Primeiros nomes do "leilão do século": Picasso, Matisse e Monet na venda da colecção Rockefeller

Receitas do leilão, anunciado para a próxima Primavera, podem ascender aos 700 milhões e revertem integralmente para beneficência. Peças vão em digressão pelo mundo à medida que são reveladas.

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Odalisque couchée aux magnólias Henry Matisse
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David Rockefeller, ao centro à esquerda, numa cerimónia de prémios das Andrew Carnegie Medals Mike Segar
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Fillette à la corbeille fleurie ,Fillette à la corbeille fleurie Pablo Picasso,Pablo Picasso
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Nymphéas en fleur Claude Monet
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As porcelanas Sèvres DR

Pode ser a colecção mais valiosa a alguma vez ir a leilão e será o mais valioso e importante leilão de beneficência de sempre. The Collection of Peggy and David Rockefeller vai ser a venda da Primavera de 2018 e os peritos estimam que possa render, numa ida à praça de obras de grande importância de nomes incontornáveis, cerca de 700 milhões de dólares. Que, como fora anunciado em Junho, serão integralmente doados a instituições escolhidas pelo milionário norte-americano. As obras à venda começam agora a ser reveladas, prestes a viajar numa digressão mundial: Fillette à la corbeille fleurie (1905), de Pablo Picasso, ou Odalisque couchée aux magnólias (1923), de Henri Matisse, são algumas das estrelas.

A colecção que será posta à venda no próximo ano compreende cerca de duas mil peças, sobretudo obras de arte impressionistas, pós-impressionistas e de arte moderna, mas também mobiliário europeu, porcelanas cerâmicas e chinesas, pratas e peças de artes decorativas americanas. Os nomes sonantes: Pablo Picasso, Claude Monet, Henri Matisse, Georges Seurat, Juan Gris, Paul Signac, Edouard Manet, Paul Gauguin, Jean-Baptiste-Camille Corot, Georgia O’Keeffe e Edward Hopper, como elenca a Christie’s no seu anúncio desta terça-feira. Em Junho, Marc Porter, presidente da Christie’s, tinha já antevisto no New York Times que o leilão incluirá “obras de arte que nunca foram vistas pelo público”.

A listagem completa será revelada pela leiloeira com pompa e circunstância através da digressão que começa dia 24 em Hong Kong e que nos próximos meses viajará para Londres, Los Angeles e, finalmente e para a venda final, Nova Iorque na Primavera. “Cada paragem da digressão revelará novas facetas da colecção”, diz a leiloeira. Em 1994, o MoMA, beneficiário de doações regulares de Rockefeller ao longo dos anos e cujo testamento determinava que fossem entregues 125 milhões à instituição, expôs parte da colecção na mostra Masterpieces from the David and Peggy Rockefeller Collection: Manet to Picasso.

David e Peggy Rockefeller acumularam uma histórica colecção composta por mais de 4500 obras de arte e quando da morte de David Rockefeller, em Março, o seu testamento definiu que algumas delas seriam directamente doadas a vários museus e instituições. A revista Forbes, que revelou o teor do testamento em Abril, detalhava por exemplo que La Brioche, de Edouard Manet, teria como destino o Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque e que o MoMA, do qual a sua mãe foi fundadora, receberia, entre outros, Landscape at l'Estaque (1907) de Georges Braque, três pinturas de Paul Cézanne, três de Pablo Picasso, Portrait of Meyer de Haan de Paul Gauguin ou Interieur a la Fillette (La Lecture) (1905-1906), de Henri Matisse. O que faz parte do bolo de duas mil peças é, portanto, uma incógnita parcial.

Esta terça-feira, a leiloeira mostrou que Fillette à la corbeille fleurie é a primeira jóia da venda. Pintura do período Rosa de Picasso, é descrita como “obra-prima” e peça “rara” e tem uma proveniência que, em si, está recheada de história. Foi adquirida originalmente pelos irmãos Leo e Gertrude Stein, ele crítico de arte e coleccionador, ela conhecida coleccionadora além de escritora e dramaturga, ficando depois nas mãos da sua companheira, a escritora Alice B. Toklas. A estimativa de venda está nos 70 milhões de dólares.

Já a odalisca de Matisse é categorizada pela leiloeira como “a mais importante obra de Matisse a ir ao mercado numa geração”, bem como a sua pintura mais relevante ainda nas mãos de coleccionadores privados e aquela cuja estimativa de venda é a mais elevada para o pintor — a Christie's aponta para 50 milhões de dólares. Quanto ao vibrante Nymphéas en fleur (1914-17), de Claude Monet, foi comprado pelos Rockefeller em 1956 e integra agora o acervo à venda — a estimativa de venda ronda os 35 milhões. Além destas pinturas, irão também a leilão uma estátua de bronze de Amitayus, feita nas oficinas imperiais de Kangxi (1662-1722), uma taça ornamentada com dragões (1426-1435), um serviço de porcelana Sèvres feito para o Imperador Napoleão I (1809).

David Rockefeller, o último neto do barão do petróleo John D. Rockefeller, morreu aos 101 anos em Março deste ano. O filho do banqueiro, David Rockefeller Jr., disse em Junho em comunicado, quando do anúncio formal da decisão de leiloar a valiosa colecção, estar “orgulhoso” por cumprir os desejos do pai — “de partilhar com o mundo a arte e os objectos” que ele e a mãe coleccionaram, dando sequência à linhagem filantrópica de John D. Rockefeller. “Todos estes objectos, que tanto prazer deram a Peggy e a mim irão eventualmente para o mundo e estarão novamente disponíveis para que outros cuidadores, espero, retirem deles a mesma satisfação e alegria que nós tivemos nas últimas décadas”, disse David Rockefeller, citado pela Christie’s.

David e Peggy Rockefeller (que morreu em 1996) eram famosos coleccionadores, com os seus gostos e os dos seus conselheiros a fundir-se num acervo elogiado pela diversidade e cuidadoso usufruto que os seus proprietários faziam da mesma. A NBC indicava no seu obituário do banqueiro que a colecção de arte dos Rockefeller foi “em tempos” avaliada nos 500 milhões de dólares. O valor total dos seus bens, noticiou o Wall Street Journal em Junho, era estimado nos 700 milhões de dólares e, segundo o mesmo jornal financeiro, a expectativa da leiloeira Christie’s é que o leilão da próxima Primavera obtenha receitas da mesma ordem. Há dez anos, a pintura White Center (Yellow, Pink, and Lavender on Rose) de Mark Rothko, que David Rockefeller comprara em 1960 (por menos de 10 mil dólares, como notava em Junho a agência Reuters) foi leiloada numa venda histórica que viu a obra de 1950 ascender aos 72,8 milhões de dólares.

O New York Times citava na semana passada peritos que se inclinavam para os mesmos valores a rondar os 700 milhões e notava que a última marca do género, vinda de uma sólida colecção privada de arte, foi atingida quando a colecção do criador de moda Yves Saint Laurent e do seu companheiro Pierre Bergé foi à praça por 484 milhões em 2009.

Antes mesmo de assinar o Giving Pledge, o compromisso lançado por Bill e Melinda Gates para que os mais ricos doassem pelo menos metade das suas fortunas para causas filantrópicas, Rockefeller já tinha decidido doar a sua colecção nos actuais moldes, escreve o New York Times. Da sua venda beneficiará uma série de instituições ligadas à arte como o Museum of Modern Art (MoMA), à educação, como a Universidade de Harvard, e organizações dedicadas à conservação da natureza como o Maine Coast Heritage Trust – são também, como é o caso do MoMA ou do Council on Foreign Relations, instituições em cuja administração David Rockefeller tinha assento ou com as quais tinha relações (estudou em Harvard, por exemplo).

Em Junho, o antigo presidente da Sotheby’s para a arte do período impressionista, David Norman, dissera sem hesitações à Bloomberg que esta “será a venda deste século e também a última” por não existirem colecções que a esta se equiparem. O presidente da Christie’s, Jussi Pylkkanen, confirmou ao diário espanhol ABC que é a venda de beneficência mais importante da história da leiloeira — que facturou, disse Pylkkanen, 30 mil milhões de dólares só este ano.

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