Cooperação entre estados-membros, em matéria de segurança, não agrada à esquerda

Os apoiantes do executivo de António Costa, PCP e Bloco, estão contra a ideia de Cooperação Estruturada de Defesa da UE.

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Augusto Santos Silva defende, em nome do Governo, a Cooperação Estruturada Permanente Enric Vives-Rubio

Em sessão conjunta das comissões parlamentares de Defesa e Negócios Estrangeiros, é debatida esta sexta-feira a Cooperação Estruturada Permanente (Pesco, no acrónimo em inglês) da Defesa da União Europeia (UE) já considerada positiva por 21 dos Estados membros. Hoje, a Espanha será o 22.º Estado a anunciar a sua adesão. Para o Governo português, a questão não coloca reservas, mas há oposição dos partidos que sustentam o executivo – Partido Comunista Português e Bloco de Esquerda –, até porque os acordos assinados em 10 de Novembro de 2015 são omissos em relação às políticas europeia e de defesa. Resta o apoio do PSD e do CDS, mas a oposição queixa-se de défice de informação governamental.

“É um processo de aprofundamento do projecto europeu no caminho do federalismo e constituição de um exército europeu que obedece a estratégias e interesses que não são os nossos e que não beneficiam Portugal”, diagnostica, ao PÚBLICO, Jorge Machado, deputado do PCP. “A nossa oposição é de fundo”, anuncia. “A Alemanha propôs o exército europeu para travar à ‘lei da bala’  o fluxo de emigrantes, a cooperação estruturada é para obedecer a esta estratégia e a uma escalada belicista em relação à Rússia”, refere. Acresce, segundo o parlamentar comunista, que tal estratégia implica custos, dos equipamentos militares à alocação de recursos humanos. “Mais cedo ou mais tarde esta questão vai ser colocada, quando as nossas Forças Armadas estão depauperadas”, critica. Contudo, o deputado do PCP ressalva que o Orçamento de Estado para 2018 não tem dados sobre esta matéria. “Para 2019, logo veremos.”

O apoio do executivo de António Costa à estratégia de dotar a UE de uma capacidade militar própria não põe, assim, em causa o apoio dos comunistas ao próximo OE. “Tratamos disto de forma adulta. Do nosso lado não haverá novidades, é uma não questão, o que pode ser novidade é a posição do PSD e CDS em relação às questões de defesa nacional, se o PSD e CDS retirarem o tapete ao Governo, o que teria o nosso aplauso, mas duvido que aconteça”, ironiza Jorge Machado. Em síntese: “para este baile, o PS conta com o apoio do PSD e do CDS-PP, desde o início ficou claro que não há entendimento com o PCP.”

O Bloco de Esquerda, o outro parceiro na maioria parlamentar, está igualmente em desacordo, embora tal posição não faça perigar a aprovação das contas públicas para 2018. “O que se está a fazer é avançar na ideia de um exército europeu, o que não é independente do Fundo de Defesa Europeu que existe na perspectiva de cooperação entre vários países”, explica a deputada Isabel Pires. “É errado compartimentar esta questão o que está em cima da mesa é o reforço da UE a nível mundial através de um futuro exército europeu, que é uma opção errada, pois está a ser dada prioridade à defesa em detrimento dos fundos de coesão territorial”, refere a parlamentar.

Os bloquistas admitem que pode haver um reforço financeiro da defesa “mais para a frente, no quadro financeiro da União para 2021”. Contudo, destacam que o que Augusto Santos Silva disse sobre o OE na passada segunda-feira na audição sobre o OE do Ministério dos Negócios Estrangeiros “não bate muito certo” com o teor da nota explicativa enviada pelo Governo aos partidos.

Já o principal partido da oposição não esconde incómodo. “O PSD está há muito tempo a dizer que o Governo devia ter contactado a oposição e explicado a situação”, comenta o deputado Matos Correia. Daí que reservem para a reunião desta tarde uma posição sobre matérias – políticas europeia e de defesa – com as quais têm tradicional sintonia com o PS. “Tomaremos a posição que acharmos adequada à defesa dos interesses nacionais, em função do que o Governo disser”, concluiu o parlamentar.

O presidente do PSD viria a concretizar estas reticências, na noite de quinta-feira durante um jantar, em Braga, no âmbito das jornadas do grupo parlamentar do Partido Popular Europeu. Pedro Passos Coelho espera que esta tarde o Governo explique "quais são as linhas vermelhas" para Portugal nesta matéria. "Desejamos o reforço e ampliação de respostas na área da Defesa, mas não queremos com este processo criar um exército europeu, não damos o aval ao Governo para um processo que venha desembocar neste resultado", disse.

Na sua intervenção, durante a qual focou a importância de um caminho de cooperação reforçada na área da segurança e defesa ao nível da União Europeia - que é o objectivo da PESCO -, Passos Coelho insistiu na tónica anunciada pelo deputado Matos Correia. "O PSD não vai passar um chequer em branco ao Governo", sublinhou.

“Somos tendencialmente a favor, porque a PESCO é feita no âmbito da coordenação com a NATO e importa reforçar o pilar atlântico, quando até agora havia uma contraposição [das iniciativas europeias] com a Aliança Atlântica”, refere o deputado João Rebelo do CDS-PP. Aliás, destaca o parlamentar, a ligação da Pesco à NATO ganhou maior acuidade depois do "Brexit", das exigências de Donald Trump de mais gasto em defesa dos sócios europeus da Aliança Atlântica e das mudanças do quadro europeu, da Rússia às migrações. “Tudo isso acelerou o processo e foi feito na perspectiva de uma maior coordenação da UE com a NATO”, precisa o parlamentar.

Para os centristas, outro facto novo deste processo é a dotação do Fundo Europeu de Defesa com verbas relevantes o que para as empresas portuguesas do sector pode representar uma alavancagem. Contudo, há reparos em relação à forma como o Governo conduziu o processo. “Lamentamos o pouco interesse do executivo no início e a pouca informação prestada ao Parlamento”, critica João Rebelo: “foi por uma questão de sobrevivência da relação com o PCP e Bloco, de não querer abrir mais frentes. “Por fim, o CDS-PP considera que não está muito claro o impacto orçamental da Pesco, pois a mera preparação das forças portuguesas envolvidas implica investimentos.

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