Putin lança a candidatura que vai encerrar a sua era

O Presidente russo anunciou que é candidato às eleições do próximo ano e ninguém duvida da sua vitória. O que se segue é mais incerto.

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Putin confirmou a sua recandidatura durante uma visita a uma fábrica de automóveis EPA/YURI KOCHETKOV

Depois de meses em que evitou falar do assunto, Vladimir Putin decidiu finalmente confirmar a sua recandidatura às eleições presidenciais russas do próximo ano. Com uma popularidade elevada e sem uma oposição forte, há pouca margem para surpresas quanto à sua reeleição para um quarto mandato à frente do Kremlin. Mas o ciclo eleitoral que se abre a partir de agora tem um inegável perfume a fim de época. E abre-se uma questão: o que se segue a Putin?

Com Putin, as eleições nunca foram muito mais do que uma rotina para legitimar a sua liderança e as próximas, marcadas para 18 de Março, não serão diferentes. O líder russo parte de uma posição praticamente inabalável. A sua taxa de popularidade está há anos acima dos 80%, ancorada na percepção da maioria dos russos de que não existe uma alternativa viável à sua governação e de que Putin tem sido o principal responsável pelo regresso da Rússia ao grupo das grandes potências mundiais. Os altos índices de aprovação vivem ainda do efeito arrebatador que a anexação da Crimeia, em 2014, provocou junto da população russa.

Por outro lado, não se vislumbra uma oposição suficientemente sólida ou organizada para enfrentar Putin e a sua Rússia Unida, que controla a esmagadora maioria das instituições estatais e detém um monopólio sobre os órgãos de comunicação. Nos últimos anos, Alexei Navalni tornou-se no rosto mais reconhecido da contestação ao regime e, embora estando longe de unir sequer todos os que se opõem a Putin, tem constituído um dos factores mais difíceis de dominar por parte do Kremlin. Este ano, várias cidades russas foram palco de grandes manifestações – raras desde que Putin chegou ao poder – convocadas depois de Navalni ter denunciado um esquema de corrupção que envolve o primeiro-ministro, Dmitri Medvedev.

No entanto, Navalni está proibido pela comissão eleitoral de participar nas eleições por ter sido condenado pelo crime de fraude – que o activista diz ser “politicamente motivado”. Em Março, Putin terá apenas o desafio da oposição tradicional, cuja função é a de garantir uma competição eleitoral que pouco belisque as maiorias governamentais. Para além do veterano líder do Partido Comunista, Guennadi Ziuguianov, e do nacionalista Vladimir Zhirinovski, as eleições vão contar com a socialite Ksenia Sobchak, uma apresentadora de televisão filha do mentor de Putin, o ex-presidente da câmara de São Petersburgo, Anatoli Sobchak – que os analistas prevêem vir a ser pouco mais do que uma distracção mediática.

A grande preocupação para Putin e o seu círculo próximo é vencer a apatia e o cinismo de um eleitorado pouco mobilizado politicamente. A baixa participação nas eleições locais e regionais de Setembro foram um alerta para o Kremlin.

Se o desfecho das eleições parece decidido, a mais que provável recondução de Putin para um quarto mandato presidencial – que se for cumprido irá dar-lhe o título de governante russo mais tempo no poder desde Estaline – levanta a questão da sucessão. Poucos têm dúvidas de que este será o derradeiro mandato de Putin, que o irá terminar com 71 anos e sem poder recandidatar-se à presidência em virtude da limitação constitucional de mandatos.

“A discussão no seio da elite dirigente está focada não na próxima fase da era de Putin, mas sim no que virá a seguir”, escrevia na semana passada o analista do Centro Carnegie de Moscovo, e ex-conselheiro do Kremlin, Gleb Pavlovski.

A especulação em torno daquilo que serão os próximos seis anos está ao rubro entre analistas, políticos e jornalistas nos corredores do poder em Moscovo. Há, desde logo, a questão sobre o nome do sucessor, que poucos conseguem vislumbrar para já. A escolha do primeiro-ministro poderá fornecer uma indicação importante e é improvável que Medvedev se mantenha por causa da sua crescente impopularidade. “Aqueles que se mostrarem leais e eficientes podem entrar numa lista de futuros sucessores”, diz um ex-dirigente governamental ao Financial Times.

O que parece ser certo é que o ciclo eleitoral que se abre vai muito mais além dos próximos três meses.

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