PCP pediu ao Governo para não usar salários e pensões na campanha autárquica

“Se a proposta é boa, não temos barreiras ideológicas. Mas…” Comunistas pediram ao Governo que fosse imparcial e que PS não capitalizasse reposição de salários e pensões no discurso eleitoral, mas não houve pacto de não-agressão. Jerónimo diz que não tem “fetiches” em relação a nenhum partido, mas

Fotogaleria
Daniel Rocha
Fotogaleria
Daniel Rocha
Fotogaleria
Daniel Rocha

Amigos, amigos, eleições à parte. Jerónimo de Sousa não se tem coibido, nos últimos dias, de criticar a gestão autárquica socialista. Fê-lo em Évora, fá-lo-á amanhã em Loures, onde encerra a campanha. António Costa tem sido mais comedido. Há ou não um pacto de não-agressão? “Pela minha honra, nunca houve, nem antes nem durante qualquer negociação, conversação, acordo ou pacto formal ou informal. Cada um corre por si”, garante ao PÚBLICO o líder comunista.

Mas admite: “O único apelo que fizemos ao Governo foi para se manter imparcial, não usar o poder do Estado como instrumento de combate para as autarquias e defendendo os interesses do PS.” E isso passava também por não capitalizar os “avanços de reposição de rendimentos e direitos e todas aquelas promessas [de obras públicas] que os governos costumam fazer em vésperas de eleições”. E Costa tem mantido o compromisso? “Bom, o secretário-geral do PS faz algum esforço para essa demarcação, entregando essa tarefa a alguns candidatos. Por vezes dizem-me ‘o Costa não ataca, mas os seus candidatos querem fazer a folha ao PCP’.” Jerónimo considera que não viu “nenhum caso chocante de violação dessa imparcialidade”, por parte do PS.

Jerónimo de Sousa, por seu lado, tem feito dessas reversões uma base dos seus discursos e mistura o conceito autárquico e o legislativo. Insiste em cada local que dar mais votos à CDU no domingo é dar mais força ao PCP para exigir mais do PS na Assembleia da República. Diz, no entanto, que os resultados de domingo não serão um cartão verde nem vermelho ao entendimento que tem com o PS. “Não misturo nem confundo as coisas. O processo eleitoral autárquico termina no domingo à noite. A vida política nacional não terá alterações.”

Não gosta de falar sobre cenários e hipóteses de resultados e entendimentos; prefere dizer que “há a real possibilidade de a CDU aumentar o número de câmaras e de votos”. O resto está por definir. Lembra que, mesmo em concelhos onde tem maioria absoluta, a CDU deu pelouros a outros partidos, como no Seixal. E Loures? Afigura-se ali um caso bicudo. Bernardino Soares deu pelouros ao vereador do PSD, “um autarca experimentado e pessoa séria”, porque isso “não alterava os princípios programáticos” da CDU, e recusou acordo com o PS, porque este “queria continuar a governar a câmara como se tivesse ganho”.

O caso agora é “diferente”: “O candidato do PSD, nas suas afirmações e concepções, colide de forma insanável com o programa da CDU e, por isso, não há entendimento possível com esse responsável”, garante Jerónimo. E a solução? “Não temos nenhum fetiche em relação ao PS, PSD, BE e até ao CDS. Se a proposta é boa e há disponibilidade de trabalhar em conjunto, fazemo-lo. Não temos barreiras ideológicas que não possam ser ultrapassadas. Mas naquele caso há.” Ou seja, entendimento com o PSD só “sem esse senhor”. E com o Bloco? “Não sei se vai eleger. Ao pé do pano se talha a obra. Depois das eleições feitas, fazem-se as contas. Estamos disponíveis para procurar soluções que permitam a governação.”

Nem sempre é fácil ouvir queixas

Os milhares de quilómetros acumulados nas últimas semanas exigem um grande esforço físico e anímico “até em relação aos afectos”, admite Jerónimo de Sousa, pensando na arruada da manhã na Cruz de Pau. Andar na rua é também uma prova de resistência – “nem sempre é fácil ouvir queixas e críticas”. “Mas ainda não estou cansado.” Apesar da segurança dissimulada entre os militantes e de já ser raro ver alguém que passa na rua lançar palavrões à passagem dos comunistas, há quem se chegue para criticar, até mesmo no Seixal, de tradição comunista desde os anos 70.

Jerónimo andou em passo estugado, distribuiu apertos de mão e beijos, mas não se alongou em conversas. O concelho e a junta são de maioria CDU. Esmeralda Estrela não cabia em si de contente e parecia uma adolescente a contar às amigas e clientes que vinham na arruada da CDU que tinha tirado uma fotografia com Jerónimo de Sousa e que ia, já, já, "meter no Facebook para toda a gente saber e votarem na CDU”. Esperara o líder do PCP à porta de uma pastelaria, pedira para tirar uma fotografia com ele e passou o telemóvel à filha. Esta, na excitação, nem conseguia acertar com o botão certo e o tempo ia passando, com toda a gente em magote a atravancar o passeio e parte da estrada. Enquanto isso, Esmeralda agarrava-se bem a Jerónimo. Excaixou-se debaixo do braço direito dele, pôs-lhe um braço pelas costas e outro pela cintura, por cima da camisa branca, e assim ficou aconchegada ao peito do secretário-geral comunista que sorria.

Uma rua antes, a talhante Cidália pedira-lhe para “fazer alguma coisa pelo comércio", para olhar pelos comerciantes. "Aqui à volta não param de abrir supermercados que fazem promoções na carne, que eu nem sei como conseguem!”

Mas na loja de fruta, quando Jerónimo entrou de passo decidido, Ana Luísa Portugal, atrás do balcão, ficou admirada e só se lembrava da mãe que já morreu há dez anos. “Ela adorava-o; até desligava o fogão para o ouvir. Dizia ‘é tão charmoso, é tão bonito, sabe falar’… E nunca conseguiu vê-lo pessoalmente.” Alexandre Leitão, cliente, cumprimentou-o pela primeira vez. “Já o vi na Festa. Este ano não pude ir …”, e esfrega o polegar e o indicador a indicar dinheiro. “Um homem sem grandes estudos e olhe como ele fala tão bem. A gente percebe-o.”

E críticas ou, vá, “lembranças”; como a de Carlos Silva que estava parado na praça de táxis e parou Jerónimo e Joaquim Santos para “lembrar ao presidente o estudo que se fez e o compromisso que assumiu, quando ainda era vereador na câmara e também já neste mandato, de instalar coberturas em várias praças de táxi no concelho”. Há dias de Verão em que se podiam estrelar ovos no capot dos carros. Mas isso não porá em causa o seu voto na CDU, afiança.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários