, o Reino Unido continuará a participar no mercado único e a beneficiar de todos os seus benefícios económicos, pelo que terá também de cumprir todas as suas obrigações. O mercado único não pode ser à la carte”, sublinhou o negociador para o “Brexit”, Michel Barnier, a quem os 27 Estados-membros entregaram as suas directivas negociais para a discussão com o Governo britânico que agora se inicia.

O guião das negociações foi aprovado em menos de dois minutos: a unidade e consonância entre os líderes europeus para a manutenção do statu quo contrastou com a convulsão política interna provocada pelas propostas do Governo britânico para o que a primeira-ministra, Theresa May, define como o “período de aplicação” do “Brexit” — e que foram duramente criticadas pela poderosa bancada eurocéptica do Partido Conservador.

“Os ministros da UE deixaram uma mensagem clara sobre a sua posição para o período de transição: com todo o acervo da União Europeia a ser respeitado pelo Reino Unido, que deixará de participar no processo de decisão das instituições. Os 27 aprovaram este mandato de forma expedita, e esperamos que se possa alcançar um acordo com o Reino Unido rapidamente”, comentou a vice primeira-ministra búlgara, Ekatarina Zeharieva, que presidiu à reunião do Conselho Europeu.

“O objectivo é fechar o acordo sobre os princípios para o período de aplicação no Conselho Europeu de Março, cumprindo a nossa promessa de evitar toda a incerteza neste processo”, reagiu Downing Street.

O acordo sobre os termos do período transitório, que começará a 29 de Março de 2019, após a aplicação do Artigo 50, é indispensável para evitar um cenário de saída para o precipício, que ambas as partes querem evitar.

Mas, como não deixou de alertar Barnier, o tempo para as negociações é escasso, pelo que “é essencial que o Reino Unido expresse claramente as suas posições. Várias questões permanecem por decidir no acordo de saída e no de transição”, lamentou.

Aparentemente, não existem grandes divergências entre a posição europeia e as propostas do Reino Unido nos critérios para o período transitório, em que o país já não será membro da UE, mas permanecerá vinculado a todas as suas organizações e obrigado a respeitar as suas decisões.

Alguns detalhes a limar têm que ver com o prazo de duração do período de transição — que os 27 querem fazer coincidir com o fim do actual ciclo orçamental, a 31 de Dezembro de 2020, e os britânicos gostariam de poder estender — e com a eventual negociação, por Londres, de novos acordos e tratados com outros países. Nesse ponto, os europeus aceitam que o Reino Unido discuta com outros parceiros as suas relações bilaterais futuras, mas recusam que novos acordos (que colidam com os cerca de 700 tratados internacionais firmados no âmbito da UE) possam entrar em vigor.

Ao mesmo tempo que Barnier explicava, em Bruxelas, as vantagens em termos de “estabilidade” de o Reino Unido manter o statu quo até ao final de 2020, o ministro para o “Brexit”, David Davis, falava em Londres sobre a possibilidade de o Reino Unido obter um estatuto de observador nos comités da UE ou de rejeitar novas leis que sejam adoptadas no período de transição. Questionado sobre a discordância, Barnier lembrou: “Foi o Reino Unido que decidiu abandonar a UE. Isso tem consequências.”

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