Mugabe detido numa “transição de poder sem sangue”

Militares aparentam ter tomado o controlo de Harare, mas negam que esteja em curso um golpe de Estado. Situação na capital permanece calma.

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O major-general Sibusiso Moyo Reuters/HANDOUT
Imagem de um dos tanques avistados junto à capital Harare
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Imagem de um dos tanques avistados junto à capital Harare Reuters/PHILIMON BULAWAYO

Depois de as forças militares terem ocupado a televisão pública do Zimbabwe durante a madrugada de quarta-feira, o general Sibusiso Moyo leu um comunicado garantindo que não está em curso “um golpe de Estado militar”. Ainda assim, Moyo disse que o presidente Robert Mugabe e a sua família foram detidos e estão a salvo, no que classificou como uma “transição [de poder] sem sangue”. 

O objectivo, disse Moyo, é “atingir criminosos à volta do Presidente, que estão a cometer crimes que causam sofrimento social e económico” no país, de forma a levá-los “à Justiça” — no entanto, não indicou a quem se referia. “Assim que cumprirmos a nossa missão, esperamos que a situação retorne à normalidade”, disse Moyo durante a ocupação da estação pública nacional ZBC.

Ainda que o golpe de Estado seja negado pelos militares, o correspondente da BBC Shimgai Nyoka diz que a situação no país reúne “todos os elementos de um golpe”, mesmo que não seja claro quem o lidera ou qual o seu objectivo.

O jornal britânico Guardian diz ter informações de que o vice-presidente Emmerson Mnangagwa [demitido por Mugabe na semana passada] regressou nesta madrugada da África do Sul, onde tinha procurado refúgio, mas os militares não confirmaram que estejam a coordenar-se com ele.

O Presidente sul-africano afirmou ter falado ao telefone com Mugabe, que lhe confirmou que está retido em casa, mas bem. Jacob Zuma revelou também que enviou dois emissários ao Zimbabwe, para se encontrarem com Mugabe e os responsáveis militares.

Há informações de que outros dirigentes foram também detidos, incluindo o ministro das Finanças, Ignatius Chombo, e residentes contaram ao Guardian que os militares selaram o acesso ao Parlamento, aos principais edifícios do Governo e também ao palácio presidencial. No entanto, a situação na capital permanece calma.

O Movimento para a Mudança Democrática (MDC), o principal partido da oposição, pediu um regresso pacífico à democracia constitucional. Citada pela Reuters, a formação diz esperar que a intervenção militar conduza a uma nação “estável, democrática e progressiva”.

Perante a tensão vivida no país, o secretário-geral do partido, Douglas Mwonzora, disse “estar certo de que o Exército está em processo de tomar o comando”. Em declarações por telefone ao canal sul-africano ANN7, Mwonzora afirmou: “Esta é a definição padrão de um golpe de Estado. Se isto não é um golpe, o que será?” Mwonzora acrescentou que a ZANU-PF “está em fase de negação, mas já não tem o controlo” do país. 

Demissão precipitou acontecimentos

O golpe militar surge menos de uma semana depois da demissão do vice-presidente, Emmerson Mnangagwa, que começava a ser apontado como o possível sucessor do presidente Mugabe, de 93 anos, numa decisão que foi vista como uma forma de abrir caminho ao poder à primeira-dama, Grace Mugabe. 

Mnangagwa contava com fortes apoios entre os militares, suporte essencial de Mugabe, o único líder que o Zimbabwe conheceu desde a independência, há 37 anos.

Na segunda-feira, o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Constantino Chiwenga, tinha feito uma rara intervenção pública exigindo o fim daquilo que considera ser uma “purga” no partido de Mugabe, que na semana passada tinha demitido o vice-presidente. O militar garantiu que o Exército interviria se necessário, o que levou a ZANU-PF a acusá-lo de traição. 

Menos de 24 horas depois, foram avistados tanques estacionados na principal estrada que liga Harare à cidade de Chinhoyi, numa zona localizada a cerca de 20 quilómetros da capital. Outras testemunhas referiram que mais quatro tanques fizeram inversão de marcha quando chegavam a Harare e seguiram em direcção a um complexo da guarda presidencial situado num subúrbio da cidade.

Apesar das movimentações, a liderança do partido no poder assegurou que não iria ceder à pressão militar, mas a situação acabou por precipitar-se durante a noite, com a tomada da estação de televisão, entre outros edifícios governamentais.

Também durante a noite foram ouvidos tiros e pelo menos três explosões na capital, Harare, e testemunhas contaram à Reuters ter visto visto militares a patrulhar as ruas. A embaixada dos Estados Unidos anunciou que vai permanecer encerrada durante o dia de quarta-feira e pediu aos seus cidadãos que não saiam à rua até novas informações.

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