Egberto Gismonti e Maria João: o princípio de uma bela parceria

O multi-instrumentista brasileiro e a cantora portuguesa iniciam em Portugal a primeira digressão europeia que os junta no mesmo palco. Esta segunda-feira no Centro Cultural de Belém, quarta-feira na Casa da Música.

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Egberto Gismonti com Maria João no Festival de Jazz de Ravello, Itália, em 2016 PAOLO SORIANI

Vamos, finalmente, ouvir Maria João cantar com Egberto Gismonti. A cantora portuguesa e o multi-instrumentista brasileiro conheceram-se há três décadas, mas só em 2016 tocaram juntos pela primeira vez, graças a um convite do Festival de Jazz de Ravello, em Itália. Foi um espectáculo único, a 19 de Julho desse ano, mas bastou, graças às reacções calorosas do público e da imprensa internacional, para que a dupla iniciasse uma digressão europeia, e a começar em Portugal. É já esta segunda-feira no Centro Cultural de Belém (Lisboa, 21h), seguindo na quarta-feira para a Casa da Música (Porto, 21h30).

“A música do Egberto é para mim uma paixão”, diz a cantora ao PÚBLICO. “Conheci-o em Berlim há muito tempo, quando fui cantar à Alemanha pela primeira vez, em 1985 ou 1986. Ele era a estrela do festival e eu ia fazer o primeiro concerto desse dia, meia horinha com um contrabaixista alemão. Ainda fui lá estrebuchar com ele porque nunca mais se despachava e nós precisávamos de fazer ensaio de som. Acho que foi ali que ouvi a música dele pela primeira vez e fiquei encantada. Pela música e por ele também.”

Egberto, que aqui toca piano e guitarra de dez cordas, diz-nos: “O convite para a apresentação com a Maria em Ravello? Gostei de mais! Já a conheço há muitos anos, acompanho suas cantorias e variações sempre com muita atenção e gosto. São raras as cantoras com tanta facilidade, musicalidade, entendimento, disposição e competência diante de repertórios variados musical e culturalmente. A Maria é uma companheira musical maravilhosa.” A aproximação foi “muito fácil”, conta. “Excepto a prática de fazer juntos, tínhamos todos os outros condimentos necessários: alegria, vibração, gosto e disposição ao estudo e a prática para acharmos um caminho que nos representasse como dueto.” Esta digressão, acredita Gismonti, “será definitiva" para que possam "vislumbrar uma parceria futura”. Depois dos concertos em Lisboa e no Porto, tocarão ainda na Alemanha, na Áustria e na Hungria.

Alegrias e surpresas

O convite para a presente digressão partiu de Gabor Simon e, para Gismonti, “foi inesperado”, porque há anos que ele abolira da sua vida tournées de três ou quatro semanas. “Foram muitos anos, décadas, viajando sem parar. Por outro lado, meu foco de maior interesse eram as orquestras – estava fazendo cerca de cinco concertos por ano com orquestras diferentes em muitos países da Europa. Na América do Sul eram cerca de quatro ou cinco. Na Ásia, Japão e Coreia do Sul, duas por ano. Esse processo de trabalho restringe o número de viagens mas amplia os dias de trabalho na preparação das partituras, edições, ensaios e concerto.” Mas aceitou, ainda assim, fazer esta com Maria João. “A decisão é fundamentada na grande possibilidade de passarmos três semanas agradáveis colocando nossas conversas em dia e a música nos trinques para cumprirmos bem a função de alegrar e sensibilizar pessoas de alguns países na Europa. Se isso for alcançado, teremos dado um pouco mais de esperança ao público.”

Em Ravello, Gismonti fez metade do espectáculo a solo, recorda Maria João. “Porque tivemos só um dia para ensaiar e os temas dele são muito difíceis. Agora fazemos juntos quase todo o concerto." Haverá temas novos, que ele lhe enviou para ensaio. Gismonti refere, a propósito: “Poderíamos dizer que este será um encontro com alegrias, surpresas e boas combinações com a voz, o violão ou o piano. Prevendo que à brasilidade que pratico quotidianamente enquanto redescubro a linguagem miscigenada brasileira será somada a criatividade singular da Maria. Quem sabe não montamos um repertório com valsas-rancho, bumbas-meu-boi, maxixes, maracatus e frevos?”

No final, talvez um disco

Antevendo o espectáculo, Maria João reconhece que “os temas são difíceis, muito exigentes, mas a linguagem acaba por ser comum, não é uma linguagem estranha": "Fazemos parte do mesmo universo musical, acho eu. E quero que ele se sinta feliz com o que eu vou fazer.” Além disso, há o factor emocional: “Continuo apaixonadíssima por esta música sublime deste músico magnífico. É uma sorte podermos fazer este espectáculo juntos.”

Haverá, no futuro, registo fonográfico desta experiência? Gismonti admite essa possibilidade: “Eu sou da geração que regista ideias quando elas estão prontas, desenvolvidas. Acreditando que poderemos acertar e desenvolver um bom repertório, com arranjos interessantes e boas performances, eu diria que sim, acho que faremos um disco no final da tournée.” 

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