Os cenários em cima da mesa

Se os juízes recusarem o recurso por unanimidade, Lula dificilmente será elegível e será improvável que escape ao cumprimento da pena.

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No centro do processo contra Lula está um triplex neste prédio em Guarujá, transformado no apartamento mais famoso do Brasil DR

Nos jogos de antecipação sobre o que poderá acontecer esta quarta-feira em Porto Alegre, a absolvição de Lula da Silva está praticamente ausente. Mas há cenários de futuro que dependem do resultado da votação dos três magistrados. Se os juízes recusarem o recurso da defesa por unanimidade, confirmando ou agravando a pena aplicada no tribunal de primeira instância, Lula pode avançar com embargos de declaração no TRF4 e, posteriormente, interceder junto do Tribunal Superior Eleitoral ou no Supremo Tribunal de Justiça para conseguir avançar com a sua candidatura. Mas todos os cenários apontam para um mesmo desfecho: no caso de uma votação unânime, Lula dificilmente será elegível e será improvável que escape ao cumprimento da pena. 

Caso as pretensões da defesa sejam derrotadas por dois votos contra um, os advogados de Lula podem avançar com “embargos infringentes”, questionando detalhes da sentença ou pedindo a reconsideração do voto favorável ao réu. Em média, no TRF4 os embargos infringentes demoram sete meses, o que pode impedir Lula de ter condições para apresentar a sua candidatura até 15 de Agosto. Neste caso, poderia ter de recorrer aos tribunais superiores com um pedido urgente (liminar) para suspender os efeitos da sentença até trânsito em julgado. É um cenário sombrio para Lula, mas menos drástico que o anterior.

O apartamento mais famoso do Brasil

No plano judicial, a longa história que levou à condenação de Lula pelo tribunal de primeira instância em Julho de 2017 começa com o apartamento mais famoso do Brasil — o triplex em Guarujá. O projecto imobiliário começou por ser lançado por uma cooperativa ligada ao PT e foi ainda nessa época que o casal Lula da Silva (actualmente viúvo, após a morte da mulher, em Fevereiro do ano passado) adquiriu os direitos de posse sobre uma das fracções. Mas o investimento da cooperativa correu mal e o projecto acabaria por ser vendido à poderosa construtora OAS. Muitos dos proprietários mantiveram interesse em conservar os seus direitos, apesar da mudança do promotor imobiliário. Lula e Letícia estiveram entre os interessados. Mas terão desistido.

É aqui que os agentes judiciários envolvidos na Operação Lava-Jato entram em acção. Na sequência de declarações de Lélio Pinheiro, dono da OAS, e de documentos apreendidos na construtora, a acusação acaba por sustentar a tese que um dos triplex de Guarujá estava prometido a Lula, que a família Lula chegou a negociar um plano de obras de melhoria em compensação por favores concedidos à OAS na disputa de contratos com a Petrobras. Segundo o juiz, Lula foi destinatário de um suborno no valor de 2,2 milhões de reais (561 mil euros ao câmbio actual). Um valor que, alegadamente, corresponde à diferença entre o custo do primeiro apartamento e o preço do triplex mais as obras que, de acordo com o juiz, a OAS terá feito a pedido do casal Lula da Silva.

Lula negou sempre que alguma vez fosse dono do apartamento em causa. O triplex permaneceu sempre em nome da OAS. Para a defesa do ex-Presidente, esta evidência, e a incapacidade da acusação em apresentar documentos que atestem em algum momento a titularidade de Lula, são a prova da sua inocência. A leitura do tribunal dirigido por Sérgio Moro, porém, é diferente. No meio de uma névoa política que tomou de assalto o debate público sobre a Justiça, outros magistrados e juristas concordam. O problema é que, com o país dividido a meio, a imparcialidade e a independência do poder judicial tornaram-se mais difíceis de garantir. Por isso, aconteça o que acontecer esta quarta-feira em Porto Alegre, a polémica promete continuar.

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